POBREZA
por Marta F. Reis , Publicado em 02 de Dezembro de 2010
Especialista da Universidade de Harvard entrega hoje manual de instruções aos presidentes da África subsariana
África é capaz de atingir a auto-suficiência alimentar no período de uma geração, uma certeza para Calestous Juma, especialista em desenvolvimento da Universidade de Harvard e membro das principais academias de ciências do mundo. Hoje o professor entrega um manual de instruções aos presidentes do Quénia, do Uganda, da Tanzânia, do Ruanda e do Burundi, reunidos na cimeira da Comunidade da África Oriental (EAC) em Arusha, Tanzânia. "Uma nova geração de líderes, estruturas regionais que começam a funcionar, a crise financeira e a vulnerabilidade aos preços dos alimentos fazem com que esta seja a altura certa para a mudança", diz ao i Calestous Juma, nascido no Quénia. "O meu objectivo não é glorificar África, mas mostrar aos cépticos e aos conservadores que não tinham razão."
Em apenas dez anos, assegura Juma no relatório "The New Harvest", África pode deixar de ser um continente à mercê das importações, onde a fome é endémica - dos 800 milhões de pessoas sem acesso a alimentos, um quarto vive na região subsariana. Biotecnologia, comunicações e formação são alguns dos ingredientes da revolução. Mas os recursos também ajudam, acrescenta o documento assinado por outros 19 especialistas. África tem 27,4% da terra arável mundial e apenas 4% é irrigada.
O uso de tecnologia no sector é ínfimo, tal como o investimento. A agricultura representa 64% do emprego em África e 34% do PIB e o compromisso de atribuir 10% da riqueza nacional ao desenvolvimento agrícola só tinha sido atingido, em 2008, por 13% dos países. Se no mundo a produção de alimentos cresceu 145% desde 1960, em África caiu 10% e o número de pessoas subnutridas aumentou 20% nos últimos 20 anos.
O bom exemplo Para Calestous Juma, o primeiro passo para erradicar a fome passa por tornar a segurança alimentar uma "prioridade presidencial", com metas quantitativas e monitorização permanente. O exemplo a seguir é o Malawi, diz. "Quando o presidente Bingu wa Mutharika chegou ao poder, em 2004, o país vivia em pobreza extrema. Em seis anos mostrou-se que é possível uma mudança rápida." Em 2005, metade da população do Malawi vivia com menos de um dólar por dia e um quarto não tinha refeições diárias. Um dia, recorda Juma, Mutharika disse: "Basta: não vou continuar a implorar comida. Vamos plantá-la." O preço do milho no país caiu para metade e pela primeira vez houve excedentes para exportar. Mutharika só este ano entregou a pasta a um ministro da Agricultura.
Converter ministérios da agricultura em agências de inovação agrícola, que apostem na biotecnologia e nos transgénicos, é o passo seguinte. "Devem depois centrar-se no alargamento de infra-estruturas às zonas rurais." Descentralizar universidades, dar formação a mulheres para agricultura e empreendedorismo e criar agências para regulação e segurança alimentar entram ainda na lista de conselhos.
A ajuda de fora, frisa, deve ser educativa e não invasiva. "Vão ser precisas parcerias de longo termo, mas sempre numa perspectiva que corte com o velho espírito da colonização. Não querem dinheiro, querem conhecimento", diz Juma. Uma medida de sucesso para daqui a dez anos? "Não haver fome em África e os produtos africanos entrarem nos mercados da Ásia e do Médio Oriente." Um passo levará a outros. "África vai ter de se integrar na economia global e exportar alimentos vai valorizar o continente." Na linha da frente não estará nenhum país isolado, antevê o especialista. "Vejo um grupo regional sentar-se ao lado do Brasil ou da China. Acho que daqui a dez anos não estaremos a falar do Quénia, do Uganda, do Burundi, mas de África Oriental como um todo."
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