Manuel Castro e Brito, da organização da 29ª Ovibeja
A menos de três semanas do início da 29ª OVIBEJA o número de
expositores "aumentou" em relação ao ano passado. As expectativas para
a Feira são, por isso, "as melhores", considera Manuel Castro e Brito,
presidente da Comissão Organizadora da Feira e da ACOS- Agricultores
do Sul, entidade que desde a primeira hora põe de pé a OVIBEJA, que
este ano decorre entre 27 de Abril e 1 de Maio, no Parque de Feiras e
Exposições de Beja.
Para Castro e Brito, apesar da "crise" e da seca que afecta o mundo
rural, é necessário apostar na agricultura e na produção nacional, um
sector que se tem vindo a modernizar e que hoje "não é o mesmo " do
que era quando se realizou a primeira OVIBEJA, sobretudo devido à
"água de Alqueva", e também a modernização e ao conhecimento de todos
os sectores desde a agricultura à pecuária.
Num balaço sobre a actuação da ministra da Agricultura, o presidente
da ACOS, considera que o facto de estar à frente de um superministério
"não tem ajudado" Assunção Cristas.
Está aí à porta mais uma OVIBEJA. Que motivos de atracção tem esta
edição? Mantém as características habituais de uma feira generalista,
apostada em mostrar as vivências do mundo rural?
Alguém disse que a OVIBEJA era todo o Alentejo deste mundo e isso é
uma realidade. Mas a feira tem evoluído e hoje já ultrapassa
largamente as fronteiras do Alentejo. Quem vier à OVIBEJA depara-se
com uma feira de âmbito geral, com uma grande diversidade, embora as
actividades ligadas ao campo, à agricultura e ao interior do país
tenham uma grande expressividade. Há também muitas pessoas que visitam
a OVIBEJA por uma questão de regresso às origens, já que aqui existe
esse contacto com os animais e com as actividades ligadas ao mundo
rural. Mas a OVIBEJA não se esgota nisso: é também um espaço de
inovação e de mostra de produtos cada vez mais elaborados, como o
azeite, o vinho ou mesmo os cereais ou a pecuária. Há toda uma
envolvência que começa no campo e que termina na gastronomia, nos
restaurantes, na animação nocturna, que desde sempre constituem fortes
atractivos para quem visita a feira.
Mas o mundo rural não é algo estanque, petrificado no tempo. De que
forma a OVIBEJA tem acompanhado esta evolução?
A actividade de produção de alimentos e de preservação do ambiente é
uma área que se tem desenvolvido muito, nomeadamente com a Política
Agrícola Comum que tem dado possibilidade a grandes investimentos no
mundo rural. O campo de hoje não é o mesmo de há 29 anos atrás quando
foi a primeira OVIBEJA. Há muita gente nova envolvida no chamado
"agrobusiness" e também há uma enorme quantidade de novas tecnologias
que são aplicadas a este sector. Dito isto é preciso também dizer que
em Portugal, no geral, o campo foi descurado e o nosso país dedicou-se
mais à especulação financeira e a um consumismo global e uniformizado,
em que todas as pessoas vestem de igual, têm os mesmos hábitos e os
mesmos centros de interesse, que deu no que deu, destruindo a nossa
economia e a de outros países do sul da Europa.
A grande "fábrica", a grande indústria do Alentejo, continua a ser a
agricultura?
A agricultura continua a ter um peso importantíssimo na nossa
economia. Produzimos 70% dos produtos agrícolas que consumimos. Quanto
mais produzirmos menos importamos e há produções que exportamos, o que
é um grande contributo para o nosso país, isto apesar do sector da
distribuição continuar a maltratar os produtores. A nosso ver, também
a classe política não preza quem produz e faz um mau serviço não
olhando para a produção nacional.
Parar Alqueva é um erro histórico
A OVIBEJA tem sido, nos últimos anos, um espaço de alerta para a forma
como as grandes cadeias de distribuição nacional "esmagam", ao nível
dos preços e dos prazos de pagamentos, os agricultores. Tem havido
algumas melhorias neste relacionamento entre a produção e a grande
distribuição?
Têm existido alterações mínimas, mas temos que continuar a insistir
neste problema porque existe um monopólio, de facto, ao nível da
distribuição que prejudica muito os produtores. É algo que não faz
sentido porque olhando os lucros brutais de dois ou três
distribuidores –e não existem mais do que isso – se vê que há alguma
coisa a fazer, principalmente em produtos excelentes que temos, como o
azeite e o vinho, que a distribuição utiliza apenas como reclame para
vender outros produtos que nada têm a ver com a nossa agricultura nem
com a nossa produção.
O regadio de Alqueva, apesar de não estar ainda concluído, já está a
mudar o Alentejo, tornando-o mais verde, produtivo e diversificado em
termos de culturas agrícolas?
Sem dúvida. Há uma grande progressão e uma grande inovação e também um
brutal investimento por parte dos agricultores na agricultura de
regadio. Assistimos agora a um recuar deste governo no que diz
respeito ao regadio do Alqueva que nos traz imensas preocupações,
principalmente àqueles que já investiram e que continuam à espera de
água. A conclusão da obra está a atrasar-se e pode pôr mesmo em causa
o futuro do regadio de Alqueva. Penso que este é um erro histórico
deste governo que anuncia "+ produção", mas em países como o nosso não
há mais produção se não houver água.
Ainda falta um grande investimento para concluir o regadio de Alqueva?
A contrapartida nacional representa à volta de 200 milhões de euros o
que é ridículo face às notícias que todos os dias ouvimos de que,
foram e vão ser disponibilizados milhões e milhões para os bancos.
Estamos a investir em dinheiro improdutivo e o investimento produtivo
é deixado para trás com este governo que, aliás, fez campanha
eleitoral baseada na agricultura. Penso que aquilo que estamos a
assistir é a uma deslealdade.
Este ano está a viver-se um ano de seca. Como é que os agricultores
estão a reagir?
A seca deste ano é uma desolação. No sul do país temos um historial de
secas, mas a deste ano assola todo o país, a vizinha Espanha e algumas
regiões do sul de França e, de facto, estamos a gastar todas as
reservas que tínhamos e isso configura um prejuízo enormíssimo para os
agricultores e para a actividade económica de todas estas regiões.
Vamos importar mais alimentos
Portugal importa 30% dos alimentos que consome. Este ano, devido à
seca, ainda vai ser mais.
Será mais, uma vez que vamos diminuir muito a nossa produção e nalguns
sítios poderá mesmo não haver qualquer tipo de produção.
Têm sido avançadas pelo Governo algumas medidas para minorar os
efeitos da seca. Do ponto de vista dos agricultores estas medidas são
suficientes?
Curiosamente não consigo entender quais as medidas que vão haver para
a seca. O que é anunciado é que se irá antecipar algumas ajudas, mas
isso não é uma medida eficaz porque é agora que precisamos de apoios,
uma vez que a banca não financia este sector e as taxas de juro,
quando se conseguem empréstimos, são elevadíssimas. São necessárias
medidas de crédito a longo prazo para este sector.
E de que forma a crise está a afectar a agricultura? Tem a ver,
sobretudo, com a dificuldade de financiamento por parte da banca?
As empresas agrícolas, grandes ou pequenas, têm os mesmos problemas
que as outras empresas, acrescido do problema da meteorologia e isso
nota-se bem, este ano, com a seca. Por isso, também não se compreende
que haja linhas de crédito para as empresas em geral e não haja linhas
de crédito para a agricultura. Essa, também, é outra injustiça que é
feita por este governo.
Voltemos à OVIBEJA. Neste quadro de crise que expectativas existem
este ano para a OVIBEJA. A feira pode ser afectada em número de
expositores ou de visitantes?
Curiosamente temos mais inscrições de expositores do que no ano
passado. Quanto aos visitantes achamos também que a afluência de
pessoas se irá manter. Em chegando a hora estamos convencidos que quem
nos tem visitado continuará a vir "marcar o ponto" à OVIBEJA. Os
preços de bilheteira há vários anos que não são aumentados e este ano
também não o serão. Por outro lado, a OVIBEJA apresenta um programa
diversificado e um cartaz de espectáculos de grande qualidade que vai
agradar a vários públicos pelo simples preço de um bilhete de entrada
na feira.
Este ano, mais uma vez, o azeite e o vinho vão estar em destaque na
OVIBEJA, cujo lema é "+ produção".
São dois grandes produtos do Alentejo, são dois grandes sectores onde
houve dos maiores investimentos de todos os tempos na agricultura e
são também aqueles que têm maiores hipóteses de exportação. Claro que
os outros sectores não estão esquecidos e vamos também tratar de áreas
como a agricultura em extensivo, o ambiente ou a produção de gado, que
foi o início desta feira.
A OVIBEJA "nunca falhou"
A expectativa, portanto, é a de uma OVIBEJA dentro daquilo que tem
sido normal, em termos de expositores e de visitantes?
Sim. Em termos de visitantes, de negócio, de divertimento, de contacto
em termos das pessoas, a OVIBEJA nunca falhou e este ano também não
vai falhar.
A OVIBEJA tem-se transformado também, ao longo dos anos, num
verdadeiro fórum, quer da agricultura, quer do interior e do mundo
rural, seja ao nível de propostas políticas, seja atraindo até ao
Alentejo muitos elementos da classe política. Isto tem sido positivo
quer para a OVIBEJA, quer para a região?
Julgo que esse facto tem sido muito importante por diversas razões. Em
primeiro lugar dá visibilidade à feira. Depois acho que é importante
para a classe política contactarem com uma realidade a que não está
muito habituada, que é o caso do interior e do mundo rural. Isso tem
acontecido e a organização da OVIBEJA agradece essa possibilidade.
Desde Junho passado a agricultura tem um novo responsável. Desta vez
uma ministra que está à frente de um superministério, que vai da
agricultura ao ambiente. Assunção Cristas tem estado à altura do
desafio?
Ao falar-se de um superministério já está o balanço feito. São muitas
pastas e, na minha opinião pessoal, a pasta da Agricultura é complexa
e é muitíssimo importante, principalmente em momentos como este em que
precisamos que haja mais produção nacional para importarmos menos e
haver um maior equilíbrio da balança de pagamentos.
Fonte: GI Ovibeja
http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2012/04/09.htm
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