País importa 73 mil toneladas
10.05.2012 - 17:20 Por Alexandra Prado Coelho
Os velhos olivais tradicionais têm vindo a ser substituídos pelos
intensivos e pelos superintensivos (Paulo Ricca)
Moura inaugura nesta quinta-feira a XII Feira Nacional de
Olivicultura, tentando atrair novos públicos com debates sobre o
azeite na arte e demonstrações por chefs. A produção não tem parado de
subir na região.
Manuel Fialho tem à sua frente um montinho de folhas cheias de números
e gráficos. "Por nós passa a economia agrícola destes dois concelhos",
diz o gerente da Cooperativa Agrícola Moura e Barrancos, mostrando a
facturação anual: 15,7 milhões de euros, para 4000 cooperadores, 1200
dos quais olivicultores.
Mas os números contam mais histórias. Mostram, por exemplo, que 73%
dos três milhões de toneladas de azeite produzidos por ano no mundo
vêm da União Europeia, e Portugal representa 2% (à frente estão a
Espanha, com 46%; a Itália, com 15%; e a Grécia, com 10%). "Nós, que
temos condições extraordinárias para o olival, temos ainda uma
produção muito pequena", lamenta.
Novo gráfico para completar o raciocínio: Portugal consome anualmente
78 mil toneladas de azeite e exporta 58 mil, ou seja necessita por ano
de 136 mil. E, no entanto, só produz 63 mil, sendo obrigado a importar
73 mil toneladas. "Há um desequilíbrio na balança comercial. Ainda
importamos mais dez mil toneladas do que as que produzimos."
Mas não tem de ser assim, afirma. "Nas décadas de 60 e 70, Portugal
era auto-suficiente no consumo de azeite, e exportador líquido.
Produzia cerca de cem mil toneladas anualmente." O que é que aconteceu
desde então? "Arrancou-se olival por todo o lado. Arrancou-se, por
exemplo, todo o do Ribatejo." E só recentemente "se começou a
despertar para a importância da olivicultura", depois dos "grandes
investimentos que espanhóis e portugueses começaram a fazer no
Alentejo." Por isso, Manuel Fialho tem uma convicção: Portugal pode
produzir muito mais e fazer crescer os 2% que representa actualmente.
Moura, no Alentejo, foi sempre uma zona de olivais, razão pela qual no
final dos anos 1980 começou a organizar a Olivomoura, Feira Nacional
de Olivicultura - cuja XII edição começa hoje (até domingo), com a
presença da ministra da Agricultura.
Santiago Macias, vereador da Câmara de Moura, quis, este ano, dar
outro carácter à feira, tentando recuperar alguma dessa cultura em
torno do olival. Macias não tem folhas com números para mostrar, mas
tem um jardim – um jardim de oliveiras, que a câmara criou e ao qual
vai dar o nome do poeta espanhol Miguel Hernandez. "Dedicámos-lhe o
jardim porque ele foi preso aqui em 1940, e entregue aos franquistas.
É uma forma de reparar o que lhe fizeram."
O vereador espreita pelo portão do jardim, onde, a três dias da
inauguração, alguns funcionários municipais caiam o muro. A ideia da
câmara foi aproveitar o jardim abandonado de um antigo palacete onde
funcionou o Grémio da Lavoura, e plantar ali oliveiras de diferentes
tipos.
Uma delas, logo à entrada, é um autêntico monumento, com um tronco
artisticamente retorcido. O vereador mostra no telemóvel uma
fotografia da árvore quando ainda se encontrava no caminho municipal,
de onde foi retirada para pôr ali. Do outro lado da rua fica o antigo
Lagar de Varas, monumento classificado e que hoje é um pequeno museu.
Santiago Macias percorreu mais de 4000 quilómetros pelo país para
contactar todos os produtores de azeite e convidá-los a estar
presentes na feira. Não foi fácil. Moura fica no interior do país e a
deslocação implica tempo e dinheiro. O vereador tem consciência dos
obstáculos, até porque a feira de olivicultura fica "entalada" entre a
Ovibeja e a grande feira de olivicultura de Jaén, em Espanha - o tal
país que tem 46% da produção mundial de azeite.
É precisamente por isso que Macias decidiu ir buscar alguns trunfos: O
chef Chakall irá fazer no sábado às 12h um showcooking de cozinha com
azeite. Outro chef, António Negrão, vai apresentar no mesmo dia às 16h
os seus bombons à base de azeite e azeitona, e no domingo o CookingLab
faz, às 15h30, uma apresentação sobre cozinha molecular com produtos
inovadores à base de azeite.
Na sexta, há um colóquio sobre azeite com o conservador do Museu
Nacional de Arte Antiga, Joaquim Caetano, a falar do azeite na arte e
na arquitectura; Maria Proença, do Centro de Artes Culinárias do
Mercado de Santa Clara, em Lisboa, a falar da história do azeite; o
crítico gastronómico José Quitério e ainda representantes de uma
agência de publicidade a falar do marketing.Com tudo isto, Macias
espera atrair novos públicos, nomeadamente alunos de cursos de Turismo
- foi também criado um prémio para a melhor tese académica sobre temas
ligados ao olival e ao azeite. O grande objectivo é que "aquilo que
era a especificidade de uma região" não continue a diluir-se como tem
vindo a acontecer. Moura quer continuar a dar cartas no que toca ao
azeite.
Nas últimas décadas, a própria paisagem da região sofreu alterações.
Os velhos olivais tradicionais têm vindo a ser substituídos pelos
intensivos e pelos superintensivos. "Aqui na cooperativa temos
sobretudo o intensivo, e com as variedades regionais", explica Manuel
Fialho. Embora exporte a granel o que não quer embalar, a cooperativa
produz basicamente para o mercado interno e escoa a sua produção
através das grandes superfícies.
Aliás, o gerente não tem nada a apontar aos grandes distribuidores. "O
que nos interessa é ter o maior volume possível por encomenda,
clientes que permitam centralizar as vendas e que nos paguem na hora
certa. Onde é que conseguimos estas três coisas? Nas grandes
superfícies." E defende que o que os produtores portugueses precisam
de fazer é precisamente juntar-se em cooperativas ou outras estruturas
para terem produção com escala suficiente.
Quanto à Cooperativa de Moura e Barrancos (os dois concelhos são
abrangidos pela denominação de origem protegida Azeites de Moura),
garante 8% da produção nacional, mas poderia crescer muito mais se
fossem ultrapassados três problemas: o preço muito baixo a que está o
azeite (os preços são estabelecidos por Espanha, o grande produtor
mundial), o facto de Moura e Barrancos serem "desfavorecidos em
relação ao regadio do Alqueva", e ainda o facto de estarem na Rede
Natura 2000, o que, segundo Fialho, faz com que "alguns dos melhores
solos não possam ser usados".
http://www.publico.pt/Local/portugal-pode-produzir-muito-mais-azeite-o-suficiente-para-nao-importar-1545514?all=1
Sem comentários:
Enviar um comentário