CARLOS DIAS
02/12/2013 - 10:48
Cidadãos do Leste europeu deambularam sem dinheiro e alojamento até
que se iniciassem os trabalhos nos olivais do Alentejo. Associação de
Solidariedade Imigrante diz que, nesta altura, há entre dez a 15 mil
trabalhadores imigrantes na região.
Autoridades reforçaram a fiscalização na altura da apanha da azeitona
no Alentejo ENRIC VIVES RUBIO
Tal como aconteceu em anos anteriores, milhares de romenos rumam nesta
altura do ano em autocarros, carrinhas e carros utilitários para
trabalhar na apanha de azeitona na região alentejana. Acontece que a
grande maioria veio antes de a campanha se iniciar (a maturação da
azeitona sofreu um atraso de semanas) e foram deixados em vários
concelhos do distrito de Beja sem condições para suprir as suas
necessidades básicas.
"Não tinham dinheiro, nem onde ficar e estavam a passar fome",
adiantou ao PÚBLICO Teresa Chaves, presidente da Cáritas Diocesana de
Beja, frisando que foi necessário recorrer à Cruz Vermelha e à
Segurança Social para acudir às situações mais críticas.
Este é o cenário que se repete nos campos do Alentejo desde há três
anos. Depois dos ucranianos e brasileiros, chegam agora naturais da
Roménia, Nepal e até do Vietname, contratados por indivíduos romenos,
espanhóis e israelitas que os sujeitam a situações laborais à margem
da lei e que as autoridades portuguesas têm vindo a sancionar desde o
início de Novembro.
Alberto Matos, responsável da delegação do Alentejo da Associação de
Solidariedade Imigrante, recorda que em 2011 as autoridades assumiam
que as denúncias sobre exploração de mão-de-obra romena "eram
histórias inventadas pelos jornais" ou admitiam que "não havia nada a
fazer" por se tratar de trabalhadores comunitários.
Agora, acrescenta, são várias as entidades que "se meteram ao
caminho": Polícia Judiciária, Serviços de Estrangeiros e Fronteiras,
Autoridade para as Condições de Trabalho e Guarda Nacional Republicana
estão a "competir entre si" no combate à exploração de mão-de-obra
imigrante. Alberto Matos admite que estarão na apanha de azeitona no
Alentejo "entre 10 a 15 mil trabalhadores imigrantes" na sua grande
maioria romenos.
"Estamos perante uma situação problemática que envolve tráfico e
exploração de pessoas", assinala, por seu turno, Teresa Chaves.
Acções de fiscalização
As acções de fiscalização que têm sido efectuadas revelam uma
repentina preocupação das autoridades portuguesas pela dimensão de um
fenómeno que era esperado desde que foi iniciada a plantação maciça de
olivais intensivos e superintensivos no território abrangido pelos
blocos de rega do Alqueva, em meados da década anterior. O novo modelo
agrícola baseado no regadio requer muita mão-de-obra e sempre foi
dito, por especialistas, que a região não tinha condições para
responder.
No entanto, o Baixo Alentejo apresenta uma das mais elevadas taxas de
desemprego do país, cerca de 17.000 desempregados em Outubro. Apesar
disso, e de acordo com várias fontes, os empresários agrícolas
preferem a mão-de-obra imigrante.
Henrique Coroa, um agricultor de Beja que contrata trabalhadores
imigrantes, tem uma explicação para este paradoxo. "A maioria dos
desempregados na nossa região não se dispõe a ir trabalhar para o
campo por achar que isso representa um desprestígio social", diz,
acrescentando que parte "são pessoas instruídas que não querem
desempenhar tarefas na agricultura".
Por outro lado, os imigrantes "são muito mais rápidos" na execução das
tarefas, explica Henrique Coroa. "São a nossa sorte, senão a produção
de azeite no Alentejo parava", observa.
Confrontado com as denúncias que têm sido feitas pelas autoridades
sobre o tráfico e exploração da mão-de-obra imigrante, Henrique Coroa
reconhece que esta situação não abona a imagem da região, afirmando
que no seu caso só contrata imigrantes "dentro da legalidade".
Exploração, diz PCP
O PÚBLICO deslocou-se ao Centro de Emprego de Beja e pediu dados sobre
as ofertas de emprego disponíveis. "Só temos para o estrangeiro", foi
a resposta obtida, referindo-se a cerca de 200 ofertas para os Estados
Unidos da América, quase sempre para pessoal qualificado e altamente
qualificado com formação superior.
O deputado do PCP João Ramos pediu recentemente à ministra da
Agricultura e do Mar, Assunção Cristas, através de um requerimento
entregue na Assembleia da República, que explicasse as razões que
obrigam a que produção agrícola em Alqueva esteja "dependente de
trabalho clandestino" e da "desregulação das relações laborais".
A ministra respondeu que a "EDIA e os serviços do Ministério da
Agricultura e Mar têm mantido uma ligação estreita com as autoridades
com responsabilidade na fiscalização das condições de trabalho, sempre
pugnando por uma melhoria dessas condições". Sempre que se verifique
"o desrespeito pelas condições de trabalho" as "referidas entidades
serão alertadas", garante Assunção Cristas.
O deputado comunista não ficou satisfeito com a resposta e considerou
"inaceitável que numa das mais importantes áreas agrícolas do país,
precisamente aquela que tem maiores condições para se modernizar e
para se desenvolver, se possa recorrer a formas de exploração do
trabalho de há vários séculos atrás".
http://www.publico.pt/local/noticia/distrito-de-beja-tem-17-mil-desempregados-mas-sao-romenos-nepaleses-e-vietnamitas-que-apanham-a-azeitona-1614646
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