14 Março2011 | 11:46
Jeffrey D. Sachs - © Project Syndicate, 2008. www.project-syndicate.org
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O mundo está a atingir o limite da utilização de recursos. Sentimos os
seus impactos todos os dias em cheias, secas e tempestades
catastróficas - e consequente subida dos preços cobrados aos
consumidores. O destino depende agora se cooperamos ou somos vítimas
de uma ganância auto-destrutiva.
Os limites à economia global são novos e resultam da dimensão, sem
precedentes, da população mundial e da expansão, nunca antes vista, do
crescimento económico em todo o mundo. Actualmente, há sete mil
milhões de pessoas em todo o mundo, o que compara com apenas três mil
milhões e meio há um século. O rendimento médio per capita é 10 mil
dólares, sendo 40 mil dólares nos países ricos e 4 mil dólares nos
países em desenvolvimento. Isto significa que a economia mundial está
a gerar uma produção anual total de 70 biliões de dólares, face aos 10
biliões de dólares em 1960.
A economia chinesa está a crescer a uma taxa anual de 10%. A Índia
está a crescer, aproximadamente, à mesma taxa. Antes a região com mais
baixo crescimento, África está agora a crescer a uma taxa média de 5%
ao ano. No total, os países em desenvolvimento estão a crescer a uma
taxa de 7% e as economias desenvolvidas a 2%. Ou seja, a taxa média de
crescimento da economia global é 4,5%.
Por muitas razões, estas notícias são boas. O rápido crescimento
económico dos países em desenvolvimento está a reduzir os níveis de
pobreza. Na China, por exemplo, a pobreza extrema, que há 30 anos
atingiu cerca de metade da população, caiu, actualmente, para 10% ou
menos.
No entanto, a história do crescimento global tem um outro lado que é
necessário perceber claramente. Com a economia mundial a crescer entre
4 a 5% ao ano, irá duplicar a sua dimensão em menos de 20 anos. Se
extrapolarmos a taxa de crescimento actual, a economia global, que
hoje vale 70 biliões de dólares, irá atingir os 140 biliões de dólares
em 2030 e os 280 biliões de dólares em 2050.
Se deixarmos que a ganância prevaleça, o nosso planeta não terá
capacidade para suportar este crescimento económico exponencial. O
peso da economia está já a ter impactos na natureza, a destruir
rapidamente as reservas de combustíveis fósseis que a natureza criou
ao longo de milhões de anos, enquanto as alterações climáticas têm
provocado enormes instabilidades em termos de chuvas, temperaturas e
tempestades extremas.
Todos os dias, assistimos ao impacto destas pressões nos mercados. Os
preços do petróleo superaram os 100 dólares por barril, à medida que a
China e a Índia e outros países importadores de petróleo se juntam aos
Estados Unidos numa luta violenta pelas reservas, em especial do Médio
Oriente. Também os preços dos alimentos estão em máximos históricos, o
que contribui para aumentar a pobreza e os distúrbios sociais.
Por um lado, há mais bocas para alimentar e, em média, com um maior
poder de compra. Por outro lado, as ondas de calor, secas, inundações
e outros desastres provocados pelas alterações climáticas estão a
destruir as colheitas e a reduzir a oferta de sementes nos mercados
mundiais. Nos últimos meses, a produção de cereais de diversas regiões
da Rússia e da Ucrânia foi atingida por violentas secas, enquanto
enormes cheias atingiram o Brasil e a Austrália; actualmente, outra
seca está atingir a produção de cereais no norte da China.
Mas há uma questão muito perigosa e que é pouco falada. Em muitas
áreas populosas do mundo, incluindo as regiões produtoras de cereais
do norte da Índia, do norte da China e do oeste norte-americano, os
agricultores estão a recorrer a águas subterrâneas para regar as suas
colheitas. Os grandes aquíferos que fornecem água para rega estão a
esgotar-se. Em algumas zonas da Índia, o nível freático diminuiu
vários metros ao ano nos últimos anos. Alguns poços profundos estão
próximos do ponto de esgotamento e prevê-se um aumento da salinidade à
medida que a água do oceano se infiltra nos aquíferos.
Sem mudanças, uma calamidade é inevitável. E é aqui que Gandhi entra
em jogo. Se a nossa sociedade se rege pelo princípio da ganância, com
os ricos a fazerem tudo para serem mais ricos, a crescente crise de
recursos provocará um "gap" cada vez maior entre ricos e pobres - e
possivelmente levará a uma luta cada vez mais violenta pela
sobrevivência.
Os ricos vão tentar usar o seu poder para obter mais terras, mais
águas e mais energia e, se for necessário, muitos vão apoiar meios
violentos para o fazer. Os Estados Unidos já seguiram uma estratégia
de militarização no Médio Oriente com a ingénua esperança de garantir
um abastecimento seguro de energia. Agora, intensifica-se a competição
por essas reservas, à medida que a China, a Índia e outros países
procuram os mesmos recursos (que estão a esgotar-se).
Uma tomada de poder semelhante está a ser tentada em África. O aumento
do preço dos alimentos está a levar a uma apropriação de terras, à
medida que políticos poderosos vendem a investidores estrangeiros
grandes extensões de terras de cultivo, deixando de lado os direitos
tradicionais dos pequenos agricultores pobres. Os investidores
estrangeiros esperam utilizar grandes explorações mecanizadas para
gerar produtos destinados à exportação, deixando pouco ou nada para as
populações locais.
Em países como os Estados Unidos, Reino Unido, China e Índia, os ricos
desfrutaram de rendimentos cada vez mais elevados e de um crescente
poder político. A economia norte-americana está refém de
multimilionários, da indústria petrolífera e de outros sectores chave.
As mesmas tendências ameaçam as economias emergentes, onde a riqueza e
a corrupção estão a aumentar.
Se a ganância prevalecer, o motor do crescimento económico vai esgotar
os nossos recursos, marginalizar os mais pobres e levar-nos a uma
profunda crise económica, política e social. A alternativa é um
caminho de cooperação social e política, tanto a nível nacional como
internacional. Haverá suficientes recursos e prosperidade se
utilizarmos fontes de energia renováveis, práticas agrícolas
sustentáveis e um regime tributário razoável para os ricos. Este é o
caminho da prosperidade partilhada através de melhores tecnologias,
justiça política e consciência ética.
Jeffrey D. Sachs é professor de Economia e director do Instituto da
Terra na Universidade de Columbia University. Sachs é também
conselheiro especial do secretário-geral das Nações Unidas para os
Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
© Project Syndicate, 2010.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques
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