segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Agricultura com IVA sem ativos biológicos (37)

Ofélia Vieira

Depois de celebrada a quadra natalícia, ainda com restos de bolos das
festas e convívios de Natal, eis que se instala um autêntico alvoroço
social e guerrilha de opinião sobre a governança por conta do OE2013,
naturalmente como são as contrariedades e contraditórios da vida e do
homem, como ser vivo politizado enquanto governado.

Uma das relevantes alterações da fiscalidade no ano agora iniciado,
que ainda cheira a novo, é o fim da isenção (artº9) do imposto sobre o
valor acrescentado (IVA) nas atividades agrícolas.

Forma jurídica do produtor agrícola e dimensão das explorações agrícolas



Desde logo, tenho uma dupla missão em abordar tal matéria. Primeiro,
porque faz quase um ano que escrevi um artigo criticando os efeitos da
renúncia à isenção do IVA na agricultura, sabendo que raramente é
cumprido o que determina o nº1 do artigo 5º do anexo ao Decreto-Lei nº
418/99, de 21 de outubro e o controlo das existências em contabilidade
organizada sem ativos biológicos. Segundo, porque agora, durante estas
primeiras semanas do mês e do ano, tenho sido contatada
frequentemente, por agricultores que solicitam esclarecimento,
informação e respetivas instruções, e serviços relacionados com tal
obrigatoriedade.

Na verdade, desde a implementação obrigatória do IVA resultante da
nossa integração na União Europeia, é a primeira vez que os produtores
agrícolas se igualam à fiscalidade da maioria das restantes atividades
económicas, o que por si só já provoca alguma ansiedade, sem antes
conhecer objetivamente as verdadeiras consequências. Dirão muitos, ou
quase todos os contribuintes: "ainda bem, já era tempo dos
agricultores também pagarem impostos!" Dito isto, quem vai ficar na
memória como responsável por tal decisão pela equidade, é o Gaspar,
não o rei mago nem o gato do deputado Honório Novo, mas o tal, da
troika. Então alívio meu, porque livre de qualquer preconceito ou
ideologia político-partidária sectária, tenho a concentrar-me apenas e
só sobre os efeitos contabilísticos nas atividades agrícolas, pela
obrigatoriedade de tal imposto.

Porém, inevitavelmente surge outra questão ou bloqueio, tanto ou mais
controverso ainda, não sobre os efeitos na aplicação do IVA como
política fiscal, mas com a natureza da contabilidade, conforme
normativos harmonizados ou não em curso devido ao SNC – sistema de
normalização contabilística.

Pela envolvência de novas regras de faturação conforme determina o
Dec-Lei nº 197/2012 de 24 de agosto, está a ser prática corrente a
recomendação dos agricultores aderirem à contabilidade organizada, tal
como é imputado às grandes empresas, e sociedades comerciais, que tem
por base a tipologia da contabilidade por partidas dobradas.

Só que esta presunção dá início a uma nova e enorme confusão em
matéria contabilística na agricultura. O SNC, obrigatório desde 2010,
determina um normativo próprio para a atividades agrícolas (contas 37
para animais e plantas, vivos), tal como é harmonizado e preconizado
(IAS41). Mas tal normativo específico e regulamentado
internacionalmente para a agricultura, foi entretanto afastado no
nosso país, por razões subjacentes a elevados custos de contexto. O
legislador produziu então outras normas com sistema de contas e
princípios adaptados do plano de contabilidade antes geralmente aceite
denominado POC, para agora ser generalista e único o sistema de
contas. São portanto omissas em contabilidade organizada, para as
pequenas e médias empresas assim como para as micoentidades, as contas
dos ativos biológicos, que são os principais ativos responsáveis pela
produção agrícola - agricultura.



Perante tal cenário, é fácil deduzir as consequências dos agricultores
que optarem por contabilidade organizada. As contas dos ativos
biológicos são fundamentais, porque são a base da tipologia da
contabilidade destinada a informar as entidades financeiras
(IFAP,I.P.) para os agricultores enquanto beneficiários dos programas
de desenvolvimento rural PRODER, PRORURAL e PRODERAM. Daí já ser
possível prever que tais consequências vão contribuir para o aumento
do custo de contesto, pela existência de duas contabilidades de
tipologias diferente (fiscalidade e gestão) para além da ambiguidade
do reconhecimento dos subsídios à exploração no sistema de contas para
as microentidades ser contabilizado obrigatoriamente como capital
próprio (conta 5), o que obriga a serem reconhecidos e tributados como
Outros rendimentos / mais-valias. E semelhante polémica já ocorreu em
2008 relativo aos rendimentos dos produtores agrícolas singulares –
categoria B, que só teve um final feliz a nível nacional graças a
intervenção de pareceres de fiscalistas.



Ora o que devo então recomendar aos agricultores como boa prática de
gestão, duvidando eu que tais bloqueios ou controversas apenas existem
porque implícitas a interesses corporativos, que são de todo contra os
objetivos e recomendações do tal Gaspar e troika?

Para o ano, se tiver oportunidade e a mesma motivação, vou aferir as
minhas previsões e conclusões, enquanto 87% das explorações agrícolas
vão ficar ao abrigo do CIVA - sem contas dos ativos biológicos (37).
Por enquanto, vou retomar alguma tranquilidade porque em breve vai dar
início os preparativos dos enredos e ensaios, para a grande festa
popular que se aproxima na minha terra. Bom Carnaval!

(*) Definição no RA09 - VVP é o valor monetário médio da produção
agrícola numa região, obtido a partir dos preços de venda à porta da
exploração. É expresso em hectare ou cabeça de gado, conforme o
sistema de produção, e corresponde á valorização mais frequente que as
diferentes produções agrícolas têm em determinada região.

Ofélia Vieira
TOC, Engª agrária

Publicado em 14/01/2013

http://www.agroportal.pt/a/2013/ovieira.htm

Sem comentários:

Enviar um comentário