Postura de Anne Glover, conselheira científica principal da União
Europeia, condenada como "irresponsável".
Investigadores independentes têm de trabalhar a dobrar para responder
aos alertas pendentes
O número de cientistas e especialistas que subscreveram uma Declaração
Conjunta [1] afirmando que a segurança dos alimentos transgénicos
(OGM) continua por demonstrar aumentou para 297 desde a sua publicação
a 21 de outubro.
A Doutora Angelika Hilbeck, presidente da Rede Europeia de Cientistas
pela Responsabilidade Social e Ambiental (ENSSER) que publicou a
Declaração, disse: "Estamos surpreendidos e satisfeitos pelo forte
apoio que a Declaração recebeu. Parece que veio ao de cima uma
preocupação sentida na comunidade científica internacional é
precisamente que o nome da ciência esteja a ser abusado para dar
cobertura a uma falsa segurança da engenharia genética."
Este testemunho indiretamente questiona afirmações recentes de Anne
Glover, conselheira científica principal da União Europeia, que
defendiam a inocuidade dos OGM. [2]
A Doutora Rosa Binimelis, membro da direção da rede ENSSER, explicou:
"Aparentemente a Dra. Anne Glover prefere dar ouvidos a um só lado da
comunidade científica – o círculo de produtores de OGM e os cientistas
seus aliados – e ignora os restantes. Isso resulta numa visão
tendenciosa que depois passa para a Comissão Europeia. Para alguém com
funções de Conselheiro Científico, isso é irresponsável e pouco
ético."
Entre os novos subscritores encontra-se o Doutor Sheldon Krimsky,
professor de política e planeamento urbano e ambiental na Universidade
de Tufts e professor adjunto no Departamento de Saúde Pública e
Medicina Familiar da Faculdade de Medicina da mesma universidade, que
comenta:
"Enquanto cético dos OGM tenho uma posição mais nuanceada das suas
consequências adversas do que os seus defensores acríticos. Os efeitos
negativos não se resumem a cair para o lado morto depois de ter comido
algum alimento geneticamente adulterado, como alguns querem fazer
crer. As minhas preocupações abarcam as alterações subtis do perfil
nutricional, do teor de micotoxinas e de alergénios, as práticas
agrícolas insustentáveis, a dependência de agroquímicos sintéticos, a
falta de transparência nas avaliações de segurança alimentar e
ambiental e ainda a despromoção dos agricultores para algo que nos
traz o servos da gleba à memória, essencialmente devido à privatização
monopolista do direito de acesso à semente. "
"Para demonstrar a segurança dos transgénicos é preciso: começar por
assumir que eles possam ser perigosos, desenvolver testes sensíveis e
demonstrar que não foi possível detetar nenhum problema. Tal como
noutras tecnologias, como a aeronáutica e o nuclear, a indústria
envolvida não pode ser a fonte oficial sobre a segurança dos seus
produtos. Vou manter-me cético enquanto não for levada a cabo uma
avaliação de segurança rigorosa e credível."
Uma outra subscritora é a Doutora Margarida Silva, bióloga e
professora na Universidade Católica Portuguesa, que lembra que, "Mesmo
quando os investigadores estão todos de acordo sobre um determinado
assunto isso não significa que estejam corretos: de acordo com
Einstein, basta uma experiência para deitar abaixo uma teoria
estabelecida."
"Um dos problemas da investigação sobre os riscos dos transgénicos é
que tem sido feita pelas próprias empresas empenhadas na sua
comercialização. Infelizmente já foi demonstrado que se dá uma erosão
fatal da imparcialidade quando a ciência está à sombra do dinheiro da
indústria. Se queremos mesmo saber o que os transgénicos significam
para a saúde e o ambiente teremos de pedir aos poucos cientistas
independentes que ainda existem nesta área para se desdobrarem e
tentarem responder às questões e sinais de perigo que não param de se
acumular."
Um terceiro subscritor, o Doutor Raul Montenegro, biólogo da
Universidade de Córdoba, na Argentina, afirma:
"A avaliação corrente dos transgénicos (OGM) não leva em linha de
conta quatro dimensões essenciais. A primeira é que os transgénicos e
seu derivados contêm, não apenas resíduos dos pesticidas sintéticos
usados comercialmente, mas também as proteínas inseticidas (como a
Cry1Ab) produzidas pela planta. As sementes do milho transgénico MON
810, por exemplo, contêm 190 a 290 ng/g de Cry1Ab. A segunda dimensão
que é descurada é que cada pesticida comercial contém uma sopa de
substâncias diversas (para além do princípio ativo) que estão sujeitas
a alterações químicas, seja dentro das embalagens, quando se fazem
misturas com outros pesticidas e depois de libertadas no ambiente. A
terceira é que na agricultura com transgénicos cada ciclo de produção
já começa com uma maior concentração de fundo de pesticidas comerciais
e proteínas inseticidas previamente acumuladas em solos e pessoas
expostas. E, finalmente, a quarta e última dimensão é que os OGM
acrescentam uma biodiversidade indesejada (os transgenes) em países
que já têm cada vez menos diversidade natural devido à desflorestação,
pesticidas e ao fluxo incontrolado dos genomas manipulados."
"Países como a Argentina e o Brasil são autênticos paraísos para a
agricultura com transgénicos porque os seus governos não montaram, nem
um sistema de deteção de doenças e mortes resultantes de todas as
causas, nem um programa de monitorização da acumulação (em pessoas e
no ambiente) dos resíduos de pesticidas e proteínas inseticidas
transgénicas, nem um mecanismo de deteção precoce de variações nos
índices de biodiversidade natural. Só com estes cuidados é que seria
possível acompanhar os reais impactos dos transgénicos. Na prática
estes governos optaram por negar que o rei vai nu, a contracorrente
dos muitos relatos de comunidades afectadas e dos médicos que as têm
tratado."
[1] http://www.ensser.org/increasing-public-information/no-scientific-consensus-on-gmo-safety/
[2] http://www.euractiv.com/science-policymaking/eu-chief-scientist-unethical-use-interview-530692
http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2013/12/11c.htm
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