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Carlos Neves
"O optimista vê a luz ao fundo do túnel, mesmo quando ela não está lá;
O pessimista vai a correr apagá-la!"
Passámos as últimas décadas a ouvir discursos de despedida e elogios
fúnebres à agricultura portuguesa: Por causa da PAC e de muitas
causas, vozes do povo e elites encartadas concordaram que a
agricultura acabara em Portugal, se não acabara faltava pouco, não
tinha futuro, etc., etc. Recordo-me de tentar avisar que "as notícias
da nossa morte eram claramente exageradas", mas poucos me leram e
acreditaram. Depois veio a crise para o resto da economia e as "novas
oportunidades", as "novas tecnologias" e os sonhos de um emprego como
funcionário público atrás de uma secretária foram todos por água
abaixo e o pessoal lá teve de sair da sua "zona de conforto", uns
emigrando à procura de emprego, outros deixando as ideias feitas sobre
o fim da agricultura e arriscando investir numa actividade que,
afinal, talvez desse para sobreviver e, claro, tinha apoios para a
instalação. E assim, o país do "êxodo rural" que se lamentava com o
abandono da agricultura, porque "os jovens não querem trabalhar a
terra", ficou a saber que se inverteu a tendência e passaram a
"instalar-se" na agricultura 280 jovens por mês. E agora?
Bem, o pessimismo continua. Agora, em vez dos lamentos sobre o
abandono da agricultura, ouvimos os receios sobre o futuro destes
jovens agricultores, das suas explorações agrícolas e dos seus
investimentos. Que não têm formação, não têm experiência, que estão a
hipotecar o seu futuro…
São fundados os receios? Talvez. E então, soluções? Alternativas?
Suspender a instalação de jovens agricultores e voltar ao velho
discurso sobre o abandono da agricultura? Não pode ser, foram já
milhares os que se instalaram, continua a haver terra para cultivar e
gente para alimentar.
É provável que a formação de muitos seja insuficiente, mas desconheço
qualquer estudo sobre esse assunto; quem faz afirmações, fala com base
em impressões e senso comum. Nunca percebi porque não deixavam (não
deixam) fazer os cursos de jovem agricultor antes de apresentar o
projecto. Contudo, os que se instalam hoje têm mais formação de base
(ensino secundário e superior) ferramenta que lhes permite procurar
com mais sucesso a formação e apoio técnico que necessitem. Haja da
parte das empresas, universidades e organizações agrícolas capacidade
e iniciativa para disponibilizar esse apoio. Se for possível fazê-lo a
custo reduzido, no âmbito de serviços de acompanhamento pagos pela
PAC, melhor; Mas não fiquem à espera do dinheiro para os cursos
enquanto os mirtilos se estragam.
Os milhares de jovens que se instalam na agricultura, depois de darem
trabalho e passarem valor aos projectistas e a quem lhes forneceu os
investimentos (máquinas, plantações, etc.) poderão agora dar trabalho
e valor a quem os queira apoiar e acompanhar tecnicamente.
Com mais ou menos adversidades climáticas ou problemas técnicos, a
produção irá vingar. Resta depois o desafio do mercado. Organizar a
comercialização. Refundar cooperativas ou impulsionar novas
organizações de produtores. Defender a produção face à pressão de
intermediários e grande distribuição, que tem direito ao lucro, mas
que se forem deixados "à solta" vão querer ganhar num dia mais do que
o produtor ganha num ano. Haja coragem do poder político para lançar
leis que regulem o mercado (como a recente lei que penaliza as
promoções abusivas), para vigiar a sua execução e haja trabalho das
organizações agrícolas para defender essas leis e exigir o seu
cumprimento, pois é no mercado que se valorizam os produtos agrícolas
e será do mercado que virá o retorno para pagar o investimento e o
esforço de quem abraça o trabalho na terra.
Haverá falhas, desistências, falências? Certamente, acontece em todos
os sectores económicos. A agricultura não é excepção. Desconheço
qualquer estudo que demonstre taxas de insucesso na agricultura
superiores a outros sectores. Vejo, portanto, como muito positivo que
os jovens se instalem na agricultura, que arrisquem. Seria bom poder
coloca-los num simulador (faz muita falta a prática de estágios) mas
só na prática podemos testá-los e distinguir os empresários mais ou
menos competentes. Acho mil vezes melhor assumir que alguns possam
falhar do que deixar a terra abandonada à espera de um D. Sebastião
que venha fazer tudo certinho e direitinho.
Carlos Neves
O CAMINHO FAZ-SE CAMINHANDO
"Caminhante, as tuas pegadas
São o caminho e nada mais;
Caminhante, não há caminho,
O caminho faz-se ao andar.
Ao andar faz-se o caminho
E ao olhar-se para atrás,
Vê-se a senda que jamais
Se há-de voltar a pisar.
Caminhante, não há caminho,
Somente sulcos no mar."
António Machado (Sevilha 1875 - França 1939) - Cantares - O Caminho
Faz-se Caminhando.
http://www.agroportal.pt/a/2013/cneves7.htm
1 comentário:
Bom dia. Quero dizer ao autor que acho este texto de grande lucidez. E é exactamente o sentimento que partilho. Eu, com 37 anos, jovem agricultor, cheio de dúvidas e de medos, mas também de esperança. Eu, que espero pelo curso que nunca mais abre, mas vou aprendendo, caminhando, Eu, que não tenho formação na área, mas sou empresário e empreendedor. Eu que, quero contribuir activamente para a organização da produção e para o apoio técnico aos jovens. Eu que, tenho medo de falhar, mas acho que vou vingar. E os meus mirtilos não se vão estragar!
Vitor Nunes
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