Carlos Dias
16/04/2014 - 23:45
Só na última década desapareceram do Alentejo mais de 200 mil animais.
Falta de apoios, baixos preços pagos aos produtores e falta mão-de-obra, são as razões apresentadas.
Com o recurso ao caricato, vai realizar-se no próximo dia 30 de Abril, uma "manifestação" de ovelhas e cabras na Feira do Alentejo-Ovibeja, seguindo-se a sua deslocação por um antigo caminho utilizado em tempos idos pelos efectivos pecuários que se deslocavam entre as terras baixas do Alentejo meridional e as terras altas do Maciço Ibérico.
A iniciativa tem um duplo sentido: recordar um pouco da história regional associada aos percursos da transumância (deslocação periódica de gado) de e para o Alentejo, e alertar a opinião pública e a tutela para o desaparecimento anual de uma média de 20 mil ovinos e caprinos, só na região alentejana.
O argumento escolhido pelos dirigentes da Associação de Criadores de Ovinos do Sul (ACOS), uma "manifestação" de ovinos e caprinos, vai socorrer-se ainda das mensagens reivindicativas e da decoração "artística" doa animais, a forma encontrada para "bulir" com as consciências, "daqueles que não se importam com aquilo que se passa no campo" assume Castro e Brito presidente da ACOS.
O dirigente associativo descreve como ao longo da última década, a região perdeu 200 mil animais de um efectivo que chegava ao milhão.
"Se não actuarmos, em poucos anos não temos um único dos animais símbolo regional", adverte Castro e Brito.
O efectivo pecuário destes pequenos ruminantes " está a desaparecer" devido há escassez de apoios, aos preços baixos pagos ao produtor e também porque são cada vez menos as pessoas para darem assistência aos animais.
A estes constrangimentos junta-se a nova gastronomia que tem marginalizado os pratos tradicionais "porque o borrego dá trabalho a cozinhar" conjectura o presidente da ACOS.
O historiador José António Falcão que ao longo dos últimos 30 anos tem feito o levantamento do património artístico e religioso do Baixo Alentejo, também investigou as interligações entre a actividade pecuária e a fundação de alguns dos principais santuários do território.
"De facto, perscrutando com atenção o passado, acede-se a uma visão clara da estreita articulação entre o património edificado, as vias privilegiadas para os rebanhos – as canadas reais – e a prática religiosa".
É hoje evidente que durante séculos, a circulação de efectivos pecuários "transformou-se num dos principais recursos económicos do Baixo Alentejo", patente na regulamentação expressa em forais e outros documentos emanados da Coroa.
Com o incremento da agricultura extensiva, a partir dos meados do século XIX, sucederam-se "rudes golpes para a prática da transumância", salienta Falcão, frisando que "muitos proprietários rurais", beneficiando da pouca capacidade de intervenção das instâncias locais, começaram a limitar a circulação nas antigas canadas.
"Foi o princípio do ocaso de uma civilização pastoril" que hoje se reflecte no rápido desaparecimento dos animais, um fenómeno que a da ACOS e o Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja, se propõem inverter para "defender e revelar o património associado à prática transumante, desde a paisagem à gastronomia, o que deve constituir uma das prioridades da nossa região" conclui António Falcão.
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