segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Revolta árabe afecta bolso dos portugueses


Cereais e oleaginosas podem fazer subir gastos alimentares entre 7,4 e 12 por cento
21.02.2011 - 10:59 Por Rosa Soares
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Mais um cêntimo em cada pão, cinco cêntimos no café, aumentos
inevitáveis no leite e em muitos outros produtos alimentares.
(Pedro Cunha/ arqiuvo)
Estas são as notícias que estão a chegar às famílias, numa conjuntura
já extremamente negativa: taxa de desemprego elevada, corte de
salários, aumento de impostos e recessão económica.

Revivendo um pesadelo já sentido em 2008, a que se seguiu uma fase de
correcção, os preços de algumas matérias-primas votaram a atingir
níveis recordes. No último ano, e citando apenas alguns exemplos, o
peço do trigo subiu 62% e o do milho 58,7%; a soja aumentou 42,4% e o
petróleo no mercado spot 20,2% (ver infografia). Apenas o arroz
contrariou a tendência geral de subida.
Pior do que os aumentos já acumulados, que começam a reflectir-se nos
preços dos bens alimentares e outros produtos finais, a trajectória de
subida das matérias-primas não dá sinais de abrandar, o que significa
que as más notícias para as famílias podem agravar-se ao longo do ano,
numa altura em que uma percentagem significativa delas já não tem
margem para acomodar mais despesas.
De acordo com dados da Kantar Worldpanel, especializada em estudos de
mercado, 73% das famílias portuguesas já sente o impacto da crise
(desemprego, aumento de impostos e de preços e corte de salários). O
estudo, feito a partir do acompanhamento de três mil agregados
familiares, revela que apenas 27% dizem não sentir esse impacto. Mais
preocupante é que, do universo total das famílias, 19,2% afirmam
sentir muitas dificuldades económicas e admitem não ter margem para
suportar novas despesas.
Álvaro Santos Pereira, economista, sublinha que o aumento dos bens
alimentares afecta de forma desproporcionada os mais pobres, que
tendem a gastar mais em alimentação.
Em reacção à crise económica dos últimos dois anos, uma parte
significativa das famílias tem feito um esforço para conter os gastos
do supermercado, optando pela escolha de produtos mais baratos, pelas
chamadas "marcas brancas" e pela substituição de produtos (peixe
congelado em vez de peixe fresco; pão em vez de cereais), ou ainda por
comprar em promoções.
Mesmo assim, o gasto médio dos lares portugueses em produtos de grande
consumo, onde se incluem os produtos alimentares, registou uma subida
de 1,57% no segundo semestre do ano passado, face ao período homólogo
de 2009.
Para essa subida contribuiu o agravamento da inflação e o aumento do
IVA para 20% em alguns produtos, bem como a subida de alguns bens
alimentares e matérias-primas.
Perspectivas pessimistas
O aumento dos bens alimentares decorre da forte subida que se está a
verificar nos preços de algumas matérias-primas (em especial os
cereais e oleaginosas) e indirectamente através da subida do preço do
petróleo, que afecta custos de produção, como os combustíveis, adubos
e pesticidas.
Com a ajuda de Armando Sevinate Pinto, antigo ministro da Agricultura,
o PÚBLICO fez um cálculo de qual pode ser o impacto de uma subida de
30 ou 50% no preço dos cereais e das oleaginosas, que representam
perto de 40% das nossas importações totais de bens alimentares.
Partindo do valor de importações alimentares em 2010, cerca de 6,2 mil
milhões de euros, e tendo em conta que os cereais e as oleaginosas
(especialmente soja) representam perto de 40% desse valor, um aumento
de 30% dos preços destes dois tipos de produtos representa uma subida
de custo de importação de 744 milhões de euros.
Se o aumento atingir os 50% - o que pode não ser exagerado, dada a
subida de preços de alguns produtos de 70%, 80% e em alguns casos
acima de 100% verificada no último ano -, as importações agravam-se em
1240 milhões de euros.
Tendo em conta que o valor médio do consumo dos portugueses em bens
alimentares, que ascenderá a 10 mil milhões de euros, os dois cenários
de subida de preços, só para os cereais e as oleaginosas, implicam um
aumento entre 7,4% e 12,4% desse valor. Este cenário, embora parcial,
pois assenta apenas na estimativa de subida dos preços dos cereais de
oleaginosas, é apesar de tudo mais favorável do que a previsão da FAO,
que estima uma subida dos bens alimentares em 15% para 2011.Sevinate
Pinto destaca que a favor de Portugal está a dependência externa ser
apenas de 30%. O país tem um valor médio de consumo de 10 mil milhões
de euros, produz sete mil milhões, importa 6,2 mil milhões, mas
exporta três mil milhões.
Contudo, o país acaba por ser duplamente prejudicado pela subida de
preços nos mercados internacionais, pois importa grandes quantidades
de cereais e oleaginosas, que registam fortes subidas, ao passo que
exporta essencialmente produtos que não beneficiam dessas subidas. Por
outro lado, fica ainda prejudicado pela subida dos preços do petróleo.
Santos Pereira destaca que nem todos os impactos serão negativos:
"Algumas famílias com rendimentos agrícolas tenderão a beneficiar e é,
assim, bastante provável que o emprego agrícola comece de novo a
aumentar."
http://www.publico.pt/Mundo/revolta-arabe-afecta-bolso-dos-portugueses_1481320?all=1

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