sexta-feira, 6 de abril de 2012

Inovação na Agricultura

OPINIÃO


Ilídio Martins


No âmbito das jornadas técnicas promovidas pela FENAREG sob o tema
Inovação no Regadio, realizadas nos dias 27 e 28 de Março, no litoral
alentejano, foram tiradas diversas conclusões.

Actualmente o sector agrícola vive num contexto mundial de quase total
liberalização comercial e de concorrência global, tornando-se
imperioso inovar para poder competir. Mais do que nunca, há que ter em
conta as necessidades do consumidor, produzindo de acordo com elevados
padrões de segurança alimentar, atendendo aos condicionalismos
ambientais e de acordo com padrões sociais exigentes. O desafio é
gigantesco, se atendermos que em inúmeros países emergentes que fazem
concorrência com a agricultura da UE, não se leva em conta qualquer
aspecto ambiental ou social, produzindo de forma desregrada e com
estruturas de custos substancialmente inferiores.

É nesta conjuntura difícil, desfavorável para a economia e em
particular para o sector agrícola, que devemos, mais do que nunca,
encarar a inovação como factor crucial para emergir nesta competição
global. A história diz-nos que é nos momentos difíceis, nas
depressões, nas crises, que surgem as melhores ideias, as melhores
soluções, em que nasceram grandes empresas que hoje são referências
mundiais. Até se costuma dizer que a necessidade faz o engenho…

No sector agrícola a oportunidade actual está claramente numa
agricultura que consiga produzir em quantidade, com qualidade, de uma
forma eficiente, com objectivos centrados na segurança alimentar e
tendo em conta as necessidades do consumidor. Essa agricultura deverá
passar pelo regadio, uma vez que, no nosso clima mediterrânico, a
irregularidade e imprevisibilidade da pluviosidade obriga
necessariamente a regar para garantir o sucesso das produções
agrícolas. Numa agricultura competitiva, ter água de qualidade e saber
utiliza-la no momento e quantidade adequada, é claramente um factor
chave do sucesso das produções agrícolas.

Nas cinco exemplos de explorações agrícolas analisadas -
AtlanticGrowers/Hortas do Mira, Camposol, Frupor, Vitacress,
Driscolis, Lusomorango - todas destacaram como fundamentais para o seu
sucesso os aspectos climáticos favoráveis, as suas ligações
empresariais ao mercado e a garantia da existência de água,
disponibilizada pelo Aproveitamento Hidroagrícola do Mira. Estas
empresas têm conseguido aliar os factores naturais do litoral
alentejano, utilizando os recursos endógenos entre eles a água, de uma
forma inovadora, recorrendo á mais avançada tecnologia mundial, para
produzir os alimentos, as ornamentais, as aromáticas, ou outros
produtos agrícolas que são exigidos pelos mercados consumidores.

Em que sentido se poderá inovar na agricultura? Basicamente tem-se
inovado de três formas: inovar na redução de custos; inovar produzindo
mais; inovar produzindo diferente.

Claramente tem sido mais "fácil" inovar na primeira, quer através da
redução e racionalização dos inputs, quer pela mecanização, quer pela
eficiência. Se considerarmos os elevados custos do combustível, da
electricidade, dos fertilizantes, fitofarmacos e sementes, produzir
alimentos na Europa só é possível porque existe uma elevada eficiência
na mecanização, na racionalização dos meios e na organização do
trabalho. Ao nível do aumento produtivo também se tem inovado,
sobretudos através da evolução e melhoramento genético, das quais
resultam melhores sementes, da alteração qualitativa das técnicas de
regadio e fertirrigação, a que não será alheio também uma melhoria do
planeamento, bem como na utilização de ferramentas tecnológicas.
Inovar produzindo diferente tem sido claramente mais difícil. Neste
caso há que dominar e estar atento ao mercado e aos consumidores. Mais
do que nunca as oportunidades produtivas passam pela capacidade de
sentir as necessidades objectivas do mercado, sabendo antecipar as
suas expectativas de consumo. Não é demais repetir o que inúmeros
técnicos já identificaram: um dos principais problemas da nossa
agricultura é a organização da produção e do escoamento, levando até
ao consumidor os seus produtos. Apenas acrescentaria que hoje em dia
não basta, porque vamos com um atraso de anos numa corrida desigual.
Mais que organizar há que pensar em inovar.

É isso que se está a fazer nas empresas que visitámos no litoral
alentejano. Não se produz mais alfaces para abastecer um mercado
inundado de alfaces, dizendo apenas que as nossas são melhores. O que
se faz é um produto único, diferente, melhor: as saladas embaladas,
prontas a usar, com uma variedade e qualidade que antes seria
impensável. Este é apenas um exemplo para ilustrar esta perspectiva.

Podem estes exemplos replicar-se na nossa agricultura? Até certo ponto
sim, mas há que atender que a massificação produtiva com inovação
parcial pode ser perigosa. Veja-se o caso do olival no Alentejo: em
três ou quatro anos aumentou-se extraordinariamente a área de olival,
com as mais modernas tecnologias e com novas técnicas produtivas, com
clara inovação ao nível do aumento produtivo e na redução unitária de
custos. No entanto, não se tem inovado ao nível do consumo, pelo que
todos concorrem com o mesmo produto, limitam-se a mudar os rótulos ou
embalagens, confundindo os consumidores com inúmeras designações e
classificações, levando a que sucessivamente tenha vindo a baixar o
preço do produto. Aparentemente este aumento extraordinário de área e
produção não foi planeado ao nível do mercado, sendo claro que há que
inovar na ligação da produção ao mercado e aos consumidores, para
valorizar o produto.

Uma solução inovadora no sector agrícola necessita necessariamente de
escala para poder ser competitiva, mas não poderá ter uma escala tão
grande que ultrapasse as necessidades do mercado, correndo nesse caso
o risco de anular a sua rentabilidade. A área de couve chinesa ou
plantas aromáticas que se produz no litoral alentejano não poderá ser
aumentada até a um nível acima da capacidade de consumo do seu mercado
específico. O que há que procurar é respostas inovadoras para as novas
necessidades e expectativas dos consumidores.

A FENAREG com estas jornadas pretendeu alertar para estes casos de
sucesso e para a necessidade de reflectirmos sobre a nossa
agricultura. Somos claramente defensores do regadio e da boa
utilização da água, sendo este um dos factores de produção
fundamentais. Saber regar é importante, mas a agricultura de hoje é
muito mais do que é isso, é tecnologia é inovação.

30 de Março de 2012

Ilídio Martins,
Vice-Presidente da FENAREG - Federação Nacional de Regantes de
Portugal, em representação da Associação de Regantes e Beneficiários
de Campilhas e Alto Sado (ARBCAS)

http://www.agroportal.pt/a/2012/ilmartins.htm

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