sexta-feira, 7 de julho de 2017

Empresário oferece-se para plantar 30 mil árvores em Pedrógão Grande



Foto: Rui Oliveira/Global Imagens


Um empresário de Castelo Branco ligado à silvicultura disponibilizou-se para oferecer árvores e efetuar a respetiva plantação em Pedrógão Grande, a título gratuito, com o objetivo de atingir as 30 mil árvores.

"O objetivo passa pela integração de 20 a 30 mil árvores folhosas sem custos e plantadas no terreno", disse hoje à agência Lusa, José Gameiro, ainda a propósito do incêndio que começou naquele concelho e que provocou a morte a 64 pessoas, além de mais de 200 feridos.

O empresário da Silvapor já encetou contactos com empresas francesas ligadas ao setor, que demonstraram "vontade de fazer algo" pela região de Pedrógão Grande, sobretudo ao nível da reflorestação do concelho.

"Há a possibilidade de ter árvores de floresta para plantar, sendo que serão oferecidas e plantadas", explicou.

O empresário aproveitou hoje a presença em Pedrógão Grande para iniciar contactos formais com o município local, através do vice-presidente José Antunes Graça, a quem transmitiu a ideia, sendo que irá, brevemente, fazer o mesmo com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC).

O desafio está lançado, sendo que agora é preciso concertar com as entidades responsáveis o trabalho de planeamento.

Comando único? Ministros da Agricultura e Administração Interna em desacordo


Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Capoulas Santos 

Capoulas Santos diz que governo quer "atacar vícios de gestão e ordenamento" florestais e admite "comando único". Constança Urbano de Sousa já tinha recusado a ideia

O Governo do PS pretende, com a denominada "Reforma da Floresta", tomar medidas para "atacar os vícios da gestão e ordenamento" e admite a constituição de um "comando único de prevenção e combate" a fogos, segundo o ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Florestas.

A posição manifestada por Luís Capoulas Santos esta quarta-feira, em resposta a desafios de vários deputados de diferentes partidos, é contrária à expressa no mês passado pela Ministra da Administração Interna.

Em resposta ao Público, Constança Urbano de Sousa rejeitou a recomendação do parlamento para que seja criado um comando único.


"A opção política é a manutenção dos três pilares do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios em termos de coordenação", disse a ministra, no final de junho.

Os três pilares são "a prevenção estrutural", pelo Instituto da Conservação da natureza e das Florestas, "a prevenção operacional", feita pela GNR, e "o combate", por parte da Autoridade Nacional de Proteção Civil.

Ao ser ouvido no Grupo de Trabalho Sobre a Reforma da Floresta (GTSRF) da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar, Capoulas Santos disse que "todos gostaríamos de uma outra estrutura dedicada à floresta".

O ministro pediu que eventuais propostas de outras forças partidárias fossem "quantificadas", de forma a poder ser analisado o seu cabimento orçamental e os meios humanos e materiais necessários.

Capoulas Santos destacou as iniciativas previstas já para este ano de "aumentar em 50 os vigilantes da natureza", assim como "20 equipas de sapadores florestais" e definiu como objetivo do executivo socialista "atacar dois vícios fundamentais: a gestão e o ordenamento" florestais.

"Este pacote legislativo foi elaborado por um grupo de oito ministros, dada a horizontalidade das questões e apenas dois são da responsabilidade do Ministério da Agricultura" (regime de arborização e banco e fundo de monitorização de terras)", ressalvou.

Pela oposição, além da sugestão de uma entidade única de conservação da floresta e de proteção contra fogos, o social-democrata Luís Pedro Pimentel e a democrata-cristã Patrícia Fonseca acusaram Governo, PS, BE e PCP de quererem "discutir e legislar à pressa" e de terem um "pacto antieucalipto", numa atitude de "diabolização" daquela espécie florestal.

"Quem anda à pressa, por dever e missão, é o INEM e não o Governo. Houve oportunidade de discutir o que importa. Há uma necessidade imperiosa de a floresta ter um choque de gestão", defendeu o socialista Francisco Rocha, também admitindo a hipótese de "compatibilizar" as várias entidades envolvidas na matéria.

O deputado bloquista Carlos Matias questionou a possibilidade de encerrar este processo [legislativo] até 19 de julho, coincidindo com o fim da sessão legislativa, enquanto o comunista João Ramos defendeu que a Assembleia da República "deve legislar bem e com eficácia e a pressa não pode interromper a qualidade legislativa".

"A floresta portuguesa arde tanto porque protegê-la não é o objetivo do Estado, há muitos anos. Quando for prioridade, deixa de arder", afirmou o deputado único do PAN, que também questionou o ministro sobre uma futura "unidade única", que "trabalhe todo o ano" e culpou "todos os últimos governos", os quais preferiram "o desenvolvimento de indústrias altamente impactantes e poluentes como as celuloses".

Capoulas Santos disse que "a pressa e o calendário do Governo foi o que foi decidido" e "o calendário do parlamento é da responsabilidade do parlamento". "Há muita legislação que não é possível ser fiscalizada totalmente. Todos adoraríamos um país em que todas as leis fossem cumpridas, com as prisões vazias, sem a necessidade de ter um sistema judicial", declarou.

Segundo o relatório provisório Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), hoje divulgado, os incêndios florestais consumiram 61.624 hectares nos primeiros seis meses do ano e 2017 foi considerado o ano com maior área ardida desde 2007 e o quinto ano com mais ocorrências desde essa data, comparando com os períodos homólogos.

O ICNF aponta Leiria como o distrito mais afetado no que diz respeito à área ardida, com 25.100 hectares, cerca de 41% da área total, seguido de Coimbra, com 18.408 hectares (30% no total).

O incêndio que provocou maior área ardida no distrito de Leiria foi o registado em Pedrógão Grande, que consumiu 20.072 hectares de espaços florestais (80% do total ardido no distrito) e causou 64 mortos e mais de duzentos feridos.

"Ébola das oliveiras" chega a Espanha e deixa autoridades alarmadas

Bactéria propaga-se rapidamente e destrói culturas inteiras

As autoridades espanholas estão preocupadas com a rápida propagação de uma bactéria que mata oliveiras e outras árvores de fruto. A bactéria xylella fastidiosa foi detetada no sul da Itália em 2013 e em quatro anos arruinou culturas inteiras, ganhando a alcunha de "ébola das oliveiras". Os agricultores italianos dizem não saber o que fazer.

Em outubro do ano passado a bactéria chegou à ilha espanhola de Maiorca. Desde então, e embora as autoridades espanholas tenham dito várias vezes que a situação estava controlada e que as árvores infetadas estavam isoladas, a bactéria já foi detetada em várias cidades e ilhas espanholas.

A xylella fastidiosa ataca com grande virulência o café e as árvores como a oliveira, a amendoeira, a videira, a ameixoeira, o pessegueiro, a laranjeira e o limoeiro, segundo o El Confidencial. Quando infeta uma árvore, a bactéria impede a circulação da seiva. As folhas murcham, os galhos secam e a planta acaba por morrer asfixiada.

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Até ao momento não há remédio para a praga que tem provocado prejuízos económicos na ordem dos milhões de euros. Há cerca de 300 espécies de árvores em perigo, e consequentemente, milhares de empregos.

Há até 360 vetores ou agentes de transmissão desta bactéria e a maioria são insetos, como os mosquitos. O protocolo exige que, caso a bactéria seja detetada numa área, toda a vida vegetal num diâmetro de 100 metros deve ser destruída.

Segundo o ministério da Agricultura espanhol, o país vizinho tem cerca de 2,5 milhões de hectares de oliveiras e este setor fatura cerca de 1800 milhões de euros por ano. Espanha tem ainda 150 mil hectares de amendoeiras que rendem cerca de 60 milhões de euros e culturas de citrinos que faturaram em 2015 1982 milhões de euros.

A bactéria está na Península, mas por agora está isolada

Só no município de Guadalest, província de Alicante, foram erradicados 7,5 hectares de vegetação, segundo o secretário-geral da União de Agricultores e Fazendeiros da Comunidade Valenciana, Ramón Mampel.

"É muito preocupante mas não podemos ser alarmistas", disse Juan Luis Ávila, secretário-geral da Coordenador das Organizações de Agricultores e Pecuaristas no município de Xaém, na Andaluzia. "Não podemos pensar que a oliveira vai desaparecer amanhã da Andaluzia".

60% das culturas de azeitona localizam-se em Andaluzia.

Se se confirmar esta realidade, teremos que focar-nos em conviver com ela porque não há solução

"O primordial é evitar que a bactéria chegue às oliveiras, mas se se confirmar esta realidade, teremos que focar-nos em conviver com ela porque não há solução. Aprender a controlá-la como fazem na Califórnia há um século", continuou Luis Ávila.

"Não quero nem pensar no dia em que se detete uma azeitona infetada e digam ao agricultor que tem de arrancar três hectares [de árvores] ao redor", lamentou o coordenador.

domingo, 2 de julho de 2017

Há indícios fortes de que um downburst tornou o incêndio avassalador

Relatório do Instituto Português do Mar e da Atmosfera mostra imagens de radar da nuvem de fumo do incêndio de Pedrógão Grande a avançar até à estrada onde morreram 47 pessoas. Imagens revelam também como o incêndio foi intensificado em dois momentos, vistos como provas de um downburst perto.
 Teresa Firmino

TERESA FIRMINO 2 de Julho de 2017, 7:00 Partilhar notícia


Na tarde de 17 de Junho, o dia do incêndio de Pedrógão Grande, o centro de Portugal foi sucessivamente atingido por vários fenómenos de downbursts — uma corrente de ar gerada por nuvens que chega até ao chão, onde em seguida se espalha em todas as direcções e provoca ventos fortes. O downburst não é um fenómeno raro, tal como os incêndios no país, como constatamos sempre que chega a estação quente. O que foi tão extraordinário naquela tarde foi a conjugação entre um downburst e um incêndio.

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Há provas de que um dos downbursts atingiu o incêndio que já tinha começado no concelho de Pedrógão Grande, uma coincidência nunca antes registada no país. Por causa dessa corrente de ar descendente extremamente forte, o incêndio foi oxigenado e empurrado pelo vento. Espalhou-se a grande velocidade — quase triplicando de dimensão — e chegou à estrada nacional onde morreram 47 das 64 pessoas que perderam a vida nesta tragédia.


Esta é uma das conclusões do relatório do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) sobre as condições meteorológicas que terão influenciado o incêndio de Pedrógão Grande, entregue na última sexta-feira ao primeiro-ministro. Dois dias depois do início do incêndio, António Costa perguntou ao IPMA se houve condições meteorológicas que tivessem favorecido a propagação do fogo (também fez perguntas à GNR e à Autoridade Nacional de Protecção Civil, ou ANPC). Pouco depois, o presidente do IPMA, Miguel Miranda, respondeu-lhe numa carta, dizendo que as previsões meteorológicas bateram certo, dentro das margens de erro expectáveis, com os valores de temperatura e humidade que foram depois registados (33,3 graus Celsius e uma humidade de 20%). E que os avisos emitidos estavam de acordo com as regras fixadas entre o IPMA e a ANPC, incluindo risco de incêndio florestal "muito elevado" para a zona de Pedrógão Grande.

Já nessa carta se levantava a possibilidade — então só uma hipótese — de que um downburst teria acelerado a propagação do incêndio e que teria tido um papel importante na tragédia na EN 236-1, que não foi cortada ao trânsito. O IPMA avançou depois para um relatório técnico e científico pormenorizado, e é essa tese que agora ganha força. "O relatório é um trabalho exaustivo: a análise de todos os dados do IPMA permite ter uma primeira resposta a algumas das questões levantadas por toda a gente, que têm a ver com o desencadeamento do fogo de Pedrógão Grande e as condições meteorológicas que condicionaram a sua evolução", refere Miguel Miranda, acrescentando que o relatório tem elementos para todas as equipas que queiram fazer uma reanálise.

Imagens impressionantes
Há um conjunto de imagens dramáticas neste relatório. Foram obtidas pelo radar meteorológico de Coruche a 17 de Junho, a partir das 19h20. Estão reproduzidas por ordem cronológica na galeria que abre este artigo. Temos de olhar para elas como um corte vertical entre vários quilómetros de altura até cerca de mil metros. E o que vemos é a nuvem de fumo e materiais (uma pluma) lançados para a atmosfera pelo incêndio. A pluma que o incêndio está a criar num determinado momento está assinalada por uma seta vermelha, que aponta para uma área a verde mais claro. Vemos ainda que Vila Facaia (VF) e a EN 236-1 (EN) estão identificadas.

O que a sequência de imagens de radar conta é o seguinte: às 19h20, a pluma que está a ser gerada pelo incêndio encontra-se muito antes de Vila Facaia e da EN 236-1, entre Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pêra. Mas às 20h10 está a chegar perto da estrada nacional e às 20h20/20h30 está a passar por ela. Às 20h50, começa a deixá-la. E às 21h fica já para trás a estrada onde morreram 47 pessoas cujos carros ficaram aí aprisionados pelo fogo ou que fugiram de povoações próximas.

PÚBLICO -Foto
A estrada nacional 236-1, fotografada no dia a seguir ao início do incêndio ADRIANO MIRANDA
Além de trazer outras provas para as horas a que esta tragédia chegou à estrada nacional, esta sequência de imagens revela ainda que o incêndio teve duas amplificações. Ou seja, alguma coisa o intensificou. Até às 19h20, a pluma do incêndio — que tinha começado às 14h43 perto da aldeia de Escalos Fundeiros, no concelho de Pedrógão Grande, e que a meio da tarde já ardia com intensidade — andou entre os níveis baixos da atmosfera e os cinco quilómetros de altitude. Foi por volta das 19h20/19h30 que começou a sua primeira amplificação, que atingiu o auge pelas 19h50/20h. A esta última hora, vemos que o "verde" da pluma alcançou uma grande extensão vertical — 13 quilómetros. Como se viu antes nas imagens, foi sensivelmente a essa hora (20h10) que o incêndio estava a chegar à estrada nacional. A segunda amplificação teve o seu máximo às 20h40, chegando aos 14 quilómetros de altitude.

Portanto, houve uma grande intensificação das chamas entre as 19h20 e as 20h40. Nesse período de menos de uma hora e meia, os materiais lançados pelo incêndio atingiram maiores altitudes na atmosfera, o que significa que o incêndio ganhou muita força. A sua pluma passou dos cinco quilómetros de altitude para os 14, quase triplicando assim a sua dimensão.

PÚBLICO - Aumentar
O IPMA considera que o que terá estado na origem desta amplificação terá sido um downburst, fenómeno que pode ser confundido com um tornado. Mas enquanto os ventos de um tornado giram à volta de um ponto central, movendo-se para cima e para baixo, num downburst a corrente de ar move-se em direcção à superfície terrestre e, quando a atinge ou chega a algumas centenas de metros acima da superfície, dispara em todas as direcções (de forma radial) a partir desse ponto. A essas rajadas muito fortes que seguem em todas as direcções chama-se "escoamento horizontal divergente", ou "outflow convectivo". Geralmente, os downbursts e os seus outflows convectivos têm origem em nuvens cúmulo-nimbos, aquelas nuvens de grande desenvolvimento vertical que anunciam chuva ou trovoada.

Na tarde de 17 de Junho, o radar de Coruche observou vários downbursts que atingiram o Alto Alentejo e a região Centro do país e que, na generalidade dos casos, tiveram apenas consequências locais. Nas imagens de radar há pelo menos a assinatura de três downbursts, visíveis através dos tais escoamentos horizontais divergentes. Quando o ar que vem de cima se encontra com o ar que está mais abaixo, essa convergência produz as chamadas "frentes de rajada", que são mais ou menos concêntricas — tal como as ondas concêntricas originadas por uma pedra atirada para um lago.

Na zona do incêndio de Pedrógão Grande, os dados de radar sugerem que também ocorreu aí um downburst — uma ou talvez até duas vezes. As provas para estes dois casos são distintas. Por cima da freguesia de Cardigos (no norte do concelho de Mação, relativamente perto de Pedrógão Grande), nas imagens de radar a assinatura das frentes de rajada não é identificável. Ainda assim, os dados de radar permitem concluir que se gerou sobre a zona de Cardigos um downburst por volta 19h06. E pelas 19h26 de 17 de Junho, refere o relatório, "observou-se uma nova assinatura deste mais recente downburst, associado à perturbação convectiva-mãe [a nuvem cúmulo-nimbo que o originou], que se propagava para Oeste".

Afinal, como começou o incêndio?
Afinal, como começou o incêndio?
Este quarto downburst era de grandes dimensões: "Este fenómeno deve ser classificado como um macroburst, em virtude de se tratar de um downburst que afecta uma área envolvente a uma escala superior a quatro quilómetros, relativamente ao ponto de geração", explica o relatório.

Às 19h36, diz ainda o relatório, o radar estimou a velocidade do vento do escoamento divergente criado por este grande downburst: um pouco a sul de Cardigos, a cerca de 350 metros acima do solo, o vento atingiu 117 quilómetros por hora, o valor mais elevado. Não é descartada a possibilidade de nos níveis inferiores da atmosfera o vento ter atingido velocidades ainda superiores (devido à dinâmica própria de um downburst e à interacção do seu escoamento horizontal divergente quer com a orografia da região, quer com a dinâmica do incêndio numa área próxima).

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Ora, o downburst de Cardigos surge identificado (por volta das 19h06) um pouco antes da primeira intensificação do incêndio (por volta das 19h20). Cardigos e Pedrógão Grande estão relativamente próximos, embora ainda fiquem em linha recta a cerca de 35 quilómetros de distância. Mas ou foi o resultado do downburst de Cardigos — o seu escoamento horizontal divergente — que chegou ao incêndio de Pedrógão Grande e o amplificou; ou, então, houve um outro downburst perto do incêndio que o intensificou — mas que não foi identificado por radar.

O certo é que os efeitos deste último downburst ou do de Cardigos são visíveis na pluma do incêndio, essa sim bem identificada nas imagens do radar. As provas são indirectas, mas a intensificação do incêndio é considerada como um indício forte de que este fenómeno atingiu o incêndio. "A interacção entre a célula convectiva [a nuvem cúmulo-nimbo] e o fogo levou a uma amplificação da propagação da pluma do fogo, com efeitos grandes de dimensão", resume Miguel Miranda.

Essa amplificação, lê-se por sua vez na síntese do relatório, deve ser "o resultado de escoamento horizontal divergente que se propagou sobre a região do incêndio de Pedrógão Grande", acrescentando-se: "Podemos concluir que a interacção entre o escoamento divergente gerado pelas células convectivas e o incêndio iniciado conduziu a uma grande amplificação da pluma, em termos de extensão vertical e velocidade de propagação, não susceptível de previsão por modelos numéricos de previsão do tempo, e criando condições excepcionais de propagação no terreno."

Governo espera concluir em Julho negociações para exportação de carne de suíno para a China

"O potencial do mercado chinês é tal que poderia absorver toda a produção nacional", disse o presidente da Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores.

LUSA 22 de Junho de 2017, 21:36 Partilhar notícia


O secretário de Estado da Agricultura disse esta quinta-feira, no Cartaxo, esperar que o processo negocial com a China para a abertura do "fluxo de exportações" para aquele país possa ficar "fechado" no início de Julho.

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Luís Vieira, que anunciou a vinda a Portugal de uma delegação de "alto nível da China" no início de Julho, falava na abertura do oitavo Congresso Nacional de Suinicultura, que a Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores (FPAS) promove quinta e sexta-feira no Cartaxo, com o lançamento da nova marca de certificação porco.pt em destaque.

A declaração aconteceu depois de o presidente da FPAS, Vítor Menino, ter afirmado que, apesar do anúncio da abertura do mercado chinês, o facto é que ainda ninguém conseguiu exportar para esse país.

"A abertura iminente deste mercado representa um novo fôlego para a suinicultura nacional", afirmou, pedindo que se concretize "a breve trecho", dada "a natureza estratégica deste mercado para o sector".

Sublinhando que este é um objectivo perseguido "há mais de duas décadas", Vítor Menino afirmou que "as estimativas de importações chinesas de carne de porco" apontam para as 2,3 mil toneladas em 2017.

"O potencial do mercado chinês é tal que poderia absorver toda a produção nacional", disse, ressalvando, contudo, que, sendo este mercado "extremamente relevante", não é o único, havendo "muito por fazer na exportação de carne de porco para outros mercados asiáticos e da América Latina", alternativas que darão "maior poder negocial" ao sector.

O presidente da FPAS declarou ainda que a exportação "é também um caminho cada vez menos estranho aos produtores de raças autóctones", que contribuem para a "manutenção e promoção deste património genético", num "verdadeiro serviço público prestado ao país", realçando os "produtos de excelência produzidos a partir do porco alentejano, do bísaro e do malhado de Alcobaça".

O secretário de Estado da Agricultura e Alimentação reafirmou que as exportações e a internacionalização são "estratégicas" para o Governo, sublinhando que os processos negociais são "complexos e morosos", pois exigem uma actuação de "continuidade, a nível técnico, político e diplomático".

Elogiando o "bom trabalho" do anterior Governo nesta matéria, Luís Vieira afirmou que, em 2016, foram abertos os mercados do Chile, Colômbia, Marrocos e Panamá para a carne fresca congelada e para produtos à base de carne de suíno, estando actualmente em curso negociações para a abertura dos mercados da China, da Coreia do Sul, da Costa Rica, da Índia, do México, do Vietname e do Peru.

Além das negociações com a República Popular da China, continua o diálogo com a Federação Russa para que, "assim que termine o embargo, se retomem as exportações nacionais" para aquele país, acrescentou.

Luís Vieira afirmou que um dos temas em debate no congresso, as doenças que afectam os suínos, é um dos factores que afecta a conclusão dos processos negociais.

"Se Portugal não conseguir aprovar na União Europeia um programa de erradicação e não melhorar a sua situação sanitária face à doença de Aujeszky, as consequências serão significativas para toda fileira suinícola", disse, acrescentando que o Governo criou uma comissão de acompanhamento para a monitorização do plano nacional de controlo da doença.

Mais de 400 profissionais do sector, entre produtores suinícolas, profissionais de saúde veterinária, farmacêuticos, representantes dos industriais de alimentos compostos para animais, bem como responsáveis oficiais das entidades regulamentares do sector, participam no congresso, que se propõe "debater os temas mais pertinentes da suinicultura nacional".

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Entre os temas em destaque encontram-se a discussão das "estratégias de desenvolvimento e internacionalização, promoção de raças autóctones, melhoria das práticas de produção e a criação de metodologias de diferenciação da carne de porco pela qualidade".

Na sexta-feira, após o lançamento oficial da identidade gráfica da chancela porco.pt, "que atesta a qualidade desta carne integralmente produzida em Portugal", acontece "um momento de degustação deste novo produto nacional" na Praça 15 de Dezembro, no Cartaxo.

A FPAS sublinha que o sector suinícola contribui com cerca de 560 milhões de euros para o Produto Interno Bruto nacional e emprega, "directa e indirectamente, vários milhares de famílias".

O vinho que bebe é natural? Sim, já começou a Wine Summit


7/6/2017, 19:54
No primeiro dia de palestras da Web Summit dos vinhos falou-se de "vinho natural". O tema controverso desperta opiniões contrárias e uma postura quase evangelista. O vinho natural é ou não uma moda?


"Vinhos naturais" ou, se quisermos, "vinhos nus". Entre tantos temas possíveis este foi o escolhido para arrancar a primeira wine summit do género a nível mundial, que acontece em Cascais até à próxima sexta-feira. Eram 9h30 quando a jornalista Alice Feiring despertou a plateia de uma sala que se foi compondo aos poucos ao falar de um tema que, apesar de representar um nicho, é controverso.

"Em 2000 eu era como todos os outros que acreditavam naquela frase, 'o que é que não é natural no vinho?'", começa por dizer Alice no auditório do Centro de Congressos do Estoril, que acolhe a Must Fermenting Ideas. A autora de quatro livros e jornalista de renome — que chegou a ser considerada a "salvadora do mundo perante a normalização do vinho", assegura a organização do evento — não é parca em palavras e, ao longo do discurso, vai deixando cair críticas para quem as quiser apanhar, ao falar da adulteração do vinho como um método para fazer dinheiro e que de novo não tem nada.

"A maior parte dos vinhos rosé no mercado não têm a cor natural", diz Alice ao Observador, já finda a palestra. Serve o exemplo para explicar que através de aditivos é possível criar sabores, aromas e até texturas num vinho que, à partida, não nasce com as respetivas características. O dinheiro, diz, está por trás de tais alterações, até porque "muitas grandes empresas decidem o que os consumidores querem beber". Há tecnologia para isso, garante, e em causa está o que Alice diz serem receitas mais fáceis de replicar.


Alice Feiring é uma autora e jornalista de renome, defensora assumida de "vinhos naturais". (Foto: PPP/ Wine Summit)

Mas o que significa "natural"?

Mas o que é, então, vinho natural? Segundo Alice, é todo o vinho que provenha de uma agricultura orgânica, mesmo que não certificada, ao qual nada pode ser retirado e nada pode ser adicionado. Ou seja, nem todos os vinhos biodinâmicos ou orgânicos são "naturais", mas alguns vinhos "naturais" podem efetivamente ser biodinâmicos e orgânicos. Confuso, não é?

Rui Falcão, crítico de vinhos e um dos organizadores do evento, afiança que não há uma definição específica de vinho natural, até porque não existe qualquer certificação.

"O tema em si é controverso e tudo o que é controverso cria debate e emoção", diz Falcão quando questionado sobre o motivo por que dois dos oradores do primeiro dia de palestras falaram sobre um mesmo tema. "Apesar de ser um nicho de mercado isto é algo que cria muito ruído porque nem todos compreendem o significado da palavra." O crítico de vinhos explica que, quando o assunto é vinho natural, à tona vêm dois lados extremistas. Se por um lado há alguma postura evangélica e superioridade moral de quem defende os "vinhos naturais", por outro, há quem se sinta ofendido pela escolha do nome. "Até parece que os outros são artificiais", aponta Falcão.

A palavra "natural" — na aceção defendida por Alice Feiring — não significa automaticamente que os vinhos sejam bons. Mas porquê, então, trazer o tema para debate? "É uma chamada de atenção, sobretudo tendo em conta que os países do novo mundo olham para o vinho como um produto que se quer standardizar e industrializar. Querem uma coisa igual todos os anos e a natureza não é igual todos os anos", afiança Rui Falcão.

Alice não consegue descrever a que sabe o vinho natural, apenas atira que "sabe a vinho". "A maior parte das pessoas que o prova diz 'uau! Não sabia que o vinho tinha este sabor'", conta-nos. Para a jornalista, que cita um produtor seu conhecido, nos vinhos ditos convencionais o primeiro gole é o melhor, enquanto nos naturais o melhor é mesmo o último. "O vinho natural está sempre em evolução, cada gole é diferente e isso é excitante."

O tema em causa está longe de ser consensual. Foi precisamente por isso que Alice quase ia perdendo a carreira que já construiu. "Quando comecei a escrever sobre isto quase assassinei a minha carreira porque as pessoas não queriam que eu escrevesse sobre vinhos naturais", conta, num registo um pouco mais hesitante. "Fiquei conhecida por isso e as pessoas já não queriam o meu nome no jornal porque isso significava muitos problemas." Alice diz ser a pessoa que há mais tempo escreve sobre o tema. Mas não é a única.

Jamie Goode é outro dos nomes associados ao movimento dos "vinhos naturais". O homem que começou por ser um cientista acabou por se render ao universo de Baco e é hoje também um reconhecido jornalista de vinhos. Goode, que falou já no painel da tarde, é menos radical do que Alice. É ele quem começa por garantir que os vinhos modernos acabaram por melhorar a experiência de beber vinho. Mas se por um lado o vinho está melhor "em alguns sentidos", por outro, a indústria abriu uma brecha que acabou por ser colmatada com os "vinhos naturais". Um movimento que Goode apelida de "retro".


Jamie Goode começou por ser cientista mas rendeu-se ao mundo dos vinhos. (Foto: PPP/ Wine Summit)

Goode salienta várias vezes durante a palestra a "elegância dos vinhos naturais" e argumenta que "não há valor no vinho se ele não conseguir exprimir o lugar de onde vem". Dito isto, é o primeiro a assinalar os seus problemas, que passam pela falta de definição e pelo facto de existir demasiada ênfase no processo: "Acho que devíamos estar a olhar para os resultados. É por isso que prefiro o termo 'vinho autêntico'". A isso acrescenta-se aquilo que por vezes pode ser considerado um "movimento ideológico". Há uma falha, assegura, quando a separar os "vinhos naturais" dos vinhos "industriais e aborrecidos". E ao contrário do que Alice Feiring disse na sua intervenção, a ausência de uma maior concentração de sulfitos não evita as ressacas, garante Goode.

De uma coisa o jornalista não tem dúvida, quando questionado sobre se os "vinhos naturais" são uma moda passageira ou algo que vá ficar: "O vinho natural é uma correção necessária tendo em conta o rumo que o vinho tomou."

Há vinho natural em Portugal?

"Os vinhos naturais são uma realidade em Portugal como em qualquer outro país. É uma moda que está a crescer", garante Rui Falcão, que refere que há vários produtores que o produzem, muito embora os seus vinhos não levem no rótulo a palavra "natural". "É uma produção e consumo de nicho."

Rodolfo Tristão, sommelier de profissão, é de uma opinião ligeiramente diferente, ao falar de "tendência" em vez de "moda" e relaciona a eventual procura de "vinhos naturais" com uma maior consciencialização do que é bom e natural, algo que vai à boleia do conceito slow food. Sendo este um tema — repita-se — controverso, Tristão faz questão de salientar que há quem seja fundamentalista, sobretudo nos países nórdicos, e repete uma ideia já antes dada ao Observador:

A tendência agora [em Portugal] é para fazer vinhos apostados na qualidade e no facto de serem amigos do ambiente. Quanto mais natural, melhor. E, sim, a tendência no mercado atual é para colocar a menor quantidade de sulfitos possível: à medida que os anos vão passando, os produtores vão colocando menos sulfitos"


E onde é que se bebe o dito vinho natural? Surpreendentemente, ou talvez não, Alice Feiring é a primeira a responder, sugerindo num repente três sítios em Lisboa onde é possível provar esses vinhos: no restaurante Leopold, na Sagrada Família e no Café Tati. Quando a conversa é o mundo, Alice aponta para os Estados Unidos da América, para a cidade de Copenhaga, capital da Dinamarca, e ainda Barcelona ou Madrid, em Espanha. "Alguns países onde grandes empresas de vinho dominam o mercado, e que têm muita influência, têm maiores dificuldades em trazer o vinho para os restaurantes", assegura a jornalista. "Itália já teve esse problema. Agora já não."

Nem de propósito, nos próximos dias 30 de junho e 1 de julho Os Goliardos, que existem no mercado vínico há cerca de 12 anos, vão organizar a feira Vinhos ao Vivo, que já vai na sua oitava edição. A equipa em questão, que já foi responsável por um wine bar e que hoje está à frente de uma garrafeira online, entre outros serviços, aposta em vinhos de terroir nacionais e europeus — entre as referências que vão estar presentes na feira há os ditos "vinhos naturais".



Este não foi, porém, o único tema do dia. Ao palco subiram ainda nomes como Natalia Velikova, professora na TexasTech University e investigadora na área do enoturismo, marketing de vinho e comportamento do consumidor, para falar de quais os melhores modelos de enoturismo, mas também Paul Symington, da família produtora com o mesmo nome, para debater o futuro dos vinhos fortificados.

A Must Fermenting Ideas, uma espécie de Web Summit para o mundo dos vinhos, continua nos dias 8 e 9 de junho, ocupando o Centro de Congresso do Estoril. Do seu painel fazem parte figuras de renome internacional no mundo dos vinhos. A Wine Summit Cascais, como também é conhecida, tem organização portuguesa: Paulo Salvador, jornalista e editor executivo da TVI, e Rui Falcão, um dos críticos de vinhos mais conceituados no país são os promotores do evento.