terça-feira, 6 de setembro de 2016

"Os portugueses consomem o dobro da quantidade de açúcar recomendada"


Entrevista a Pedro Graça, diretor do Programa para a Promoção da Alimentação Saudável

O DN sabe que há escolas que continuam a disponibilizar produtos proibidos nas máquinas de venda automática. Tem conhecimento destas irregularidades?

Pontualmente, recebemos observações de pais que nos dizem que se aperceberam de que determinada escola não está a cumprir as normas. As mesmas são encaminhadas para os estabelecimentos de ensino e para o Ministério da Educação. Não consigo dizer o número de escolas que não cumprem. Mas temos noção clara de que há escolas mais amigas da alimentação saudável do que outras. Depende muito do esforço dos diretores e do envolvimento dos pais.

O que fazer para acabar com o problema?

A Direção-Geral da Educação tem um regulamento sobre o que deve ser oferecido, restringido e evitado nas escolas. Temos feito sistematicamente alertas para a necessidade de os diretores das escolas estarem sensibilizados e para as famílias, que devem ir às escolas e ver o que se passa. Infelizmente, há muitos pais que delegam completamente na escola a responsabilidade pela educação alimentar dos filhos. A primeira coisa que as crianças fazem é imitar os pais. A educação começa em casa.

O Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável da DGS publicou, recentemente, um documento sobre a redução do consumo de açúcar em Portugal. Taxar as bebidas açucaradas é uma das soluções?

O relatório é uma espécie de cardápio baseado em evidências científicas, que identifica boas práticas. Em Portugal, consome-se o dobro da quantidade de açúcar recomendada e uma grande parte vai em produtos alimentares, como bolos e sumos. Da literatura científica internacional identificámos duas estratégias. A primeira passa pela educação e sensibilização das pessoas para que tenham consciência de que o açúcar é nefasto para a saúde. Há crianças de 2 e 4 anos que consomem regularmente refrigerantes. É por isso que queremos insistir neste dado. Por outro lado, os ambientes onde são oferecidos açúcares devem ser restritos. Não podemos facilitar acesso ao açúcar.

E de que forma é que isso pode ser feito?

A indústria alimentar tem de ser incentivada a ter produtos com menos açúcar, o que pode ser feito desde a autorregulação até à taxação. Pode, por exemplo, aumentar-se os preços através das taxas e reformular produtos. A indústria portuguesa é cada vez mais exportadora. Ao termos produtos alimentares com menos açúcar, uma tendência que já é seguida em muitos países, tornamos a nossa indústria mais competitiva. Todos podem ganhar. Nós demos um leque de soluções. Os países que quiserem podem usá-las.

A taxação de bebidas açucaradas com reduzido valor nutricional revelou-se eficaz nos países onde foi implementada?

Aparentemente, tem funcionado em alguns países. Mas é uma medida que exige muita reflexão antes de ser posta em prática. É preciso analisar se temos capacidade de fiscalizar, quais os produtos que vale a pena taxar. Iniciámos este processo para que se reflita, porque Portugal consome o dobro do açúcar recomendado, o que tem um impacto gritante nas cáries dentárias e na obesidade.

O dinheiro proveniente das taxas serviria para combater a obesidade?

Os autores que discutem a taxação sugerem a sua aplicação em programas de educação alimentar, de promoção da saúde.

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