Entrevista
Filipe Garcia
22/03/12 09:30
A eficiência é a regra essencial para a gestão do sector da água em
Portugal, diz Afonso de Paulo que não vê na sua privatização um efeito
de perda de influência do Estado.
Temos a água mais cara do país. A da torneira", brinca Pedro Afonso de
Paulo momentos antes da entrevista com o Económico, lembrando a
polémica na Assembleia onde se concluiu que era mais barato consumir
água engarrafada. Com um jarro de água da torneira em cima da mesa e
com ar condicionado desligado, como Assunção Cristas ditou à chegada
ao Governo, o responsável pelo meio ambiente em Portugal falou do
sector da água em Portugal, das negociações internacionais e dos
desafios que se prevêem numa altura em que a regra será maior
eficiência e menos investimento em infra-estruturas.
A crise económica relega para segundo plano a preocupação com o meio ambiente?
Não. Obviamente que todos temos dificuldades orçamentais e o
ministério assim como as políticas na área ambiental não são
diferentes nessa matéria. Agora, o potencial que o ambiente tem para
as próprias empresas é algo que não podemos deixar de lado. Uma
empresa ao internalizar determinadas práticas ambientais e de
eficiência de recursos a prazo é uma empresa mais competitiva. Ao
tornar-se mais eficiente no uso da água, da energia, das matérias
primas, na reciclagem, a prazo torna-se numa empresa mais competitiva.
Francisco Ferreira, da Quercus, disse recentemente que em termos de
políticas ambientais se tinha passado do 80 para o oito . O que tem
este Governo para mostrar em medidas ambientais?
Já desafiei o Francisco Ferreira e outras pessoas que o disseram, que
nos digam uma ou outra política estruturante que viesse do passado e
que tivéssemos abandonado. Em termos de políticas estruturais
começámos a rever a lei de bases do ambiente ao mesmo tempo que
começámos a ver a lei de bases do ordenamento e dos solos, que
quisemos fazer ao mesmo tempo por terem pontos de contacto. Com a nova
agência portuguesa do ambiente pensamos que, a breve trecho, poderemos
ter um licenciamento ambiental único e uma única plataforma com regime
simplificado, mais célere e sem perder eficácia ambiental. Quanto à
água, também teremos os planos de bacia hidrográfica que estamos a
terminar e onde estávamos muito atrasados. Começámos em 2007, deviam
estar prontos em 2009 e só agora os vamos terminar, quase com risco de
incumprimento comunitário. Entre o final de Março e o início de Abril
também apresentaremos o plano nacional do uso eficiente da água, muito
importante ainda para mais num ano de seca.
A 29 de Fevereiro barragens no Rio Tejo em Espanha estavam a 51,6% da
capacidade. Portugal não deveria negociar um aumento no volume de água
libertada?
Temos um convénio com Espanha através da convenção de Albufeira em que
fazemos essas articulações, em que são determinados os caudais
ecológicos e com que gerimos situações de riscos e como é o caso da
seca. Na maioria das nossas albufeiras estamos um pouco abaixo da
média de outros anos. Para o futuro, o que importa é que tenhamos cada
vez mais um uso eficiente. Hoje ainda regamos jardins com água
potável, o que é um contrassenso. Com as alterações climáticas, temos
de esperar estes fenómenos de uma forma cada vez mais regular e com
maior incidência de gravidade. Penso que este ano, mesmo a persistirem
estas condições climatéricas, não vamos ter problemas de abastecimento
público, mas persistindo mais um ano teremos de avaliar. Nesta altura,
a seca é especialmente grave nas zonas agrícolas e nas barragens para
fins agrícolas.
A solução passará pela construção de mais barragens?
Diria que antes de precisarmos de mais barragens, precisamos de ser
eficientes no que temos e de nos focar no uso eficiente da água. Temos
de pensar que a água é um desafio do século XXI. No World Economic
Outlook, do Fórum Mundial, é referido que além dos desafios
geo-políticos e financeiros, é justamente uma relação entre alguns
temas ambientais - a ligação entre água e energia, entre a água e a
agricultura e entre a água e a escassez de recursos.
O recente fórum mundial da água em Istambul identificou um problema de
escassez de água na Europa. O que Portugal tem dimensão para
influenciar as políticas europeias?
Portugal tem participado activamente na definição de muitas políticas
ambientais. Em Instambull fomos convidados para vários grupos
liderantes na área da água e isso mostra o reconhecimento que em
muitas matérias Portugal tem cartas a dar e um excelente conhecimento.
Por exemplo, a convenção de Albufeira e a gestão conjunta em muitas
matérias das bacias hidrográficas entre Portugal e Espanha é
considerada na União Europeia é um modelo de estudo e um exemplo de
boas práticas.
Economista ecológico
Licenciado em Economia, foi adjunto de Isaltino Morais no ministério
do Ambiente e do Ordenamento do Território em que Miguel Relvas era
secretário de estado e onde participou num estudo para a reorganização
das Águas de Portugal. Em 2009, concorreu a Oeiras na lista do PSD e
assumiu a vice-presidência da distrital de Lisboa dos
sociais-democratas.
http://economico.sapo.pt/noticias/a-agua-e-um-dos-grandes-desafios-do-seculo_140857.html
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