14/02/11 00:04 | António Bagão Félix
Comunidade
Confesso que não sou muito dado a anos nacionais ou internacionais.
Não pelo significado que lhes está associado, mas pelo ritual formal e
quase mecânico que pouca atenção suscita.
A sua abundância e proliferação têm, às vezes, o mesmo efeito da
inflação em relação à moeda: de tanto excesso, desvaloriza-se o valor.
Espero que não seja o caso de 2011 proclamado como o Ano Internacional
da Floresta sob o lema "floresta para todos".
Parece-me uma excelente oportunidade para chamar a atenção da
sociedade e dos governos para a necessidade do aumento de protecção
das florestas, para a conservação da biodiversidade e para a
estabilidade climática e, consequentemente, para o desenvolvimento.
O Homem é o principal factor de desflorestação (estima-se que, por
ano, cerca de 150 000 km2 de florestas desaparecem, o que equivale a
três Suíças!) e de abandono do campo através de uma forte e
desordenada urbanização (de 50% da população mundial vive em cidades,
atingindo na Europa o valor de 72%!).
As leis do mercado têm prevalecido inexoravelmente sobre as leis da
Natureza. A evolução do mundo vegetal, que é essencial para a nossa
qualidade de vida, está sujeita a uma crescente cultura de indiferença
e insensibilidade e até a um acentuado egoísmo geracional. No fundo,
somos mais ricos em tecnologia, mas estamos mais pobres em Natureza.
Espero que este Ano Internacional contribua, em Portugal, para um
maior enfoque político no sector primário da economia. A agricultura
está moribunda, trocada por euros bruxelenses, a floresta descuidada,
para já não falar do subaproveitamento do mar e até das indústrias
extractivas. Importamos mais e mais o que deveríamos produzir cá, com
mais défice externo.
A política esquece este sector pela sua pouca apetência eleitoral, por
cobrir uma população escassa e esquecida e pelo facto de esta não ter
o "poder de rua" de outros grupos.
Veja-se o que se passa com a doença do nemátodo que dizima o pinhal
português e que passou ao lado da política e, por tabela, da opinião
pública.
E ainda porque as estatísticas não reflectem a realidade da terra. O
PIB é cada vez mais um indicador imperfeito e incompleto. Não toma em
conta a apreciação ou a depreciação do activo ambiental e dos recursos
naturais. Já se fala, com insistência, em outras formas de medir a
riqueza e o desenvolvimento, considerando não apenas o que se produz
como activo da sociedade (o PIB contabilístico tradicional), mas
deduzindo-lhe o passivo que resulta da depreciação ou destruição de
bens naturais indispensáveis ao bem-estar colectivo (água, solos,
florestas, pescas, reservas minerais). Provavelmente se isto fosse
tomado em conta, a degradação e destruição da nossa floresta teriam
provocado uma queda do PIB. Quem sabe se esta mudança estatística, só
por si, não permitiria uma atenção maior a estes sectores, pois que
deste modo os governantes se sentiriam mais escrutinados...
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António Bagão Félix, Economista
http://economico.sapo.pt/noticias/floresta-para-todos_111058.html
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