segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Água, o ouro azul (I)

27 Dezembro2010 | 09:55
Jornal de Negócios Online - negocios@negocios.pt
Em 2000, previa-se que um terço da população mundial sofreria de
escassez de água até 2025. Mas esse limiar poderá já ter sido
ultrapassado
A água é algo que muitos de nós temos como garantido. Afinal de
contas, dois terços da superfície da Terra estão cobertos por ela.
Infelizmente, 97,5% da água que existe no mundo é salgada. E, dos 2,5%
que são constituídos por água doce, 68,9% estão contidos nos
glaciares, 30,8% na água potável subterrânea (ou aquíferos
subterrâneos) e apenas 0,3% se encontram nos lagos e nos rios.1

Acrescente-se a este facto que os sistemas fluviais da Terra estão
desigualmente distribuídos geograficamente e que muita da água
utilizada é desperdiçada ou poluída pelos esforços humanos na
urbanização e indústria, e a nossa crescente dependência deste recurso
vulnerável, usado de uma forma indiscriminada na agricultura, na
indústria e nos lares, torna-se apreensivamente evidente.
UMA FONTE RENOVÁVEL?
A água foi tradicionalmente considerada uma fonte renovável e em
muitas áreas do mundo isto é verdade. No entanto, os aquíferos e as
bacias dos rios podem esgotar-se, e ser poluídos, através do uso
intensivo, da urbanização e da má gestão.
UM NEGÓCIO REGIONAL
Algumas regiões do mundo têm água doce em abundância. No hemisfério
sul, o Brasil destaca-se em termos de volumes (se não em termos de
qualidade e acesso), enquanto, no seu conjunto, os países da orla do
Árctico, o Canadá, a Gronelândia, a Escandinávia e a Rússia formam um
enorme bloco de economias com excedente de água no hemisfério norte.
No outro extremo da escala, há uma lista crescente de países que têm
problemas de oferta de água.
A Índia tem cerca de 17% da população da Terra, mas apenas 4% da sua
água.2 O país tem a maior taxa de recolha de água do mundo; os rios
Indus e Ganges são tão explorados que, à excepção de alguns raros anos
em que chove intensamente, já não chegam ao mar. A China também tem
uma oferta de água per capita baixa (19% da população mundial mas
apenas 7% de oferta de água2) e a segunda maior taxa de consumo de
água. Os recursos aquáticos estão demasiadamente distribuídos, são
ineficientemente utilizados e poluídos pelos resíduos humanos e
industriais. De facto, cinco dos sete principais sistemas fluviais da
China estão classificados como 'severamente poluídos'.3
A UTILIZAÇÃO DA ÁGUA ESTÁ A INTENSIFICAR-SE
No ano 2000, os cientistas previram que um terço da população mundial
sofreria de escassez de água até 2025, mas ficaram consternados ao
descobrir que esse limiar poderá já ter sido ultrapassado. De facto,
segundo um relatório recente do jornal 'Nature', 3,4 mil milhões de
pessoas pertencem neste momento à categoria mais severa de incerteza
no que se refere à água.5
À medida que as populações desenvolvidas se tornam mais ricas, os
problemas intensificam-se.
De acordo com a UNESCO, as pessoas consomem dez vezes mais água por
dia nos países desenvolvidos que nas nações em desenvolvimento.6 O
problema é exacerbado por uma viragem para dietas com mais proteínas
nos países desenvolvidos, onde estamos a assistir a uma procura cada
vez maior de carne. Isto porque a criação de gado é particularmente
intensiva em termos de consumo de água. Para produzir um quilo de
milho é necessário 1,5m3 de água. No entanto, um quilograma de carne
de vaca necessita de 15m3 (1 Metro cúbico = 242 galões).7
AS PRINCIPAIS 'ALTERNATIVAS'
Dessalinização da água do mar
Dado que mais de metade da população mundial vive a menos de 60km da
costa, a água salgada deverá ser uma das principais fontes
alternativas de água nas próximas décadas. Em locais como a Arábia
Saudita, as fábricas de dessalinização já satisfazem a maior parte das
necessidades de água doce do país.
Os custos elevados são tradicionalmente citados como um motivo pelo
qual a dessalinização não é a panaceia para os problemas mundiais de
água. No entanto, o Goldman Sachs estima que os custos de
dessalinização da água são agora três ou quatro vezes menores do que
eram há trinta anos. Israel e Singapura são apenas dois dos países que
estão a dessalinizar a água a um custo inferior a 0,60 dólares
norte-americanos por metro cúbico. A China e a Índia deram
notavelmente início aos seus próprios programas de dessalinização.
Reciclagem da água
A reutilização dos resíduos aquáticos tratados tem aumentado
acentuadamente nos últimos anos, especialmente em países áridos tais
como a Austrália e Israel. Mais de 40 milhões de metros cúbicos de
resíduos aquáticos municipais são agora reciclados diariamente a nível
mundial, mas este valor ainda representa apenas uma fracção da
utilização total de água.8
A água reciclada é principalmente utilizada na irrigação e na
indústria. No entanto, se as infra-estruturas continuarem a melhorar,
e se os consumidores conseguirem ultrapassar o factor psicológico de
repulsa, não há motivo para que a água reciclada não seja usada no
saneamento e, em última análise, até mesmo para beber. Se estas
barreiras à sua maior utilização forem derrubadas, a reciclagem poderá
ser uma parte significativa da solução.
A segunda parte desta análise será publicada na próxima edição do
"Investidor Privado", a 3 de Janeiro de 2011.

Notas de rodapé
1. United Nations Environment Programme (UNEP).
2. US Census Bureau International Database, em 2010. Wikipedia.
3. World Resource Institute 2008, 'Watering Scarcity'.
4. Nature 467, Vorosmarty et al, 'Global threats to human water
security and river biodiversity'.
5. UNESCO, 2000
6. Goldman Sachs, 'The essentials of investing in the water sector',
Março de 2008
7. Global Water Intelligence, Municipal Water Reuse Market 2010
8. United Nations Environment Programme (UNEP.
http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=460275

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