07 Abril 2011 | 10:10
Patricia Cale /Casa dos Bits
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Nasceram num contexto diferente do vivido actualmente, tendo por base
os valores da solidariedade, da equidade, da liberdade e, acima de
tudo, do trabalho em equipa. Hoje, as cooperativas evoluíram e algumas
transformaram-se em "negócios" de sucesso, beneficiando os seus
associados.
Fundada em 1956, em pleno Estado Novo, a Adega Cooperativa de Borba
foi a primeira de uma série de adegas cooperativas constituídas no
Alentejo. Como outras suas congéneres, queria lutar contra a
fragmentação da produção, congregando esforços para produzir numa
maior escala, de modo a facilitar a comercialização dos produtos
(neste caso de vinho) no mercado, e visando remunerar justa e
devidamente aqueles que se lhe juntassem.
Hoje passados mais de 50 anos, o contexto pode ter mudado e o mundo
pode realmente estar mais globalizado, mas nem por isso a cooperativa,
nascida com o incentivo e ajuda da então Junta Nacional do Vinho,
perdeu o fôlego, conseguindo manter válidos os argumentos iniciais e
acrescentando-lhe outros, o que a mantém "no activo".
"As cooperativas nasceram de modo a que, em termos tecnológicos e de
economias de escala, houvesse uma entidade agregadora dos produtores.
Perante isto, parece-me que esse objectivo é válido há 50 anos atrás
como continua a ser válido hoje", argumenta Manuel Rocha,
director-executivo da Adega Cooperativa de Borba.
No contexto do Estado Novo, as cooperativas foram fundamentais no
sentido do desenvolvimento da agricultura e desenvolvimento
tecnológico da qualidade do vinho, lembra o responsável. Hoje em dia o
conceito é "extremamente actual" porque permite "ganhar escala" para
se reunirem maiores vantagens competitivas quando se produz para o
mundo inteiro. "Trabalhamos cada vez mais ao nível do globo, e quando
já não estamos confinados à esfera do nosso país, a escala é muito
importante. Sendo Portugal um país de reduzida dimensão, é crucial ter
escala para conseguirmos exportar para outros países".
O "negócio" da Cooperativa Agrícola dos Lavradores do Concelho de
Oliveira do Bairro (Calcob) é diferente, assim como o contexto em que
foi criada, já no pós-25 de Abril, mas permanece a ideia de que apesar
das alterações de cenário ideológico, o cooperativismo continua a
fazer sentido.
"A abertura da economia ao exterior e a era da globalização são
processos irreversíveis, que nos afectam diariamente, das formas mais
variadas e temos de aprender a conviver com isso, porque existem
mudanças positivas, mas também mudanças que dificultam a expansão
diária de cada entidade", considera Fernando Silva.
O gerente da Calcob diz ter havido uma alteração radical no campo de
acção e na forma de funcionamento, que obrigou a uma adaptação
constante para que as cooperativas portuguesas se conseguissem manter
em pé de igualdade competitivo com as suas congéneres europeias. "Todo
o processo evolutivo traz consigo o bom e o mau da expansão.
Abriram-se fronteiras à expansão comercial, encontraram-se novos
mercados, novos processos produtivos, novas oportunidades de negócio,
mas também se liberalizaram mercados e preços, alargando a oferta,
apostando em preços baixos, dificultando o devido e merecido pagamento
de produtos e serviços".
No entanto, acredita que apesar de todas as alterações trazidas pela
era da globalização, positivas e negativas, as bases do
cooperativismo, "nomeadamente a solidariedade, a equidade, a liberdade
e, acima de tudo, o trabalho em equipa" não foram relegados. "Aliás,
porque se o fossem o futuro de qualquer cooperativa estaria
comprometido", defende.
Cooperar para lucrar
A maior parte das cooperativas não tem políticas de angariação de
associados, mas está sempre aberta à entrada de novos produtores,
embora exija o cumprimento de alguns requisitos. "O sermos uma
cooperativa implica estarmos predispostos a aceitar novos associados e
fazemo-lo desde que estes nos tragam vantagens competitivas", explica
José Barroso, secretário de direcção da Adega Cooperativa do Cartaxo,
criada em 1954, e que hoje conta com um total de 290 associados,
responsáveis por uma área total de produção de 950 hectares.
Na integração de um produtor é por isso necessário avaliar se há um
equilíbrio entre a oferta e a procura, já que as cooperativas são
obrigadas a aceitar a quantidade total produzida pelos seus
associados. "Havendo ou não mercado, a cooperativa tem de ficar com a
totalidade de produção das uvas. Logo temos todo um equilíbrio para
gerir, tendo em mente que lidamos com uma actividade vulnerável às
alterações climatéricas, que podem fazer com que haja oscilações em
termos de produção", lembra por sua vez Manuel Fernandes.
Para o CEO da Adega de Borba uma das principais dificuldades colocadas
a uma cooperativa é gerir da melhor maneira os seus sócios e
respectivas produções, lidando com os excedentes ou as carências que
possam existir em relação ao mercado.
Na avaliação de um "candidato", e independentemente de estarmos a
falar de vinho, fruta ou lacticínios, pesa também o seu "compromisso"
com o progresso, nomeadamente o cumprimento de boas práticas ou o
respeito pelas normas de certificação. Outro requisito para quem
queira integrar uma cooperativa é a compra de uma quota de capital.
Em troca, e além dos valores de remuneração, os produtores recebem
acompanhamento e formação. "As cooperativas foram construídas pelo
povo e para o povo, logo têm nele o seu maior beneficiário", defende
Fernando Silva.
"Os sócios são membros activos de uma sociedade, fazendo ouvir a sua
voz na cooperativa, onde exercitam a democracia e decidem
colectivamente sobre o rumo da casa que é de todos eles". Deste modo,
as cooperativas empenham-se em prol de uma fusão entre uma economia de
serviços e de lucros, "onde a assunção da responsabilidade no
crescimento da sociedade circundante está bem presente", alega o
responsável.
Na Calcob a filosofia é proporcionar aos associados a resposta às
dúvidas que possam surgir e às expectativas decorrentes. "O associado
é acompanhado desde o início das suas plantações até ao momento da
colheita por um técnico especializado, é-lhe fornecida todo um plano
formativo, de modo a aumentar o seu saber saber, saber ser, saber
estar e saber fazer, tem um espaço comercial onde encontra todos os
factores de produção de que necessita, para além de um elevado rol de
serviços", destinados a facilitar e melhorar a sua prática e vivência
diárias.
A formação também é levada a sério na Adega de Borba. "A cooperativa
age como um pólo dinamizador de disseminação de todas as boas práticas
ao nível dos nossos associados. Por isso constantemente promovemos
acções de formação e de 'fertilização' de boas práticas de
viticultura, em várias vertentes. Também somos muito preocupados com a
formação dos nossos colaboradores. O ano passado demos mais de 5.000
horas de formação aos nossos 60 colaboradores".
Mais cultura empresarial
Com objectivos idênticos aos que persistiram à sua formação, o
contexto onde as cooperativas se inserem tem vindo a mudar, mas não é
o único elemento diferenciador neste novo cenário. "A forma como as
cooperativas são geridas é diferente - adequou-se à realidade",
considera José Barroso, da Adega do Cartaxo.
"O ideal de uma cooperativa assenta nas pessoas e nas expectativas, de
através da sua intervenção activa, ajudarem na construção de uma
sociedade melhor", considera por sua vez Fernando Silva. "É
acreditando que o maior capital de uma empresa são as pessoas
(associados, colaboradores e parceiros), que se constroem bases
sólidas de crescimento e de protecção face às adversidades externas e
internas com que nos deparamos diariamente".
Tal como acontece nas restantes organizações empresariais, também
existem cooperativas mais bem geridas e outras menos bem geridas, e
nem todas conseguiram adaptar-se ao novo modelo instituído e vingar na
actualidade como modelo de negócio.
Para Manuel Fernandes, o grande trunfo da Adega de Borba foi ter-se
dotado de quadros competentes e de uma direcção com alguma visão, que
soube aproveitar as oportunidades que surgiram. "Há 50 anos a atrás a
gestão da cooperativa era mais amadora".
Apontada quase como um "caso à parte" entre as suas congéneres, a
Adega de Borba diz distinguir-se pela capacidade de profissionalização
de todas as suas áreas funcionais, no sentido de ter "os melhores
recursos humanos" do mercado. Adicionados outros factores favoráveis,
e o objectivo é facilmente atingido. "Ter produtores com uvas de
grande qualidade, com acesso a equipamento tecnológico de ponta e a
recursos humanos de grande nível de competência transforma qualquer
empresa cooperativa, ou outra, num caso de sucesso".
Independentemente de todas as mudanças de contexto e do esforço de
modernização que tem sido feito ao nível da gestão, há algo que não se
pode contornar: a extrema importância que as cooperativas assumem num
país que continua a ser feito de muitos pequenos produtores.
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