MARIANA OLIVEIRA
26/08/2013 - 00:00
Aconteceu em 2007, em 2010 e repetiu-se no ano passado. Já houve três
anos em que ardeu proporcionalmente mais nas Zonas de Intervenção
Florestal (ZIF) do que no resto do país. Os dados são do Instituto de
Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e mostram que estas
estruturas, que congregam várias propriedades com o objectivo de fazer
uma gestão conjunta da floresta, não estão a cumprir um dos seus
principais objectivos.
Em 2012, por exemplo, nos quase 847 mil hectares integrados nas ZIF
arderam perto de 12 mil hectares, o que significa uma taxa de 1,41%.
Contudo, nesse ano em Portugal continental esta percentagem era de
1,18%, o que significa que em proporção ardeu menos. A situação
repetiu-se em 2010 e 2007, tendo acontecido o inverso em 2008, 2009 e
2011.
Os dados fazem parte de uma apresentação feita por uma responsável do
ICNF no encontro nacional de ZIF, em Abril. E, apesar de o número de
ZIF constituídas e da sua área terem cumprido as metas definidas pelo
Plano Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios, até os serviços
florestais reconhecem que há problemas no seu funcionamento.
"Embora esta medida de política possa ser considerada como um êxito,
dado terem sido criadas 162 ZIF, as quais cobrem cerca de 848 mil
hectares do território, têm intervenção de 57 organizações de
produtores florestais e sete empresas privadas e envolvem cerca de 21
mil proprietários ou produtores florestais que a elas aderiram,
reconhece-se que a grande maioria das ZIF tem tido um funcionamento
deficiente", lê-se num memorando do ICNF, que faz a síntese do
encontro.
Inês Mariano, da Aflomação, uma entidade que gere cinco ZIF no
concelho de Mação, não fica surpreendida com o facto de haver anos em
que proporcionalmente arde mais nestas áreas, que deveriam estar a
fazer uma gestão activa da floresta. "No minifúndio, ser área ZIF ou
não é igual, apenas tem mais papel associado. Mais planos, muitos
planos, mas no terreno vai dar ao mesmo", lamenta Inês Mariano.
A engenheira florestal conta que conseguiram contactar à volta de 5000
proprietários que aderiram às ZIF de Mação. "Mas depois o Estado
falhou. Não há dinheiro e os apoios existentes para os proprietários
individuais são quase os mesmos que estão à disposição de quem integra
as ZIF", refere. Inês Mariano nota que não se está a fazer gestão
florestal, apenas alguns projectos de defesa da floresta contra
incêndios que ajudam a retirar algum do combustível existente na
floresta. "São acções pontuais que não têm grande impacto."
Por isso, apesar do imenso trabalho, às vezes, sente que está a atirar
tempo fora. "Em 2003, arderam 20 mil hectares no concelho de Mação.
Muito trabalho foi feito, mas se houver um incêndio pode voltar a
arder o mesmo."
João Soares, ex-secretário de Estado das Florestas, esteve envolvido
no lançamento das ZIF e explica que no início foram criadas como áreas
de condomínio. "Como num condomínio urbano, em que os vários
proprietários ficam obrigados a regras mínimas", resume.
Mais tarde evoluiu-se para um modelo em que as entidades gestoras das
ZIF podiam intervir directamente nos espaços florestais. "Mas como não
possuem personalidade jurídica estão impedidas de concretizar uma
coisa tão simples como comprar e vender bens", precisa o
ex-governante. E concluiu: "Há uma falha entre a ambição e a
possibilidade legal."
O acesso aos fundos públicos, como o Proder ou o Fundo Florestal
Permanente, são outro problema. "Como factor limitante do bom
funcionamento foi indicada a falta de financiamento, nomeadamente do
Fundo Florestal Permanente. A exigência de garantias bancárias por
parte do Proder foi também referida como sendo um obstáculo ao
financiamento de projectos, em particular nas regiões do minifúndio",
reconhece o memorando do ICNF.
As candidaturas ao Proder até ultrapassam as verbas disponíveis, mas
muitas ficam pelo caminho. "Foram apresentadas 411 candidaturas de
entidades gestoras de ZIF, e aprovadas 219, com um apoio orçamentado
em 51 milhões de euros. Porém, a execução, à data, é de apenas cinco
milhões de euros", resumia o ICNF, em Abril.
Luciano Lourenço, o professor universitário que dirigiu a extinta
Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais, diz que as ZIF
"existem, mas não estão a cumprir os objectivos". O investigador
sublinha que "muitas estão criadas no papel mas não têm substância" e
acabam reféns de numa lógica ocasional, que não assegura uma gestão
efectiva dos espaços. "Tem-se limitado a concorrer a fundos que lhes
permitem assegurar alguns projectos de limpeza de povoamentos e
criação de faixas de gestão", critica. E remata: "Tem havido um
desinvestimento contínuo e sistemático na floresta, que na década de
1970 e 80 era rentável."
http://www.publico.pt/portugal/jornal/zonas-de-intervencao-florestal-arderam-mais-do-que-o-resto-do-pais-em-2007-2010-e-2012-27004110
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