sábado, 26 de janeiro de 2019

Ministros da Agricultura e Ambiente desvalorizam polémica sobre redução de bovinos


Os ministros da Agricultura e do Ambiente desvalorizaram hoje no parlamento a proposta de redução do gado bovino para combater as alterações climáticas, que PSD, CDS-PP e PCP consideram inaceitável e um ataque à agricultura.

Em dezembro de 2018 o ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, apresentou o Roteiro para a Neutralidade Carbónica, que implica o país conseguir, até 2050, remover (por exemplo através da floresta) todas as emissões de gases com efeito de estufa que produzir.

O roteiro, em consulta pública até ao fim de fevereiro, incide especialmente em áreas como a energia, a indústria ou os transportes mas também no setor agropecuário, com uma previsão de redução do efetivo bovino entre 25 e 50%.

Foi essa questão que levou PSD, CDS-PP e PCP a chamar João Pedro Matos Fernandes mas também o ministro da Agricultura, Capoulas Santos, à comissão parlamentar de Agricultura, para darem explicações.

A medida, nas palavras dos deputados dos três partidos, vai prejudicar a agricultura e o mundo rural, num país que até é deficitário em carne bovina.

Matos Fernandes lembrou que o roteiro resulta de compromissos assumidos por Portugal em 2016, e disse que na projeção de medidas se admitiu uma evolução da dieta alimentar para menos carne e mais vegetais, e opções tecnológicas mais limpas no setor.

"A redução do efetivo de bovinos que muito tem vindo a ser discutida não é uma proposta mas sim um resultado dos cenários estabelecidos e que, saliento, são feitos para um horizonte de 30 anos", disse o ministro, acrescentando que os cenários "não configuram propostas de atuação".

A agricultura representa 10% das emissões de gases com efeito de estufa e destas 83% são da pecuária, lembrou, frisando que as metas apresentadas no roteiro "não são negociáveis" se o objetivo for um futuro neutro em carbono, que os agricultores são os primeiros a sentir os efeitos das alterações climáticas e que o setor ainda não fez propostas para o roteiro em consulta pública.

Capoulas Santos disse também que enquanto ministro e enquanto cidadão está de acordo com as metas de descarbonização e relativizou a polémica, até por se tratar de uma quantidade reduzida de emissões de gases com efeito de estufa, comparando com outros setores.

E disse ainda que o futuro do setor passará por melhorias genéticas, por melhores rações e menos emissões, e que se deve ver como conciliar a manutenção da atividade com a redução de gases. A agricultura já tem hoje "um forte desempenho ambiental", e "está em condições de contribuir para esse grande objetivo de metas de descarbonização", disse Capoulas Santos.

Declarações que não convenceram os deputados do PSD, do CDS-PP e do PCP, com António Ventura, do PSD, a dizer que o Governo abandonou quem resiste e permanece no mundo rural, e com Patrícia Fonseca, do CDS-PP, a considerar que as palavras dos dois ministros não são coerentes. João Dias, do PCP, perguntou também que consequências terá a medida para o setor da transformação (matadouros, por exemplo).

Pedro Soares, do Bloco de Esquerda, e André Silva, do partido Pessoas-Animais-Natureza, estiveram do lado dos ministros, com o primeiro a criticar os que defendem as metas de descarbonização mas que querem que tudo fique na mesma.

"Reduzir o assunto mais importante do mundo a uma questão bovina não faz sentido nenhum. Não é o ministro que vai obrigar à redução bovinos, e a própria redução da procura que o vai fazer", disse o deputado.

E André Silva acrescentou que o roteiro é bem conseguido embora "tímido" e que os portugueses têm de ser esclarecidos sobre os malefícios da carne. E criticou "a cassete da destruição do mundo rural".

O longo debate sobre a matéria foi resumido pelo deputado Pedro Coelho, do PS, com a frase "tempestade num copo de água".

E Matos Fernandes ainda disse que a agricultura "é bem tratada" no roteiro. E que não consegue entender como é que se deseja um país carbonicamente neutro no qual a agricultura tem de ficar de fora, sendo a que menos tem de reduzir emissões e a que mais sofre os efeitos das alterações climáticas.

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