terça-feira, 27 de agosto de 2019

António Costa afirma no Algarve prioridade no combate às alterações climáticas



Jornal Económico com Lusa 25 Agosto 2019, 15:18

No sul do país, o primeiro-ministro reconheceu que a serra algarvia "está também na linha da frente daquilo que são as consequências das alterações climáticas", adiantando que é necessário "proteger o Caldeirão e a biodiversidade".

Venham conhecer o "outro Algarve"! O primeiro-ministro fez este apelo ao falar aos jornalistas no miradouro da serra do Caldeirão, no concelho de Loulé (distrito de Faro), onde a sua comitiva parou no âmbito de uma visita à N2, que se iniciou em Faro, passou por São Brás de Alportel e vai seguir durante os próximos dias noutras zonas do país para dar a conhecer e valorizar o interior.

"O primeiro objetivo é voltarmos a ver um país que tem ficado escondido pelas autoestradas e ver o seu enorme potencial, a partir dos recursos naturais que tem – começámos por ver as termas em Chaves –, aquilo que são as suas produções naturais, culturais e as suas riquezas paisagísticas", afirmou António Costa.

O troço entre São Brás de Alportel e Almodôvar, referiu, "é o único que está classificado" e representa "uma grande riqueza deste outro Algarve que também existe" no interior.

"O Algarve é bastante mais do que mar, sol e praia e há este outro Algarve que é preciso proteger. E a serra do Caldeirão é de uma enorme riqueza do ponto de vista ambiental e da sua biodiversidade", exemplificou. Disse depois que a serra algarvia "está também na linha da frente daquilo que são as consequências das alterações climáticas" e que é necessário "proteger o Caldeirão e a biodiversidade", mas tendo o "objetivo de combate às alterações climáticas como prioritário".

"Portugal foi o primeiro país no mundo a assumir 2050 com meta para a neutralidade carbónica. Fomos também o primeiro país a aprovar o nosso roteiro para a neutralidade carbónica, definindo nas diferentes áreas – desde a produção de energia à economia circular – quais são as metas que tem de cumprir para assegurar esta neutralidade, porque não basta ter este objetivo. Temos esta ambição, é depois necessário programar e agir", acrescentou.

O secretário-geral socialista apontou também a água como um "recurso fundamental" que "começa a escassear bastante na serra do Caldeirão". A sua falta deixa o Algarve como "uma zona de grande pressão".

"Do ponto de vista do abastecimento humano está assegurado, mas é uma enorme exigência melhorar a sua eficiência para o uso para a agricultura. A agricultura é a grande fonte do consumo de água, 74% da água consumida é água consumida na agricultura, e melhorar a eficiência é absolutamente chave", sustentou.

A falta de água, sublinhou, pode deixar a "paisagem alterada" e afeta uma "grande riqueza desta serra, que são os sobreiros", árvores que "estão já a sofrer consequência da falta de água", juntamente com o a apicultura, que sofreu uma "descida significativa da produção devido à seca".

"É por isso que no final deste ano teremos aprovados planos de seca em cada uma das bacias hidrográficas, para podermos definir em cada uma o que é necessário fazer para podermos aproveitar melhor esse recurso fundamental que é a água, como condição de vida e de preservação destes habitats", argumentou.

O roteiro pela EN2 teve início na terça-feira me Chaves.

Questionado pelos jornalistas sobre a entrevista que deu ao semanário o Expresso, publicada no sábado, e o desagrado que esta provocou no BE – partido com que o PS manteve um acordo na legislatura que agora termina para suportar o Governo -, António Costa respondeu apenas que a entrevista tinha que ser lida na totalidade e não parcialmente, para não ser mal entendida.

O socialista insistiu em que o interior é uma "fonte de inspiração" e sublinhou que as autarquias da N2 se juntaram numa associação intermunicipal para "valorizar este património", apesar de serem de partidos diferentes, como o país vai ter de fazer em outubro, após as eleições legislativas.

Douro inicia vindimas e estima aumento de produção de 30%

Responsáveis pela produção dizem que é cada vez mais difícil arranjar mão-de-obra. As gerações mais novas não querem trabalhar nas vinhas.

DN / Lusa
25 Agosto 2019 — 11:49

Vinho francês de 30 mil euros terá lançamento mundial no Porto
O Douro está a iniciar as vindimas e prevê um aumento de produção na ordem dos 30% nesta campanha, mas na região verificam-se cada vez mais dificuldades em recrutar mão-de-obra para o trabalho na vinha.

A vindima culmina um ano de trabalho e é considerada a época alta da mais antiga região demarcada e regulamentada do mundo. As vinhas enchem-se de vindimadores e a região de turistas que querem ver e até participar no corte das uvas.

A Quinta do Vallado, no concelho de Peso da Régua, distrito de Vila Real, foi uma das primeiras da região a arrancar com a vindima. Primeiro cortam-se as uvas brancas, seguindo-se, dentro de dias, as uvas tintas.

A propriedade possui uma equipa que trabalha o ano inteiro e, nesta altura, recorre também aos empreiteiros agrícolas e contrata diretamente pessoas das aldeias próximas.

Francisco Ferreira, responsável pela gestão agrícola e de produção do Vallado, assinalou a mão de obra como "uma dificuldade" e referiu que se nota que, de ano para ano, mais pessoas saem da região e menos querem trabalhar na agricultura.

Com o aumento estimado da colheita, na ordem dos 30% em toda a região demarcada, as carências de mão-de-obra poder-se-ão também intensificar.

Fátima Carvalho, com 63 anos, trabalha para a Agropenaguião, uma empresa que fornece mão-de-obra para as atividades agrícolas. É de Ancede, em Baião, e disse à agência Lusa que se levanta às 03:30 para se preparar, fazer a merenda e apanhar a carrinha para viajar para o Douro.

"Fui sempre habituada na agricultura e já não me custa nada. Não consigo estar em casa", contou.

António Costa tem 56 anos, é de Barrô, no concelho de Resende, levanta-se todos os dias às 05:00 e regressa a casa por volta das 19:00.

Este trabalhador coordena os vindimadores do empreiteiro na Quinta do Vallado e disse também que "é cada vez mais difícil arranjar mão-de-obra no Douro", principalmente nestas alturas em que o trabalho se intensifica.

"O pessoal novo não quer e são os mais antigos que aqui andam. Vê-se pouca juventude na vinha", referiu.

Verónica Cardoso é trabalhadora afeta à Quinta do Vallado, tem 26 anos, é natural de Santo Xisto e uma das mais novas que estava nesta vindima, garantindo que gosta de "trabalhar na vinha e ao ar livre".

"Nasci no meio das vinhas e acabei por ficar por cá", frisou.

Maria Lucília, 64 anos e natural de Loureiro, na Régua, faz vindimas desde que era pequena e sublinhou "que não custa nada" e que gosta do corte das uvas.

Este é um trabalho sem teto e, por isso, é com naturalidade que estes vindimadores enfrentam o calor intenso que se sente por estes dias no Douro.

Segundo dados revelados pelo Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), no Douro espera-se uma produção na ordem dos 1,6 milhões de hectolitros de vinho, enquanto no ano passado foi de 1,3 milhões de hectolitros. O aumento será na ordem dos 30% face ao ano anterior e de 16% relativamente à média dos últimos cinco anos.

Francisco Ferreira disse que na Quinta do Vallado se prevê um aumento da produção de cerca de 10% comparativamente com 2018, no entanto ressalvou que, no ano passado, a quebra aqui também foi "pouco significativa".

O responsável referiu que em termos quantitativos, este será um "ano ligeiramente acima da média" e explicou que, por causa da pouca chuva, o bago está um pouco pequeno, no entanto esse fator poderá dar "alguma concentração e qualidade à uva".

"Em termos sanitários foi um ano bom, praticamente sem problemas", frisou.

De acordo com o IVV, na região de produção de vinho do Porto e do Douro o "míldio manifestou-se de forma pouco intensa, não afetando de uma forma geral, a produção".

O instituto referiu ainda que "as condições climáticas verificadas, com destaque para o mês de junho, com humidade relativa elevada e dias encobertos, contribuíram para a propagação do oídio, mas sem impactos significativos na produção".

Em contrapartida, no ano passado verificaram-se situações de granizo, míldio e escaldão, o que se refletiu na produção final.

Em todo o país, de acordo com o IVV, estima-se que a produção de vinho na campanha 2019/2020 atinja um volume de 6,7 milhões de hectolitros, o que se traduz num aumento de 10% relativamente à campanha 2018/2019 e 4% em relação à média dos últimos cinco anos.

O que torna o pinhão português tão valioso?


Chamam-lhe o ouro branco das florestas e é um produto de excelência de Portugal. Como se retira o pinhão das pinhas em escala industrial? E porque é tão caro este fruto seco?

Alexandra Prado Coelho (Texto) e Rui Gaudêncio (Fotografia)  16 de Fevereiro de 2019, 3:14

Quando Francisco Cecílio, no final dos anos 1950, teve uma intuição visionária sobre o potencial do pinhão, o mundo era muito diferente do que é hoje. "O pinhão era colhido manualmente e trabalhado pelas famílias", conta Teresa Cecílio, a neta, terceira geração à frente da empresa de Coruche que leva o nome do avô e é, actualmente, a mais antiga fábrica transformadora de pinhão em Portugal, com as marcas Pinheiro e Lynce.

Francisco era "um comerciante por natureza" e conta-se na família que aos nove anos já andava a negociar cabritos para depois os vender. Talvez por isso viu na altura o que ninguém via: fechados dentro dos milhões de pinhas dos pinhais da região estavam os deliciosos pinhões pelos quais alguém um dia haveria de pagar bom preço (o chef espanhol Martín Berasategui, que recentemente abriu em Lisboa um restaurante de luxo, o Fifty Seconds, no cimo da Torre Vasco da Gama, diz que o produto português que mais o impressionou pela qualidade foi o pinhão).

Uma vez por mês, vamos passear pelos pomares de Portugal, à descoberta das paisagens que nos dão sabores. Em Março andaremos atrás da amêndoa de Trás-os-Montes e até ao final do ano iremos apanhar laranjas ao Algarve ou cerejas mais a Norte. Venha connosco encher a cesta!

Crianças refugiadas fotografaram o "inferno" onde vivem, às portas da Europa
O processo não era simples. Depois de os homens subirem aos pinheiros para apanhar as pinhas, estas eram distribuídas por famílias que, ao serão, ocupavam todos os membros, adultos e crianças, na tarefa de abrir a pinha, tirar o pinhão em casca, abrir a casca e retirar o miolo. O problema, conta Teresa Cecílio, é que nesses tempos do seu avô a rentabilidade era baixa porque não se conseguia controlar a quantidade de pinhões que estes trabalhadores iam comendo. Quando, na manhã seguinte, Francisco passava pelas casas para recolher os sacos de miolo de pinhão, as famílias diziam que só rendera aquilo e o empresário não tinha maneira de confirmar se era verdade ou não.

Foi por isso que começou a pensar em formas de tornar o processo mais rentável e criou algumas máquinas para estar menos dependente da mão-de-obra humana. Hoje, quando visitamos a fábrica Cecílio de Coruche, o que vemos são máquinas inspiradas nessas primeiras criadas por Francisco.

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Os pinhões em casca chegam, são molhados e levam um choque térmico que faz rachar a casca, são depois separados da película mais fina que os envolve, passam por uma lavagem porque o pó negro infiltra-se facilmente nos poros, são secos, polidos, e cuidadosamente seleccionados, primeiro por uma máquina e depois por um grupo de quatro mulheres que só deixam passar os que estão perfeitos, com tamanho e cor ideais.

Mas esta é a segunda parte de um processo que, no caso da Cecílio, começa a alguns quilómetros dali, na Herdade dos Coelhos, onde chegam as pinhas compradas aos proprietários florestais da região, que é uma das principais zonas produtoras de pinhão do país. Recuemos mais uma vez ao passado para perceber como se fazia antigamente na Cecílio. Colocadas em montes, as pinhas eram deixadas ao sol a secar até as pétalas começarem a abrir e ser possível retirar-lhes o pinhão em casca.

Era um método que, sublinha Teresa, demorava muito tempo e exigia uma atenção permanente porque cada vez que começava a chover era preciso ir a correr tapar os montes de pinhas para evitar que apodrecessem. Além disso, deixadas ao ar livre, as pinhas eram frequentemente roubadas. Por isso, hoje utiliza-se outro método: a abertura forçada pelo calor, com as pinhas a serem colocadas num forno alimentado com a madeira das próprias. No final, desfeita a pinha, ficam os pinhões em casca que seguem então para a fábrica de Coruche.

PÚBLICO - Aumentar
De uma pinha retira-se em média 3% de miolo de pinhão, tudo o resto é madeira que será usada como combustível. Isto ajuda a perceber por que é que este fruto atinge valores tão elevados. Mas há outras explicações. Em primeiro lugar, a apanha do pinhão é um processo ainda muito manual, complicado, com riscos, e, por isso mesmo, com custos elevados nessa fase do processo.

Há já nos campos algumas máquinas para a apanha mecânica, que fazem vibrar o pinheiro até as pinhas grandes caírem no chão (são adaptadas das usadas nos olivais), mas nem todos os produtores as utilizam. Os pinheiros mansos têm uma característica que os torna muito diferentes das oliveiras neste aspecto: os seus ciclos produtivos são de três anos, o que significa que em cada pinheiro há pinhas em três fases diferentes, a maior, que pode ser apanhada, uma média, que atingirá o tamanho ideal daqui a um ano e uma mais pequena, que será colhida ao terceiro ano. É essencial que, qualquer que seja o método utilizado para a apanha, só caia ao chão a pinha maior, e que as outras não fiquem danificadas para não comprometer a campanha do ano seguinte.  

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RUI GAUDÊNCIO
Depois, explica Teresa Cecílio, há ainda uma grande dificuldade, que os vários envolvidos nesta fileira estão a tentar ultrapassar, que é a de antever qual será a produtividade de um determinado pinhal. Sem se ver o interior da pinha não se sabe quantos pinhões ela tem, pelo que pagar um preço fixo por quilo de pinhas se se conhecer bem o pinhal é também um grande risco – até porque o pinheiro manso é sensível às mudanças climáticas, podendo produzir mais num ano e menos no outro.

Além disso, recentemente esta espécie foi atacada por uma praga (o insecto Leptoglossus, que suga o interior do pinhão quando ele ainda está leitoso), aparentemente já controlada, mas que provocou enormes perdas, deixando o sector à beira do desespero. A isto somam-se ainda as alterações climáticas, com anos mais secos a afectar também a produção.

Estamos na época do pinhão (a apanha decorre entre 1 de Dezembro e 31 de Março). Nos pinhais em redor de Coruche, zona de temperaturas amenas, solos arenosos e influência do mar, as pinhas começam a cair ao chão, escondendo ainda no interior das pétalas o precioso fruto, de cor de marfim e sabor a floresta, tantas vezes chamado ouro branco.

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Muitos dos pinheiros mansos que vimos no caminho ainda não produzem, fazem parte da área plantada nos últimos 15 anos e vão precisar de mais alguns para começarem a dar fruto. Mas provam uma coisa: a visão de Francisco Cecílio, há mais de 70 anos, estava certa. Havia futuro para o pinhão português.