29.03.2011
Carlos Dias
A Sociedade Taifas, empresa que explora um olival com 700 hectares, na Quinta de São Vicente, em Ferreira do Alentejo, e que em 2010 ganhou o prémio para o melhor azeite maduro frutado do mundo, vai ter a sua exploração cortada ao meio pelo Itinerário Principal n.º 8 (IP8), que ligará Sines a Beja.
João Filipe Passanha, um dos responsáveis da empresa familiar que produz azeite na Quinta de São Vicente desde 1738, diz estar "incrédulo" e ao mesmo preocupado pelo futuro da exploração. O prestígio já granjeado junto dos importadores que "são extremamente exigentes" com as condições ambientais da produção, pode ficar comprometido. "O mais aberrante em tudo isto é que nem se deram conta das infra-estruturas que existiam", quando optaram trazer o traçado do IP8 pela Quinta de São Vicente, acentua Filipe Passanha.
Para além de perder cerca de 6000 árvores e uma parcela de terreno com três quilómetros de comprimento por 80 metros de largura, a viabilidade económica e ambiental da empresa pode ser afectada. Em 2010, a Sociedade Taifas exportou, para 18 países, quase 90 por cento das 800 toneladas de azeite que produziu em lagar próprio. Os principais importadores encontram-se em Inglaterra, Noruega, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Alemanha, Brasil, China e Estados Unidos da América.
A divisão da exploração em duas partes faz com que a rede de rega "fique debaixo da auto-estrada", o mesmo acontecendo com as condutas da rede secundária do sistema Alqueva. Resta saber o que acontece quando houver rupturas.
Outro problema grave: a rega gota a gota dos 700 hectares de olival é suportada por sete estações de bombagem. A nova situação obriga a aumentar a potência do sistema.
Com a herdade cortada ao meio "temos de gerir o olival nos dois lados da estrada", observa Filipe Passanha, que assegura que o traçado do IP8 vai causar "impactes brutais na exploração". Até a máquina que faz a recolha mecânica da azeitona vai ficar limitada. Foi concebida para percorrer as linhas de olival que, agora, ficarão cortadas ao meio.
Filipe Passanha garante que não teve conhecimento prévio da passagem do IP8 pela Quinta de São Vicente. "Nunca consegui perceber quem é o interlocutor ou com quem podia discutir o problema do traçado", vinca.Tudo isto seria evitado se "mudassem o traçado para a periferia da exploração", onde até o solo é de má qualidade, ao contrário da Quinta de São Vicente - que integra a zona dos barros de Beja, um dos solos mais férteis do país, conclui Filipe Passanha.
O presidente da Câmara de Ferreira do Alentejo, Aníbal Reis Costa (PS), admite ter existido falta de articulação e frisa que a obra foi planeada durante quase oito anos. "Devia ter havido mais concertação", defende, sublinhando porém que o corredor do traçado "já está definido há bastante tempo". A alternativa, mais a sul do actual, teria "danos ambientais" mais graves, em diversos povoamentos de montado.
Referindo-se ao impacte nos novos olivais, o autarca diz que realizou, há cerca de quatro anos, contactos "informais" com os empresários, incluindo os da Sociedade Taifas da Quinta de São Vicente, advertindo-os para as consequências se persistissem em plantar novos olivais. Mas "ninguém acreditou que a estrada viesse a ser construída".
A indemnização que a concessionária da obra oferece à empresa do olival cobre "apenas 25 por cento" do seu valor real, sustenta Filipe Passanha, frisando que já tem uma equipa de advogados a analisar este contencioso.
O PÚBLICO pediu ao Ministério da Agricultura esclarecimentos sobre a situação. A resposta foi telegráfica: "O Ministério da Agricultura não tem comentários a fazer."
Notícia corrigida às 20h36: substituído no nono parágrafo a contracção da prepopsição a com o artigo definido a por há, do verbo haver.
http://ecosfera.publico.pt/noticia.aspx?id=1487327
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