Por Ricardo Paz Barroso, publicado em 3 Maio 2012 - 09:37 |
Actualizado há 27 minutos 42 segundos
Já houve várias tentativas de criar um banco de terras nacional, desde
1975, mas até agora a medida não vingou
"A terra a quem trabalha" é um velho slogan pós-revolucionário que se
mantém actual, já que hoje é discutida na Assembleia da República a
proposta do governo para a criação de uma bolsa de terras. A ideia é
utilizar os terrenos que estejam abandonados e, mediante um contrato
de arrendamento, entregá-los a quem esteja interessado em produzir. Ao
fim de dez anos, o arrendatário poderá comprar o terreno ao Estado
(ver caixa).
A ideia de um banco de terras é uma recorrência no campo das intenções
políticas dos governos. Um dos exemplos mais simbólicos pertence a Sá
Carneiro, que, quando foi primeiro-ministro, dividiu a Herdade dos
Machados, no Alentejo, em 300 parcelas, que foram entregues a cerca de
uma centena de agricultores. Mas o processo foi longo e a entrega de
terrenos demorada, acabando por matar o espírito inicial da ideia.
Quase todos os titulares da pasta da Agricultura mostraram, nem que
fosse informalmente, o desejo de avançar com o banco de terras.
Quem "teve muita pena" de não ter visto o seu banco de terras avançar
foi Capoulas Santos, que foi ministro da Agricultura dos dois governos
de António Guterres (1995-2002). Capoulas Santos ainda conseguiu
aprovar a ideia em Conselho de Ministros, em Setembro de 2001. "Isto é
uma grande ironia", revelou ao i o antigo governante, referindo-se à
actual proposta da ministra Assunção Cristas.
A ironia de que fala Capoulas Santos ao i é nessa altura terem sido
"aprovados três diplomas sobre a matéria". Um referia-se ao banco de
terras nacional propriamente dito, um segundo criava um "fundo de
mobilização de terras" e havia um terceiro em que se dava o "direito
de preferência ao Estado na compra de terrenos só no Alqueva". A
articulação destes três diplomas, segundo o antigo ministro, serviria
para criar um ciclo vicioso, mas "no bom sentido": criava-se o banco
de terras, juntava-se o dinheiro das rendas no fundo e com esse
dinheiro compravam-se terrenos no Alqueva que iriam "abastecer" o
banco de terras, uma vez que o Estado teria direito de preferência.
Para Capoulas Santos, "seria uma forma auto-sustentada de criar um
instrumento destes, rentabilizando os grandes investimentos que
Portugal já fez no Alqueva desde os tempos de Salazar". E até já havia
um levantamento dos terrenos na alçada do Ministério da Agricultura,
estando contabilizados 60 mil hectares "das mais diversas
proveniências, da reforma agrária a doações ao Estado e a terras
abandonadas".
O problema pôs-se com a demissão de António Guterres após a derrota
nas autárquicas de Dezembro de 2001 e com isso o banco de terras de
Capoulas Santos ficou na gaveta. "Penitencio-me pelo facto de o meu
próprio partido [PS] não ter retomado esta ideia quando voltou ao
governo."
CRISTAS NA MIRA Mas o actual diploma proposto por Assunção Cristas
está ser alvo de críticas e desvalorizações. A oposição, nomeadamente
o PS – através de outro antigo ministro da Agricultura, António
Serrano –, já veio dizer que "a ideia nem é má, mas trata-se de um
show-off por parte da ministra". Uma expressão também utilizada pelos
agricultores (ver ao lado). Tudo porque a proposta do governo se
concentra no conceito de "terrenos abandonados", esclarece Serrano.
O actual deputado socialista explicou ao i que "esta proposta devia
estar mais orientada para o conceito de arrendamento provisório, pois
todas as terras têm dono". Tal como está, "o diploma parece muito
apressado", conclui. O grande problema é o facto de se avançar com a
proposta "sem haver um cadastro dos terrenos agro-florestais". "Um
processo que é caro e complexo, mas que traz menos problemas do que
avançar sobre terrenos que têm proprietários, mesmo que não se saiba
do seu paradeiro", contextualizou o antigo ministro.
http://www.ionline.pt/dinheiro/banco-terras-uma-medida-nao-ainda-criou-raizes-portugal
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