26.01.2011
Nicolau Ferreira
A floresta mediterrânica tem menos folhagem de há duas décadas para
cá. Um estudo publicado recentemente na revista Proceedings of the
National Academy of Sciences mostra que a seca está a deixar as
árvores despidas, o que pode pressionar ainda mais os ecossistemas do
Mediterrâneo.
A equipa, que reuniu cientistas espanhóis e holandeses, estudou séries
meteorológicas entre 1987 e 2007. A análise mostrou que as alterações
climáticas provocaram um aumento da frequência e intensidade dos
períodos de seca. Isso trouxe consequências para a folhagem da bacia
do mediterrâneo.
"Esta situação traduz-se numa diminuição generalizada da copa das
árvores de todas as espécies. As plantas têm menos folhas porque têm
menos água, ou seja, adaptam-se à quantidade de água que dispõem",
explicou por comunicado Josep Peñuelas, um dos autores do artigo, que
é director da Unidade de Ecologia Global da Agência Estatal do
Conselho Superior das Investigações Científicas (CSIC), em Espanha.
As observações foram feitas nas matas da Espanha, onde os cientistas
observaram uma diminuição do número de folhas de diversas espécies de
árvores como a azinheira (Quercus ilex) ou o pinheiro-do-alepo ( Pinus
halepensis). A equipa construiu mapas da Espanha ao longo das duas
décadas onde há uma sobreposição notável entre a seca e o aumento de
perda de folhagem dos indivíduos.
"O que está a acontecer é que as árvores entram em stress", explicou
ao PÚBLICO por telefone o professor e investigador do Instituto
Superior de Agronomia João Santos Pereira. Segundo este especialista
em floresta mediterrânica, o fenómeno também é observado em Portugal,
principalmente "a sul do rio Tejo", apesar de não haver um estudo a
fundo.
Santos Pereira diz que estas árvores tornam-se mais vulneráveis. "Se
há ou não recuperação já é uma coisa que varia muito de caso para
caso, a nossa observação empírica é que as árvores têm cada vez menos
capacidade para recuperar", explicou, ou seja, acabam por morrer.
Se esta tendência se mantiver, "é natural que haja uma diminuição dos
números de árvores", disse o cientista português. Uma das dúvidas de
João Santos Pereira é, se no caso de Portugal a diminuição da folhagem
é a seca ou é uma relação entre a seca e o ecossistema onde as
espécies vegetais estão integradas.
Bosques assimilam menos CO2
Uma outra conclusão do estudo é a morte de comunidades de insectos e
fungos associados às espécies vegetais. "É o caso dos cogumelos que
crescem nas raízes das árvores e os insectos predadores e parasitas
que se alimentam de tudo isto. As secas podem levar estas comunidades
ao colapso por falta de alimento, resultando numa redução drástica na
abundância e na diversidade que se prolonga durante anos, uma vez
finalizada a seca", disse em comunicado o investigador Jofre Carnicer,
do Centro de Estudos Ecológicos e Evolutivos a Universidade de
Groninga, na Holanda, que também participou no estudo. A morte destas
espécies, terá impacto em todo o ecossistema.
Este factor vai de encontro às dúvidas de João Santos Pereira. Há
comunidades de azinheiras e sobreiros que estão doentes em regiões do
Alentejo, por exemplo. Anos antes de parecem doentes, o destino destas
árvores já está traçado. "Pode ser que haja doenças que estejam
introduzidas há algum tempo mas que ganhem força com o aumento de
temperatura", sugere o investigador.
A perda de folhagem vai diminuir a quantidade de CO2 que as plantas
absorvem para realizar a fotossíntese. "Sabe-se que os bosques captam
e retêm anualmente cerca de um terço das emissões de CO2 geradas pelas
actividades humanas", explicou Peñuelas.
Este fenómeno, além de entrar nas contas para o efeito de estufa torna
"as árvores mais susceptíveis ao stress", explica o cientista
português. Por outro lado, há menos produção de biomassa e florestas
menos ricas. Santos Pereira não encontra nenhuma fórmula milagrosa
para conseguir contornar este problema além de uma "gestão florestal
que tenha em conta estes fenómenos".
Para o investigador holandês, Jofre Carnicer, "a bacia mediterrânica é
uma importante reserva de biodiversidade a nível mundial, os impactos
das secas extremas são uma das ameaças mais evidentes para a
conservação da biodiversidade desta área".
http://ecosfera.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1477264
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