Entrevista
Margarida Vaqueiro Lopes
04/02/11 17:18
Maria Antónia Figueiredo afirma que a sociedade precisa de respeitar a
profissão do agricultor.
.
A presidente do Observatório dos Mercados Agrícolas alerta para a
necessidade de considerar a agricultura um sector estratégico.
Em declarações ao Económico, Maria Antónia Figueiredo, presidente do
Observatório dos Mercados Agrícolas e das Importações
Agro-Alimentares, diz-se preocupada com a vulnerabilidade de Portugal
em relação à escalada dos preços dos cereais nos mercados
internacionais. É que o país ainda importa mais de metade das suas
necessidades de consumo.
"De acordo com os dados estatísticos, Portugal importou, na campanha
2008/2009, 75% das suas necessidades de cereais. No caso do trigo,
este valor passou para os 88,7%", referiu a mesma responsável.
De referir que o preço do trigo, que em 2010 subiu 27,18%, prepara-se
para viver outro ano de valorização. É que desde o dia 1 de Janeiro os
preços deste cereal já subiram 8,7% nos mercados internacionais. No
mesmo sentido, os preços do milho aumentaram 5,8% desde o início do
ano, depois de em 2010 terem escalado quase 40%.
"Em Portugal a situação será complicada", sublinhou Maria Antónia
Figueiredo, notando que "com um grau de auto-aprovisionamento de
apenas 25% nos cereais em geral, o país ficará muito vulnerável à
volatilidade dos preços".
Os especialistas acreditam que esta tendência de subida dos preços se
vai manter, especialmente devido às várias intempéries que têm
afectado as colheitas dos principais países produtores de cereais. A
Austrália, que é um dos maiores exportadores de trigo e de milho, viu
as suas colheitas devastadas pelas maiores cheias dos últimos 50 anos,
em Janeiro. E quando ainda tentava contabilizar os estragos foi
assolada por um ciclone que derrubou as plantações resistentes.
No mesmo sentido, a Rússia foi no ano passado invadida por uma forte
seca, o que acabaria por condicionar tanto a produção como a
exportação da maior parte dos cereais produzidos no país e
consequentemente uma quebra nas reservas europeias.
"Estamos numa situação de fragilidade"
Maria Antónia Figueiredo lamenta que em Portugal não "haja sinais de
que algo esteja a ser feito" para diminuir o impacto deste aumento de
preços para o consumidor, lembrando que "em relação aos projectos de
investimento no âmbito do PRODER (Programa de Desenvolvimento Rural)
ainda não sentimos uma dinâmica em acção". E só dessa forma, nota, é
possível reduzir a exposição do país à volatilidade dos mercados e ao
aumento dos preços. É que, recordou, em 2010 o Índice de Preços do
cabaz dos produtos atingiu valores recorde, acima de todas as
expectativas.
E por isso a também secretária-geral adjunta da Confederação Nacional
das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola de Portugal
(CONFAGRI) sublinha que é cada vez mais urgente "considerar a
agricultura como um sector económico estratégico, de forma a fazer
face a esta situação" em Portugal.
É preciso "avançar rapidamente com medidas para colocar a metade de
Portugal que está actualmente desertificada e despovoada a produzir
bens alimentares", afirma.
"Neste momento temos cerca de 600 mil desempregados, sendo que uma boa
parte deles poderia voltar a dedicar-se à actividade agrícola. Para
isso precisam de ter escolas, infantários, médicos e centros de saúde.
Teria que ser uma opção nacional", sugeriu a responsável, que
salientou ainda a importância da "existência de uma Autoridade
Nacional com competências para fiscalizar a acção das grandes
superfícies sobre os que vendem os produtos agro-alimentares." Há um
grande desequilíbrio entre eles e, segundo alguns, há abusos. Existe
uma Autoridade da Concorrência que não funciona", alertou.
A presidente do Observatório dos Mercados Agrícolas considera ainda
que é necessário "dar algum 'status' à actividade de
agricultor/empresário agrícola. Considerar que ser agricultor é uma
profissão, uma actividade, que produz os alimentos para a nossa saúde,
bem-estar e sobrevivência".
E numa altura em que os preços dos alimentos a nível mundial atingiram
um novo recorde, segundo os dados da Organização Mundial de Saúde,
Maria Antónia Figueiredo realça a importância de o Governo, através do
Ministério da Agricultura, "apoiar a instalação de Jovens
Agricultores, através de medidas europeias e nacionais, bem como
agilizar as medidas de apoio que vêm de Bruxelas". A responsável
recorda que Portugal vai devolver à Comissão Europeia 170 milhões de
euros por má alocação dos controlos e do parcelário agrícola e defende
que é preciso "criar condições para não devolver dinheiro a Bruxelas".
http://economico.sapo.pt/noticias/portugal-esta-muito-vulneravel-a-subida-do-preco-dos-cereais_110357.html
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