sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Governo, também na questão dos incêndios, pretende "sacudir a água do capote"

Não nos admiremos do horror a que assistimos depois de anos a fio a
implementar erradas políticas, nacionais e comunitárias, para gaudio
de alguns e benefício de outros. Politicas que premiaram o ostensivo
abandono da agricultura e do mundo rural, pagando inclusivamente aos
agricultores para abandonarem as suas terras e deixarem de produzir.
Admiram-se alguns com a progressão dos incêndios em número e área com
o seu cortejo de consequências, elegendo como bode expiatório a
negligência humana e uns tantos pirómanos espalhados pelo País. Esta é
uma visão redutora de uma leitura indubitavelmente mais profunda e
mais complexa, a desertificação do interior.

Os grandes incêndios nas zonas rurais reflectem inequivocamente o
falhanço das políticas nacionais e comunitárias e o esquecimento a que
foi votada esta extensa área de território. Não é possível implementar
políticas de desenvolvimento sem pessoas. O abandono intencional da
pequena e média agricultura, as políticas de extinção de serviços
públicos no mundo rural e o fim das campanhas de sensibilização junto
das populações prevenindo comportamentos de risco só pode conduzir a
uma selva sem serventia de qualquer tipo, perdendo-se a oportunidade
de obter rendimento desejável a todos os níveis.

Os Governos ao longo dos últimos anos têm gasto" rios de dinheiro" na
área de planeamento florestal. São Planos Nacionais, Planos
Sectoriais, PROFs, PROTs, PDDFCIs, PMDFCIs, PGFs, PUBs, apenas alguns
dos muitos papéis que enfeitam prateleiras. Se toda a gente ficou a
fazer Planos quem ficou no terreno para os implementar e testar?! Quem
os implementa, coordena e fiscaliza na prática? E o papel do Estado?
Antes com uma fortíssima presença personificada pelos Serviços
Florestais! Técnicos, mestres, guardas florestais, operadores e as
suas brigadas próprias de sapadores constituídas muitas vezes por
gentes locais. Hoje reduzidos a nada.

Atribui-se às comunidades baldias a falta de investimento na Floresta.
No entanto o Estado vedou a sua possibilidade ao não aprovar ou
elaborar PGFs e PUBs nas áreas da sua competência mantendo
desactualizados e sem qualquer tipo de utilidade todos aqueles que a
conta gotas foram entretanto aprovados, colocando em risco milhares e
milhares de hectares de floresta.

Foram sempre adiadas as propostas encontradas pelas comunidades
baldias para fazer frente ao sentimento de abandono pelo Estado,
nomeadamente a criação de Grupos de Baldios, associando unidades de
baldios para melhor responder aos emergentes problemas na prevenção,
gestão e comercialização de madeira.

Apesar de ser público o défice de brigadas de sapadores florestais, e
o seu reconhecido valor nas área da prevenção, vigilância e primeira
intervenção, os Governos paradoxalmente não têm aceite as propostas de
dezenas de comunidades baldias que se disponibilizaram para custear a
sua constituição e funcionamento. A integração das brigadas GAUF e dos
Sapadores Florestais, recuperando os postos de vigia e acrescentando
mais alguns meios locais garantiria um dispositivo que traria
certamente vantagens de conhecimento de terreno assaz, importante
para, em colaboração com os bombeiros, trazer mais eficiência ao
combate aos incêndios.

E com que tipo de financiamento tem sido contemplado as nossas
florestas? Concebe-se um PRODER florestal altamente burocratizado e
desadequando às tipologias da floresta Portuguesa, com percentagens de
execução ridículas levando a que verbas alocadas inicialmente acabem
por ser transferidas para outros sectores. Temos ainda o Fundo
Florestal Permanente para o qual descontamos todos os dias quando
abastecemos os nossos veículos e cujos investimentos estão vedados há
pelo menos dois anos.

Desde logo é necessário garantir preços justos para a madeira dos
produtores, que sejam compensadores dos investimentos que são exigidos
e que são a primeira linha da prevenção dos incêndios (desmatações,
abertura de caminhos, etc), sendo também necessário questionar a razão
da importação de milhões de toneladas de madeira, deixando à mercê do
fogo a madeira das nossas florestas.

O mundo rural vive hoje um sentimento de impotência e de raiva. São
homens e mulheres esquecidos pelo poder político a quem o fogo levou
os poucos haveres que restavam de toda uma vida de trabalho e
canseira.

Será que no final de toda esta tragédia nos restarão árvores
suficientes para fazer folhas para tantos Planos de Ordenamento como
os que temos?! Ou para fazer armários onde estes ficam tão bem
armazenados? Ou para fazer as cadeiras onde os governantes
responsáveis assistem sentados?

Não obstante esta negligência grave o Estado prepara-se para mais uma
ofensiva contra a propriedade comunitária e o meio rural, os compartes
e a própria Constituição da República Portuguesa, ao pretender alterar
a actual Lei dos Baldios. A floresta não pode ser como infelizmente
tem sido nas últimas décadas local de incêndios, destruição, mortes,
desassossego e avultados prejuízos.

Adensar a tudo isto criam-se reformas administrativas sem ter em conta
a sensibilidade e o pensamento das populações criando animosidades
territoriais desnecessárias.

Perante o estado de emergência provocado por esta tragédia, a BALADI
reclama do Governo um imediato levantamento por parte do Ministério da
Agricultura dos prejuízos havidos aos produtores florestais e
agricultores para que possam ser atribuídas as respectivas
indemnizações.

A BALADI considera ainda lamentáveis as afirmações que têm vindo a
Publico por parte do senhor Secretário de Estado. Tais declarações são
uma afronta ao desespero vivido pelas populações rurais e baldias ao
manifestar desconhecer onde e quando as florestas da sua
responsabilidade são mal geridas.

As comunidades baldias estão cansadas de serem bode de expiatório
exigindo uma alteração de comportamentos e atitudes por parte do
Governo e um claro apuramento de responsabilidades.

A BALADI aproveita ainda para endossar aos familiares dos bombeiros
falecidos as suas mais sentidas condolências, enaltecendo o seu papel
de sacrifício e abnegação na defesa dos bens e vidas de todos nós.

Vila Real, 2 de Setembro de 2013

A Direcção da BALADI

http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2013/09/04b.htm

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