14.06.2012
Marta Spínola Aguiar
Depois de ter sido recuperado, o Jardim Botânico de Lisboa está pronto
a receber os visitantes. São plantas e árvores de todo o mundo,
refugiados numa "bolha" na movimentada cidade.
Quem chega à Rua da Escola Politécnica, entre o Rato e o Príncipe
Real, sabe que está prestes a encontrar um sítio que foge aos padrões
da movimentada cidade de Lisboa. "Cria-se uma espécie de uma bolha
neste jardim", diz Ireneia Melo, investigadora principal do Jardim
Botânico de Lisboa. E essa bolha surge não só pela descida de
temperatura que se faz sentir, mas também pelo ar idílico que se
impõe.
A investigadora tem uma paixão por esta "mancha verde lisboeta". Desde
1964 que o Jardim Botânico é a sua casa. Entrou para lá nos tempos de
estudante e viu a sua carreira crescer naquele espaço. "Fui tarefeira,
auxiliar de naturalista, naturalista, investigadora auxiliar e
investigadora principal". Recorda-se de todos os dias que o jardim
viveu e sabe de cor os seus altos e baixos. "É preciso muita dedicação
e quase um milagre para o manter", comenta.
O jardim acolhe plantas e árvores de todo o mundo. Ao longo dos quatro
hectares é possível encontrar um pouco dos cinco continentes. "Para
mim há aqui uma colecção extraordinária", refere Ireneia Melo. "As
pessoas vêm aqui para ver alguma coisa de exótico. Vêm ver como as
plantas de adaptam aos vários ecossistemas. E depois vêm ouvir o
silêncio", salienta.
E é essa calma que acaba por atrair os visitantes. Por ano, este
espaço acolhe cerca de 75 mil pessoas. "Somos sobretudo visitados por
grupos de crianças, alunos de Belas Artes e turistas. Os portugueses
não visitam tanto, mas são os que mais criticam", comenta a
investigadora, referindo-se às polémicas sobre a recuperação deste
espaço verde.
Durante os últimos anos, o Jardim Botânico tem sido alvo de críticas.
A falta de financiamento reflectia-se na pouca manutenção e também na
vigilância. O espaço estava "cada vez mais degradado", pondo em causa
a sua própria identidade. Mas desta vez, segundo Ireneia Melo, as
mudanças foram poucas. "As coisas estão conservadas e mais limpas. Os
arruamentos principais foram nivelados, colocou-se areão, taparam-se
buracos, pintaram-se os bancos e arranjaram-se as pontes. Agora até há
a possibilidade de ouvir a água a correr, o que não que não acontecia
há mais de dez anos", devido à impermeabilização do lago principal.
Jacinto Leite, responsável pelas obras, afirma que "a base de saibro
[areia argilosa] estava destruída e só se encontravam pedras". Foi
necessária uma limpeza e a recuperação do aspecto original com
material da mesma base, mas enriquecido com argamassas [mistura feita
com areia, água, cimento, cal ou gesso]. "Não fizemos uma mudança
significativa", acrescenta. "Reabilitámos os regatos com alguns
materiais mais recentes e que lhes deram um suporte melhor para que a
pressão da água não perfurasse".
De forma a monitorizar a humidade do solo, Catarina Silva e Albino
Medeiros, ambos professores na Faculdade de Ciências da Universidade
de Lisboa, desenvolveram, há cerca de um ano, um estudo
hidrogeológico. Este estudo levou à instalação de vários piezómetros
que permitem medir a quantidade de água do terreno.
Concluídas as obras, o espaço da Escola Politécnica apresenta-se da
cara renovada, mas continua a ser o que sempre foi, um jardim
botânico. "As pessoas têm que pensar que um jardim botânico não é um
jardim de um hotel, onde só tem que ter flores bonitas, onde não pode
haver uma ervinha fora do canteiro… No jardim botânico tem que haver
tudo", reforça Ireneia Melo.
Fundado em 1878, o Jardim Botânico de Lisboa foi construído com um
programa de ensino universitário de botânica e para investigação. Mas,
para Ireneia Melo, "este jardim tem que ser visto como um museu e não
apenas como um espaço de lazer, porque ele é muito frágil. As pessoas
têm que respeitar este espaço como um espaço próprio, de silêncio".
Afinal, "tudo fica na memória das plantas", declara.
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