quarta-feira, 18 de julho de 2012

Eucaliptar Portugal

Daniel Oliveira (www.expresso.pt)
8:00 Quarta feira, 18 de julho de 2012

Conhecendo-se o impacto ambiental do eucalipto - consumo de água,
maior facilidade de propagação de incêndios e efeitos nas espécies
autóctones - as leis portuguesas exigiam algumas regas para a sua
plantação. E, para impedir o recurso a atividades criminosas que
beneficiavam o infrator, determinava-se que nas zonas atingidas por
incêndios só se poderia replantar árvores da mesma espécie.

Segundo nova legislação que o governo apresenta agora, inédita na
Europa, a arborização até cinco hectares e a rearborização até dez
hectares poderá ser feita com qualquer espécie, sem necessidade de
qualquer autorização. Volta-se à regra do deferimento tácito, um
convite descarado à corrupção sem rasto.


Como o eucalipto é uma espécie com retorno financeiro rápido - mas
enormes prejuízo para económicos e ambientais a longo prazo -, o fim
de qualquer entrave à eucaliptalização do território garantirá que
Portugal, um dos países com mais eucaliptos na Europa (ocupa uma área
superior a 700 mil hectares, o que tem contribuído para as piores
estatísticas de incêndios da Europa), destruirá muito rapidamente toda
a sua floresta. Como nem a pequeníssima área agrícola é protegida pela
nova lei, os melhores solos para a nossa agricultura também serão
afectados. O processo de desruralização do território entrará na sua
derradeira fase. Grande parte do País será um enorme eucaliptal sem
ninguém a viver lá.

A alteração das regras para a rearborização das áreas ardidas é apenas
um prémio ao crime. Diria mesmo que é um convite ao crime.

Não é difícil perceber de onde surgiu esta criminosa ideia. A celulose
tem espaço para crescer e exportar. A crise, quando se é governado por
quem não tem objetivos a longo prazo, favorece uma má utilização dos
recursos. O País precisa de exportar e a indústria aproveitou a
dificuldades da nossa economia e um governo sem rumo para garantir
para si própria uma liberdade absoluta. O seu poder nos sucessivos
ministérios da agricultura é conhecido. Mas faltava encontrar em São
Bento gente suficientemente irresponsável para permitir que a floresta
portuguesa lhe fosse entregue sem freio.

Com esta irresponsabilidade o governo facilitará a desertificação das
zonas rurais, a destruição do que sobra da nossa agricultura e a
propagação crescente de incêndios - quer pela natureza deste tipo de
plantação, quer pelo prémio ao crime. Muitos dos erros que foram
cometidos no passado resultam da cegueira de quem governa a olhar para
o dia seguinte. Este será, no futuro, apenas mais um exemplo.

Não sei se este governo se move, neste caso, por preconceito
ideológico contra os limites ao mercado, por cedência aos mais
poderosos interesses empresariais ou por desespero económico. Sei que,
em todas áreas da nossa economia, há um padrão: o da
irresponsabilidade sem limites. É só mais uma.


http://expresso.sapo.pt/eucaliptar-portugal=f740286

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