sábado, 24 de março de 2012

Nova Zelândia: uma agricultura sem subsídios

PAÍSES COMO NÓS II: UMA INICIATIVA EXPRESSO E PWC
Um país que trocou a agricultura subsidiada por um mercado muito
eficiente e competitivo.

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José Alves, Territory Senior Partner da PwC Portugal
A agricultura portuguesa caracteriza-se por uma produtividade
reduzida, estando a sua rentabilidade bem abaixo do potencial. Este
facto deve-se à existência, em elevado número, de minifúndios no norte
do país, onde o terreno é mais fértil, bem como a fatores
geomorfológicos, o que impossibilita a utilização eficiente das
máquinas agrícolas e, consequentemente, economias de escala. O sul do
país caracteriza-se pela predominância de latifúndios, se bem que, em
solos pobres e com pouca precipitação.

Adicionalmente, a população agrícola portuguesa possui um reduzido
nível de formação, está relativamente envelhecida e não detém
capacidade financeira, nem motivação, para realizar investimentos
inovadores que diferenciem os seus processos produtivos dos
concorrentes externos. As cooperativas nunca surtiram o efeito
desejado, devido à rigidez dos seus estatutos, à limitada participação
dos associados na administração das mesmas, à falta de
profissionalização da gestão e à reduzida capacidade de resposta às
condições do mercado, nomeadamente no que diz respeito à capacidade de
comercialização dos produtos.
Ao invés, nos anos 80, a Nova Zelândia encetou um processo de
reformulação do sector agrícola que se tornou um exemplo de sucesso,
extremamente competitivo a nível mundial, regendo-se os produtores
pelas leis de mercado.
Os subsídios, até à década de 70, foram a base de sustentação da
agricultura neozelandesa. Porém, perante a crise despoletada pelos
choques petrolíferos (73-79), e após a entrada do Reino Unido para a
CEE (1973), principal destino das exportações agrícolas neozelandesas,
os agricultores sugeriram ao Governo da altura a abolição dos
subsídios, propondo, em alternativa, um plano estrutural de apoio que
sustentasse uma agricultura capaz de viver num ambiente de mercado
aberto.
Este plano tinha como medidas-chaves a redução do endividamento, a
criação de um fundo de estabilização financeira para os agricultores e
uma linha de financiamento de 50% dos gastos dos agricultores que
estavam em dificuldades, junto da banca privada.
A não existência de subsídios forçou os agricultores a serem mais
inovadores nos seus processos de cultivo, obrigando-os a unir-se em
agrupamentos ou cooperativas sectoriais únicas. Há que salientar,
também, o reajustamento da estrutura produtiva face à liberalização do
mercado, com a consequente saída do sector de vários produtores.
Por fim, as condições geográficas da Nova Zelândia e do próprio clima
da região favorecem a prática do pastoreio, a criação de gado e a
agricultura, não tendo, Portugal, certamente, as mesmas condições
naturais. Tem, no entanto, a capacidade, que os neozelandeses tiveram,
de fazer melhor do que anteriormente.
José Alves, Territory Senior Partner da PwC Portugal
O papel do Estado na competitividade

Assunção Cristas, ministra da Agricultura
Em 2011 o sector agrícola cresceu 2,4%. Do resto da economia, apenas
as indústrias transformadoras, que incluem as agroindustrias,
apresentaram também uma taxa positiva (0,4%). Na última década, as
exportações do setor agroalimentar aumentaram 12%, quando o
crescimento médio das nossas exportações foi de 2%. No entanto a
competitividade da nossa agricultura é recorrentemente posta em causa.
A verdade é que, em termos de valor, a nossa balança agroalimentar é
deficitária em 30%, o que corresponde a cerca de três mil milhões de
euros.
Tenho uma ideia bem clara quanto ao futuro. O caminho a percorrer tem
seguramente três marcos: (1) organização e concentração da oferta, (2)
aumento da produção, e (3) reequilíbrio da cadeia alimentar.
A organização e concentração da oferta são vitais para a
competitividade da agricultura. Em Portugal estamos melhor, com uma
presença importante de organizações de produtores em diversos
sectores. As frutas e hortícolas são um bom exemplo, e o aumento das
exportações é o espelho do impacto deste fator no aumento da
competitividade. Precisamos de organizações maiores e mais fortes. É
isso mesmo que procuraremos conseguir, como um dos principais
instrumentos de política nos próximos fundos comunitários de apoio ao
investimento: sempre que possível, o acesso a apoios deverá ser
condicionado, ou majorado, para os agricultores que escoem a sua
produção através de organizações de produtores reconhecidas.
Para aumentar a produção, é essencial operar a vários níveis. Enuncio
alguns em que estamos a prosseguir iniciativas concretas: meios para
investimento; facilitação do acesso à terra; aumento da área e
irrigação; rejuvenescimento do tecido empresarial agrícola. Superar
estes obstáculos facilitará o acesso à inovação tecnológica e a
focalização na investigação aplicada.
Finalmente, é necessário reequilibrar as relações entre agricultores,
indústria e distribuição. É essencial para podermos ter mais produtos
portugueses no nosso mercado. É uma realidade a posição de fraqueza
negocial dos produtores nas relações com a indústria e com a
distribuição. Esta fragilidade pode e deve ser minimizada pela melhor
organização da produção. Paralelamente, o Governo está empenhado em
promover um diálogo construtivo e consequente. Para tal criámos a
PARCA, plataforma de diálogo com um programa de trabalhos bem
definido. Foram definidas três etapas, tendo já sido alcançada a
primeira: assegurar a transparência na formação do preço; estimular a
autorregulação, nomeadamente através da criação de associações
interprofissionais; se necessário, intervir legislativamente, por
exemplo ao nível dos contratos, estabelecendo a obrigatoriedade de os
celebrar por escrito e com conteúdos definidos.
A somar à maior presença interna dos produtos portugueses temos a
ambição de promover o aumento das exportações através de uma
estratégia clara que faça convergir o empenho de todos. Se, a médio
prazo, conseguirmos atingir a autossuficiência alimentar (em valor),
então é sinal de que fomos bem sucedidos na procura da competitividade
desejada. Estou certa de que todos juntos lá chegaremos!
Assunção Cristas, ministra da Agricultura
O sucesso (também) no novo mundo

Salvador Guedes, presidente da Sogrape
A Sogrape nasceu há 70 anos com o objetivo de "mostrar os vinhos
portugueses ao mundo". A vocação internacional da empresa ficou assim
alinhada desde a primeira hora, hoje consolidada através da presença
das suas marcas em mais de 125 mercados nos cinco continentes.
Não admira pois que, no cumprimento desta estratégia, se tenha tornado
natural, a partir do final dos anos 90, que a Sogrape entrasse no
sector produtivo de outras latitudes com elevado potencial vitícola -
Argentina, Chile e Nova Zelândia -, complementando desta forma o
investimento que a empresa também tem vindo a efetuar na área da
distribuição e reforçando assim a sua posição no mercado global.
Esta exportação do seu processo produtivo para o novo mundo fez-se
através de aquisições de unidades que têm em comum a verticalização da
sua atividade (desde a vinha, à vinificação, engarrafamento e
comercialização dos seus vinhos), permitindo à Sogrape ganhos
importantes em termos de controlo do seu processo e um mais correto
posicionamento como empresa global do sector vitivinícola
internacional.
No caso concreto da Nova Zelândia, a geografia onde regista os mais
elevados índices de crescimento e rentabilidade, pelo elevado preço de
exportação dos seus vinhos, a aquisição em 2008 da Framingham -
empresa-boutique responsável pela produção de vinhos na famosa região
de Marlborough - tem-se revelado de primordial importância para a
Sogrape ganhar prestígio e uma crescente notoriedade de todo o seu
portefólio nos mercados de maior sucesso no panorama internacional.
Além disso, a Framingham abriu à Sogrape a possibilidade de produzir
vinhos diferentes, com castas frescas e frutadas de climas temperados,
tais como as brancas Sauvignon Blanc e Riesling, e a tinta Pinot Noir,
acrescendo ganhos significativos de know how ao nível da viticultura,
e da viticultura orgânica em particular, muito desenvolvida nesta
geografia.
A adaptação da Sogrape à Nova Zelândia e à sua cultura foi
particularmente fácil, graças à calorosa hospitalidade e informalidade
do seu povo - os kiwis - e à grande racionalidade que revela para
congregar esforços e investimentos em busca dos melhores resultados.
(Em Marlborough, por exemplo, é comum várias empresas partilharem
adegas e quase todos os produtores contratam o serviço de
engarrafamento a duas unidades da região...)
Hoje, quatro anos volvidos, podemos dizer que a Framingham, fruto do
trabalho, do investimento e do intercâmbio de conhecimentos, é uma
aposta ganha, com a distribuição a crescer de seis para 40 mercados e
a empresa a duplicar o valor das vendas sem alterar o seu
posicionamento.
Não será por acaso, aliás, que o vinho Framingham F-Series Riesling
Auslese 2011, produzido na Nova Zelândia pela Sogrape, acaba de ser
eleito o melhor vinho desta casta numa prova cega dos maiores
especialistas mundiais, ou ser ainda considerado, pela prestigiada
jornalista britânica Jancis Robinson, o melhor vinho da região de
Marlborough que alguma vez provou...
Salvador Guedes, presidente da Sogrape
http://expresso.sapo.pt/nova-zelandia-uma-agricultura-sem-subsidios=f713851#ixzz1q3ZV37YK

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