Ana Sanlez, RTP
14 Mai, 2012, 12:06 / atualizado em 14 Mai, 2012, 12:08
Inácio Rosa, Lusa
Onde há menos de um ano havia dois ministérios, hoje existe apenas um
tutelado por Assunção Cristas. Mas a fusão das pastas da Agricultura e
Pescas com a do Ambiente e Ordenamento do Território foi, para o
presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal, uma má
decisão do Governo e um "plano de marketing para as eleições" que deve
ser corrigido. Numa entrevista publicada na edição desta segunda-feira
do Jornal de Negócios, João Machado não poupa críticas ao MAMAOT,
acusando o organismo de má gestão das verbas comunitárias.
Um Ministério que é um "pavor". É com palavras duras que João Machado
classifica a atuação do Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e
Ordenamento do Território nos 11 meses que leva de mandato. Para o
presidente da Confederação dos Agricultores, o pacote "dois
ministérios pelo preço de um" implementado pelo Executivo de Passos
Coelho foi uma medida danosa para o setor agrícola nacional.
"Os dois ministérios económicos em Portugal estão sobrecarregados. O
Ministério [da Agricultura] é demasiado pesado e pode funcionar no
futuro demasiado mal", considera João Machado. Segundo o líder da CAP,
os cortes na estrutura do Ministério foram muitos, mas feitos
"cegamente e nos sítios errados". "Em vez de se reestruturar, fundir,
melhorar os serviços, o que se fez foi empurrar pessoas para fora",
declara.
Quanto às que entram, José Machado tem dúvidas. Segundo o presidente
da CAP, os atuais responsáveis por controlar as explorações agrícolas
portuguesas "nunca viram, não sabem o que é uma vaca". Provêm de
outsourcing.
Gaspar e Cristas, os "melhores amigos"
Num ano atípico em que a seca castigou severamente os agricultores e
deixou "praticamente tudo perdido", João Machado assinala que no
Ministério de Assunção Cristas só se deu conta do problema quando já
era "tarde demais". O pedido de antecipação dos fundos comunitários de
modo a fazer face aos prejuízos foi feito a Bruxelas, mas João Machado
teme que o dinheiro não chegue antes de dezembro.
E explica porquê. "Para a UE permitir que a antecipação seja feita,
determinados procedimentos do Estado-membro têm de estar totalmente
feitos. O Estado português atrasa-se sempre", lamenta. "Falta de
pessoas, falta de meios, sistemas informáticos arcaicos" justificam o
embargo. Dos 600 milhões de euros a que Portugal tem direito em verbas
destinadas à agricultura, João Machado pede ao Estado que até outubro
tente fazer chegar aos agricultores 400 milhões de euros comunitários,
"mais 120 milhões que estão lá cativos" desde o ano passado.
A 14 de abril último, o secretário de Estado da Agricultura, José
Diogo de Albuquerque, avançava que o Governo pediu a antecipação das
reservas para 16 de outubro, mas falou em valores diferentes.
"Portugal recebe de ajudas diretas, ao todo, cerca de 600 milhões de
euros. Estamos a falar de uma antecipação de 50 por cento - 300
milhões de euros - já para outubro", revelou então o governante.
Também o Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER), que apoia
projetos agrícolas, não está a progredir da forma que João Machado
esperava. "O Ministério das Finanças vai ficar o melhor amigo da
Ministra da Agricultura, porque ela tem 150 milhões para gastar, tem
agricultores a apresentar projetos e a investir e a criar emprego, e
depois não paga", denuncia. "Se calhar há aqui uma questão política
que é atrasar os pagamentos", acrescenta o presidente da CAP.
De acordo com João Machado, até à semana passada foram gastos 18
milhões de euros do PRODER, contrariando as garantias de Cristas,
quando a 21 de fevereiro assegurara que "na segunda-feira (27 de
fevereiro) faremos os primeiros pagamentos deste ano, no valor de 52
milhões de euros".
Bolsa de terras de "cotação" duvidosa
A criação de uma "bolsa de terras" tem sido uma das grandes bandeiras
do mandato da Ministra da Agricultura no sentido de dinamizar o
sector. Na prática, prevê-se que os terrenos cujo dono é desconhecido
e que se encontrem inutilizados sejam apropriados pelos Estado, com a
possibilidade de serem vendidos dez anos depois de terem entrado no
banco de terras. O legítimo proprietário dos terrenos vai dispor de um
prazo legal para provar ser o dono do terreno, mas caso não aconteça,
será reconhecido o abandono e a terra passará a ser gerida ou
arrendada pelo Estado.
"O grande objetivo é aumentar a nossa produção quer na área agrícola,
que na área florestal e também de atrair mais gente para a
agricultura, nomeadamente jovens", desvendou Assunção Cristas em
março.
Um projeto ambicioso mas que para João Machado não passa de "um grande
bluff" nos termos em que está formulado. Em primeiro porque "foi
cometido um erro, de ligar a bolsa de terras à reforma agrária. É um
erro político muito grave". "O Governo não pode, de maneira nenhuma,
fazer propaganda política e muito menos apropriação com um processo
que vem de 1975. O Estado não pode tomar posse das terras que não sabe
de quem são", acrescenta indignado.
Uma "péssima solução" que, segundo João Machado, não vai passar do
papel. "Nem o que a proposta de lei em de bom algum dia vai estar em
vigor, está uma salgalhada", conclui. "Quem é dono da terra, é dono da
terra. Não admitiremos nenhuma nacionalização".
Confrontada com o argumento em abril, Assunção Cristas garantiu que a
bolsa de terras não vai "açambarcar terra para o Estado" nem "tirar
terra a ninguém", porque o projeto está assente no "total respeito
pela propriedade privada". As propostas deverão ser discutidas na
Assembleia da República até ao mês de julho.
http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=553483&tm=9&layout=121&visual=49
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