quarta-feira, 1 de maio de 2013

Alentejo indomável

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Por Rui Falcão

30.04.2013

O triunfo de uma região vinícola será mensurável? Como avaliar então o
sucesso de uma região, como aferir sobre o seu êxito e a respectiva
consequência nos resultados?

Como medir a validade de uma denominação? Poderemos avaliar uma região
pelo volume de vinhos produzido, pela quantidade produzida e poralguns
números avassaladores? Poderemos avaliar uma região pela quota de
mercado que detém, pelo quinhão que ocupa não só nas prateleiras
desupermercados e nos catálogos das feiras de vinho, mas também no
gostodos consumidores? Poderemos avaliar uma região pela variedade,
pela empatia que cria junto dos consumidores, pela facilidade e
cumplicidade que gera entre o gosto dominante do consumidor médio?

Poderemos avaliar uma região pela qualidade média dos vinhos aí
produzidos, pela consistência e solidez das gamas base e intermédia,
ou deveremos antes analisar o sucesso pela quantidade de rótulos de
prestígio, pelo número de marcas de referência nacionais e
internacionais, pela quantidade de vinhos capazes de criar momentos de
desejo e antecipação? Poderemos avaliar uma região simplesmente pelo
preço médio dos vinhos, pela capacidade de se adaptar à realidade
económica do mercado, pela capacidade de conseguir produzir vinhos de
excelentes relações qualidade/preço?

Poderemos avaliar uma região pela diversidade de estilos, pela
capacidade de surpreender e de abarcar todos os estilos possíveis,
desde os vinhos brancos até aos espumantes passando pelos vinhos
tintos, rosados, fortificados e de colheita tardia ou o sucesso
passará pela simplicidade da oferta? Poderemos avaliar o sucesso de
uma região pela sua capacidade exportadora, pela aptidão em conquistar
mercados internacionais, pela capacidade de comunicação e pela vontade
de se promover de forma regular e consistente?

Todos compreenderão que o verdadeiro sucesso terá de ser medido por
todos estes requisitos, por todas estas variáveis, de forma mais ou
menos intensa para cada condição. E todos sabemos que infelizmente são
poucas, muito poucas, as regiões que conseguem cumprir estes critérios
de forma mais ou menos universal. A denominação que mais se aproxima
do ideal de cumprir todos estes desideratos é o Alentejo, região de
sucesso comprovado, dentro e fora de fronteiras, que há muito se
afirmou como a região de maior sucesso em Portugal.

Um Alentejo muito mais plural no estilo, na diversidade cultural e na
paisagem do que os preconceitos gostam de considerar, um Alentejo
muito mais variado que o admitido por parte do país. Por ser tão
grande, por ocupar quase um terço do território continental, e apesar
dos clichés frequentemente o esquecerem, o Alentejo é a região de
maior diversidade em Portugal, capaz de albergar paisagens,
microclimas e solos díspares e por vezes antagónicos.

O Alentejo tem praias, tem uma linha de costa que beneficia da
influência atlântica directa, uma área que apesar da falta de tradição
no cultivo da vinha ganha cada vez mais adeptos e onde as vinhas
começam a marcar a paisagem. O Alentejo tem regiões de clima
inclemente no sul, sobretudo na margem esquerda do Guadiana embora a
longa e escaldante planície de Beja possa ser igualmente cálida,
regiões onde a vinha necessita de água e de regadio para sobreviver,
região onde com frequência os estilo ganho um cunho mais intenso e
internacional de fruta farta... embora bem medida.

Mas o Alentejo exibe igualmente uma paisagem pontuada por planícies
ondulantes no coração da denominação, no eixo pontuado por Évora,
Borba, Redondo, Reguengos e Vidigueira, regiões de diferentes e
acentuados microclimas e enorme variabilidade de solos, condições que
ajudam a explicar a justeza e razão de ser das sub-regiões oficiais do
Alentejo. E o Alentejo oferece um norte montanhoso, em Portalegre,
região onde pontifica a Serra de São Mamede, serra de encostas
acentuadas e de vinhas em altitude, vinhas centenárias de castas há
muito esquecidas plantadas no inconfundível estilo português que
mistura dezenas de castas na mesma vinha. Muito mais que um Alentejo
existem diversos "Alentejos" que diferem entre si.

Talvez por isso, e sobretudo por o Alentejo ser responsável por
praticamente metade do vinho consumido em Portugal, muitos gostariam
de ter um vinho alentejano no leque de oferta. Apesar de hoje muitos
pretenderem estender as suas operações ao Douro e à região do Vinho
Verde, duas regiões onde muitos produtores consagrados estão a
investir, a verdade é que este movimento interno de expansão começou
precisamente pelo Alentejo, pela terra onde todos queriam estar
presentes.

Empresas vinícolas nacionais tão fortes e reconhecidas como os
gigantes Sogrape, Caves Aliança, José Maria da Fonseca, Bacalhôa ou
Dão Sul, para nomear unicamente uma mão cheia de nomes, decidiram
investir na compra de herdades virgens ou de produtores já
estabelecidos numa tentativa de conquistar um lugar no coração do
Alentejo, de conquistar uma quota importante do Alentejo e,
consequentemente, do mercado nacional e internacional.

Curiosamente, e salvo as devidas e honrosas excepções, os diversos
investimentos de grandes empresas vinícolas no Alentejo não resultaram
da forma esperada e antecipada por essas grandes empresas. A maioria
continua a lutar contra alguma falta de reconhecimento e identidade
das suas marcas, debatendo-se em mais de um caso com uma viticultura
nem sempre bem alinhada com as exigências e particularidades do
Alentejo. Apesar do sucesso inegável do Alentejo têm sido os
produtores locais a capitalizar esse sucesso, deixando pouco espaço e
alegrias para as grandes empresas de fora da região. É caso para dizer
que para além de se mostrar indomável o Alentejo obriga a uma presença
forte e uma atenção contínua dos produtores, a um acompanhamento
ininterrupto a que muitos não se têm dedicado.

Uma região curiosa que exporta produtores para outras regiões de
Portugal mas que raramente se deixa conquistar por quem vem de fora.
Uma região com muito mais personalidade do que por vezes alguns querem
fazer crer...

http://fugas.publico.pt/Vinhos/319261_alentejo-indomavel?pagina=-1

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