Paulo Pimenta de Castro
Num recente artigo de opinião, publicado no Diário de Notícias a 3 de fevereiro último, com o título “Diploma acusado de eucaliptizar... que grande confusão”, foi feita alusão à iniciativa “Plataforma pela Floresta”. Esta foi subscrita a 21 de janeiro por 20 organizações e 15 personalidades, com o objetivo de requerer a revogação do Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho, o diploma que veio alterar o regime de licenciamento das (re)florestações com eucalipto.
No referenciado artigo de opinião, pretendeu-se descentrar os considerados enunciados pela “Plataforma pela Floresta”. Argumenta o crítico da “Plataforma pela Floresta” que o diploma contestado não passa de um mero diploma de fomento florestal, não tendo como fim abarcar outras questões que lhe são apontadas. Importa todavia ter em conta que as críticas apontadas ao DL 96/2013 se centram numa abordagem política, não técnica.
A aposta em novos investimentos, sem um enquadramento num todo de ciclo florestal, tem suscitado péssimos resultados nas últimas décadas. Logo, uma aposta política no fomento florestal sem enquadrar os problemas da gestão florestal e da concorrência imperfeita nos mercados, que a condiciona, torna esta iniciativa do governo num ato avulso, extemporâneo, mesmo irresponsável se atendermos aos seus impactes ao nível dos incêndios florestais. O mesmo pode ainda ser classificado como opaco, já que surge sob condicionamento público manifestado por um grupo empresarial, e até como unidirecional, já que a este dirige benesses.
Portanto, mais do que numa abordagem técnica, o DL 96/2013 tem de ser centrado numa abordagem política, leia-se de política florestal, de política de ordenamento do território, de política de desenvolvimento rural, de política de concorrência, de política económica, do conceito de sustentabilidade e dos princípios de responsabilidade social e ambiental. Neste domínio, o DL 96/2013 protagoniza um verdadeiro ato fraturante, o que aliás está bem visível se atendermos à lista de subscritores da “Plataforma pela Floresta” e pelos mais diversos motivos.
No artigo de opinião, numa análise aliás antes avançada pelo secretário de Estado das Florestas, o DL 96/2013 aparece com a justificativa da desburocratização. Será assim?
Importa, em primeiro lugar, não confundir desburocratização com simplicismo ou a proteção de negócios fora das salutares regras de funcionamento dos mercados. Se por um lado o DL 96/2013 vem simplificar as regras de investimento com eucalipto, por outro vem impor regras às demais espécies florestais, às autóctones, coisa que antes não ocorria.
Afinal, desburocratiza ou burocratiza? Depende pois do ponto de vista: Para a fileira da pasta celulósica e do papel, desburocratiza e isso é que parece importar. Tende a aumentar a oferta de rolaria, logo influenciará os custos de abastecimento.
Por outro lado, se o governo vê condições para suportar esta cultura, a do eucalipto, porquê centrá-la exclusivamente num único produto, a produção de rolaria para pasta celulósica? Porque não fomenta a utilização desta espécie para outros usos de maior valor acrescentado, ou para a redução a nossa dependência energética? Bom, talvez esta iniciativa governamental vise agentes empresariais em concreto.
Na leitura do artigo de opinião, aparece depois o argumento da “selva legislativa”.
O DL 96/2013 não se vem inserir numa área antes desregulamentada, muito pelo contrário Assim, tudo leva a crer que o conceito de “selva legislativa” não se consubstancie na ausência de regulamentação anterior.
Será por existir regulamentação a mais? Isto claro, segundo alguns agentes económicos. Bom, no caso talvez se entenda o conceito e a similitude entre desburocratizar e simplificar o negócio dalguns.
Será pela incapacidade política em fazer cumprir a legislação nacional que antes regulamentava os investimentos com recurso a espécies de rápido crescimento? Se for esta a ideia subjacente à dita “selva legislativa”, a da caducidade de diplomas legais por incumprimento generalizado, o que nos garante que o DL 96/2013 não terá o mesmo destino? Houve reforço das estruturas de fiscalização? Não creio. Assim, no artigo em análise, o alegado “dano marginal” facilmente poderá progredir para dano generalizado. Em todo o caso, saem premiados os infratores, já o Estado claudica.
Por último, é feita uma alusão aos subscritores da “Plataforma pela Floresta”. Aqui, é falso que entre os seus subscritores não constem organizações de produtores. Elas estão lá e de forma bem visível, logo ao nível de uma organização de 3.º grau. Mais, entre os subscritores da “Plataforma pela Floresta” está uma associação industrial, a que representa a fileira silvo-industrial que mais contribui para a economia, para as exportações e para o emprego no setor florestal.
Mas vamos às outras, às organizações não setoriais. Alguém acredita que os negócios florestais se restringem a produtores e industriais? Erro crasso! Infelizmente, todo a Sociedade, representada nas mais variadas organizações cívicas, é chamada a intervir nos encargos económicos, ambientais e sociais decorrentes de uma política florestal definida à medida. Têm por isso as demais organizações toda a legitimidade de abordar assuntos de política florestal.
As temáticas florestas não são restritas a “clubes”.
Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro Silvicultor
Presidente da Direção da Acréscimo – Associação de Promoção ao Investimento Florestal
Ex-secretário geral da Federação dos Produtores Florestais de Portugal
Ex-secretário geral da Associação Nacional das Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente
Ex-presidente da Direção do Conselho da Fileira Florestal Portuguesa
Publicado em 15/03/2014
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