sábado, 24 de maio de 2014

Alentejo - Plantação de eucaliptos em Alqueva deve merecer «forte repúdio social» -

Acréscimo
«Forte repúdio social», é como Paulo Pimenta de Castro, presidente da Acréscimo - Associação de Promoção ao Investimento Florestal, responde à sugestão manifestada pelo presidente do Conselho de Administração da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), favorável à plantação de eucaliptos em blocos de rega na albufeira. O responsável da Acréscimo é peremptório quanto às consequências ao nível ambiental, dos solos, da biodiversidade e dos «impactos negativos na paisagem».

Ana Clara | sexta-feira, 23 de Maio de 2014

As declarações do dirigente da EDIA, José Pedro da Costa Salema, ao jornal Público vieram de novo agitar a polémica da chamada «eucaliptalização». Isto depois de em Agosto de 2012 o actual Executivo ter apresentado uma proposta que altera a legislação sobre a arborização e rearborização do país, facilitando a plantação de eucalipto.

Paulo Pimenta de Castro, presidente da Acréscimo, refere ao Café Portugal que o investimento público em regadios «tem por fim o abastecimento de água potável às populações e para a produção agroalimentar».

«Para a produção lenhosa o País dispõe de 1,5 a 2 milhões de hectares abandonados. Mesmo para a irrigação de eucaliptais, estão disponíveis as águas resultantes dos tratamentos nas ETAR. A possibilidade, agora aventada pelo presidente da EDIA de destinar o esforço dos contribuintes para benefício de um negócio desenvolvido em oligopólio deverá merecer forte repúdio social», afiança o responsável.

Paulo Pimenta de Castro não tem dúvidas no que respeita às consequências da sugestão de José Pedro da Costa Salema, favorável à plantação de eucaliptos em blocos de rega na barragem de Alqueva. O dirigente da Acréscimo alerta para «a sustentabilidade do território, área do Alqueva incluído, com riscos que podem ser significativos».

E explica porquê: «por um lado, sobretudo decorrente do negócio associado a relações loose-win (perdas/ganhos) como o é o da produção de rolaria de eucalipto para a indústria de celulose, a inadequada gestão dos eucaliptais nacionais é potenciadora de incêndios florestais».

Depois, acrescenta Paulo Pimenta de Castro, aos dados estatísticos históricos desta catástrofe «há que adicionar o acréscimo de riscos associados às alterações climáticas, designadamente do anunciado aumento das temperaturas, com especial enfoque no sul da Europa».

«Impactos negativos na paisagem»:
Por outro lado, «o uso de espécies florestais em regime intensivo, de produção lenhosa, atípicas da região, pode ter impactos negativos ao nível da paisagem, com potenciais consequências no turismo, área de investimento que tende a crescer e a valorizar a região em causa».

O dirigente da Acréscimo recorda que «não se põe de parte a florestação em bosquetes com espécies autóctones, sobretudo de quercíneas, ou a constituição de linhas corta-vento com espécies de produção lenhosa, até para a protecção das culturas agro-alimentares, mas a constituição de áreas extensas de monocultura, a acrescer ao olival intensivo já instalado, aportará consequências ambientais nefastas, quer ao nível dos solos, quer na biodiversidade, e mesmo na actividade cinegética».

Para Paulo Pimenta de Castro, esta situação demonstra a intenção já manifestada no passado pelo actual poder político de insistir na chamada «eucaliptalização» do país. «A aprovação do Decreto-Lei n.º 96/2013 de 19 de Julho (que estabelece o regime jurídico das acções de arborização e rearborização com recurso a espécies florestais), é uma prova disso. Alucinados com o valor bruto das exportações, os responsáveis políticos não medem consequências a médio e longo prazo, sendo que a fileira da pasta e do papel nem é a fileira florestal que mais contribui para as exportações».

Paulo Pimenta de Castro afirma que o Governo «promove o aumento da oferta à indústria, sem acautelar os rendimentos a essa oferta, rendimentos esses que promovam a gestão das florestas, na qual se inclui a sua defesa contra os incêndios».

«Partem do princípios que nos cabe a nós, contribuintes, acarretar com parte significativa dos prejuízos decorrentes desta catástrofe estival. Todavia, o aumento descontrolado da oferta tem consequências, mantem à perpetuidade os preços controlados pela procura. Pior, acabará por colocar em causa os investimentos na certificação da gestão florestal sustentável levada a cabo por proprietários florestais nalgumas regiões do País», salienta.

O presidente da Acréscimo sublinha ainda que, comparativamente, «parece que retornámos à época dos Descobrimentos, onde se arrasavam florestas para a construção naval. Na altura, partia-se do princípio que a desflorestação era compensada com as especiarias e o ouro do Brasil. Actualmente, exportamos em valor bruto, depreciamos os nossos recursos naturais, para usufruto de investimento holandês (país de sede das principais empresas da indústria de base florestal a operar em Portugal)», vinca.

Paulo Pimenta de Castro está, assim, convencido de que o presidente da EDIA «se prestou a um exercício típico da actual governação: "atirar o barro à parede, para ver se cola". Dependendo da contestação que possa surgir, talvez venham a ocorrer atrasos nesta iniciativa».

Todavia, prossegue Pimenta de Castro, «importa ter em conta que o actual propósito já vem de trás. Esta possibilidade, de utilização de espécies de crescimento rápido em perímetros de rega constou já do programa eleitoral do Partido Socialista (PS) em 2011. Na altura sofreu fortes críticas em blogues afectos ao PSD. Hoje é como se vê».

Contudo, caso a intenção venha a passar do papel à prática, o responsável não tem dúvidas: vamos ter «um Alqueva diferente do que nos foi apresentado e que, a favor ou contra, financiámos através dos nossos impostos».

«Será muito provavelmente um Alqueva com os problemas associados às monoculturas lenhosas intensivas, inseridas em negócios financeiros que muito têm prejudicado o País, basta analisar as perdas decorrentes dos incêndios florestais, os económicos, mas também os sociais e ambientais», remata.

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