sábado, 15 de agosto de 2020

Crise é oportunidade para agricultura portuguesa



Luís Ribeiro, administrador do Novo Banco, considera que a crise dos últimos meses é um desafio, mas também uma oportunidade para o setor da Agricultura
Arecente crise relacionada com a pandemia da Covid-19, bem como as prioridades estratégicas da Europa vertidas no plano de recuperação, é uma oportunidade para as empresas nacionais ligadas à Agricultura. É essa a visão de Luís Ribeiro, administrador do Novo Banco com o pelouro do retalho e do segmento de negócios, expressa em entrevista à EXAME, como parte da parceria relativa às PME Líder.

Temos a perceção de que a Agricultura, enquanto atividade económica, mudou muito nos últimos anos. Confirma esta mudança? A que se deve?

Sim, efetivamente registou uma evolução muito positiva. Temos vindo a assistir a um volume significativo de investimento a par de um rejuvenescimento e crescente profissionalização do setor. Os nossos empresários agrícolas investiram e as empresas ganharam dimensão, apostaram em novas culturas e adotaram técnicas inovadoras. Paralelamente, também se verificou uma melhoria nas cadeias de comercialização e a aposta em novos mercados. Tudo isto contribui para o aumento do peso do setor na nossa economia.

O Novo Banco tem mantido ao longo dos anos uma postura muito próxima do tecido empresarial. Como se posiciona particularmente o Setor Agrícola em termos de abordagem comercial do Banco?

É estratégico e está na mesma linha de prioridade que a Indústria, o Turismo ou os Serviços. Com a profissionalização do setor de que já falei, é natural que a liderança, capacidade de gestão e perspetivas de crescimento e rentabilidade das empresas agrícolas estejam ao nível das restantes. Adicionalmente e ao longo do tempo, tem tradicionalmente demonstrado uma maior resiliência. Por isso procuramos colocar à disposição dos nossos clientes do setor agrícola, todo o nosso conhecimento, através de um conjunto de Soluções que visam suprir todas as suas necessidades específicas: de tesouraria inerentes aos diferentes ciclos de produção através de crédito de curto prazo, de investimento ajustadas às diferentes culturas com crédito de médio longo prazo, bem como de apoio às exportações ou soluções para fidelizar os seus colaboradores.

A crise dos últimos meses mostrou-nos que as cadeias de abastecimento globais poderão ser difíceis de repor. Isso deve ser considerado como um desafio adicional para o setor?

É sem dúvida um desafio, mas para um país como Portugal, que ainda é deficitário em muitos produtos, é também uma oportunidade.

Não são só as cadeias de abastecimento que mudaram, o comportamento dos clientes e as suas preferências também se alteraram, e isso é uma oportunidade para o setor crescer no relacionamento com os seus clientes. O desenvolvimento da logística, que permite alavancar imenso as vendas online, encurtando prazos de chegada dos produtos diretamente do produtor ao consumidor, terá um efeito positivo no médio prazo. Esta perceção do mercado, de produtos frescos vindos do produtor e de elevada qualidade, será uma alavanca que virá do lado do mercado nacional.

Os produtos 'made in Portugal', não só os frescos, mas também os transformados, estão muito bem cotados e podemos e devemos aproveitar as necessidades dos nossos parceiros tradicionais da União Europeia para substituir alguns exportadores de fora do nosso espaço económico

Já quanto aos mercados externos, os produtos "made in Portugal", não só os frescos, mas também os transformados, estão muito bem cotados e podemos e devemos aproveitar as necessidades dos nossos parceiros tradicionais da União Europeia para substituir alguns exportadores de fora do nosso espaço económico. Para isso há desafios adicionais, que passam pela certificação internacional dos produtos e pelo ganho de escala – que se pode conseguir através do associativismo agrícola através de organizações de produtores.

Os nossos empresários são resilientes e têm uma forte capacidade de adaptação, pelo que irão certamente colher os frutos destas novas oportunidades.

O plano de recuperação europeu poderá contribuir para um reforço do investimento na agricultura portuguesa. Que tipo de projetos poderão beneficiar com a previsível estratégia da UE e de Portugal para este setor?

Não tendo ainda todos os detalhes do plano, é expectável uma forte aposta na sustentabilidade, na digitalização e na economia verde. As verbas a disponibilizar, em sede de Política de Coesão e que visam apoiar a diversificação da economia, e de Política Agrícola Comum no aproveitamento dos recursos endógenos, quando articulados e materializados em reforço de infraestruturas produtivas e que se complementam, sem dúvida que sim, que irão contribuir para o desenvolvimento da economia em geral e também do setor agrícola.

Adicionalmente acrescentarão valor todos os Investimentos ao nível da rede de transportes que venham a facilitar a logística da distribuição, a nível europeu, encurtando os prazos da entrega dos produtos, assim como seria muito relevante conseguir-se otimizar e ampliar as zonas de regadio, nunca descurando a melhoria dos padrões de racionalização e sustentabilidade dos sistemas de rega.

Por outro lado, também serão alavancas de crescimento da agricultura, os incentivos aos investimentos na indústria agroalimentar, como grande consumidora de produtos para transformação, bem como todo o investimento em termos de transição digital, que apoiará transversalmente a economia e também o setor primário.

As empresas do setor agrícola têm sido resilientes nesta fase de quebra económica. A procura por crédito tem sido mais para realizar novos investimentos ou para suprir necessidades de tesouraria?

Como já referi, as empresas agrícolas têm as mesmas necessidades que todas as outras empresas e, adicionalmente, tem a particularidade de não podermos interromper os ciclos da natureza e consequentemente das culturas. Isso faz com que, ao contrário de outros setores, a atividade das empresas agrícolas, pelo menos no que concerne à produção, não se alterou e grosso modo se mantiveram os níveis de pedidos de apoio creditício.

Como as empresas agrícolas nunca pararam, foi necessário continuar a suprir as necessidades em termos de apoio à tesouraria, com especial destaque para a aplicação dos tradicionais créditos de campanha ou antecipação de recebimentos via factoring, e também foi necessário continuar a apoiar a aquisição de fatores de produção e de equipamentos.

E como é um setor que produz bens essenciais e com mercado, os projetos de investimento que estavam em curso continuaram a ser desenvolvidos e apoiados em termos de crédito e registamos mesmo o facto de que temos continuado a ser desafiados para novos projetos, que continuamos a analisar e querer apoiar.

Sem comentários:

Enviar um comentário