terça-feira, 20 de março de 2012

Há seca em Angola?

19 Março 2012 | 23:30
Alexandra Machado - amachado@negocios.pt
Decorre por estes dias o Conselho Europeu da Agricultura em Bruxelas,
onde estão reunidos todos os ministros dessa pasta. Todos? Não. Há uma
ministra que teve outras prioridades. Assunção Cristas está, por estes
dias, em Angola.
A situação tem toda a relevância política e não só. O Conselho Europeu
da Agricultura vai discutir a seca. Foi a própria Assunção Cristas que
falou da importância desta reunião para se conseguir desbloquear
apoios para os agricultores. Nem está em causa a competência do seu
substituto que conhece bem os meandros de Bruxelas. Mas é o sinal. E
enquanto, em Portugal, os agricultores e criadores de gado agudizam
porque não têm mecanismos de defesa, Assunção Cristas aproveita para,
em Angola, piscar, também ela, o olho ao investimento angolano. E que
efeitos práticos conseguirá com esta visita? Assunção Cristas vai a
Angola a convite da ministra do Ambiente angolana, que não tem pastas
relevantes para os interesses nacionais. Por exemplo a tutela das
águas, onde os projectos interessam a empresas portuguesas, está no
ministro das Águas e Energia, com quem, ainda assim, Cristas se
encontrará. Mas, dir-se-ia que a ministra da Agricultura, Mar,
Ambiente e Ordenamento do Território preferiu "vender" Portugal do que
tentar um acordo que ajude um sector que tem sido, nos últimos tempos,
olhado como a salvação do País, dependente das importações para a sua
alimentação.

Portugal até pode unir forças com os espanhóis, neste Conselho da
Agricultura. Toda a Península Ibérica está em ano de seca e Espanha
sabe defender os seus interesses. Mas fá-lo-á, se necessário for, à
custa dos interesses de outros países. Neste caso, há pedidos que se
forem aprovados podem beneficiar ambos os Estados. Ficaremos à espera
dos resultados.
Mas já não se pode esperar muito. Quem está no terreno tem todos os
dias de se "safar". E nem é uma questão de subsídios. Há quem só
desejasse que houvesse seguros que cobrissem os prejuízos com a seca.
Ou quem quisesse "apenas" poder ir ao banco e conseguir uma linha de
crédito. Mas também para estes profissionais, a banca, tal como as
terras, secou. E voltamos ao problema que tem apanhado uma franja
grande da economia nacional, de quem se espera o milagre de fazerem
diminuir as importações ou mesmo subir as exportações. Falta de
crédito. Ela existe.
Por muito que os bancos não o assumam. Pergunte-se aos agricultores ou
aos criadores de gado o que ouvem quando vão aos bancos. E são muitos
deles que têm de dizer sim, sem reclamar, a prazos de pagamento de 120
dias e de preços estabelecidos por quem lhes compra os produtos.
Chegamos a outro problema: a relação comercial entre os produtores e
distribuidores, em que estes últimos têm a faca e o queijo na mão. Mas
este é tema para outra ocasião.
Havendo quem se acomoda aos apoios públicos, não é, no entanto, um
caso generalizado. E, nesta fase, há quem precise de ajuda. A
agricultura é dos sectores mais arriscados. Depende de um factor que
ninguém controla: a natureza. Mas há quem arrisque. Muito. E são esses
que gostariam de ver Assunção Cristas não em Angola mas em Bruxelas.

* Redactora principal
Visto por dentro é um espaço de opinião de jornalistas do Negócios
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