5 de Maio, 2011
As dívidas têm-se acumulado nas clínicas dos médicos veterinários, com
profissionais e clientes a optar por pagamentos a prestações,
adiamento dos tratamentos ou pela eutanásia dos animais.
A bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários (OMV), Laurentina
Pedroso, confirma à Lusa a «dificuldade» nos pagamentos.
A situação é justificada com as «dificuldades económicas por parte das
famílias face à crise que o país vive» e que «devem ser seguidos pelos
advogados dos clínicos».
Uma veterinária, que optou pelo anonimato, trabalha em dois locais do
grande Porto e há já mais de «quatro anos» que regista dificuldades:
«Primeiro [os clientes] começaram a questionar a necessidade de
serviços comuns e de profilaxia [desparasitações, suplementos
alimentares]».
Depois passaram a falhar vacinações, incluindo as legalmente
obrigatórias, e a pedirem para atrasar pagamentos, o que evoluiu para
solicitações de prestações, relata.
A médica veterinária recebeu durante três anos prestações de cinco
euros mensais pelo tratamento de uma cadela, que necessitou mais tarde
de uma cirurgia.
«A cadela apareceu uma semana mais tarde com uma infecção de pele
porque lhe andaram a queimar nódulos com pontas de cigarros e cinzas
quentes», conta.
«As pessoas não têm medo das consequências do não pagamento, sabem que
não vão ser obrigadas a pagar» e «guardam para a última os tratamentos
ou mesmo deixam morrer» os animais, notou.
A médica assegura que quem recusa pagar 20 euros por uma consulta, dá
depois «25 euros [deslocação a casa] mais 30 euros [eutanásia] mais 30
euros [retenção e eliminação de cadáver]».
Várias são as técnicas para evitar as consultas: descrição dos
sintomas pelo telefone, deslocações à clínica para mostrar fotos do
animal, além de animais «atirados» para dentro do local, «embrulhados
em sacos de plástico e amarrados à porta».
Pessoalmente, a médica assumiu despesas de «dezenas de tratamentos».
«Antes fazia mais, mas as dificuldades económicas chegam a todos. Luto
para manter a porta aberta», desabafa.
Luís Silva preferiu emigrar há cinco anos para o Reino Unido e crê que
os problemas que o fizeram decidir nessa altura tornaram-se «apenas
mais evidentes» com a crise.
«Os veterinários mais novos ou andam desempregados, ou a fazer horas
em várias clínicas ou a fazer substituições a colegas» e mesmo em
empregos definitivos «ganham menos de 1000 euros», relata quem
preferiu deixar «família, amigos».
«E a terra que me viu nascer para poder exercer a minha profissão e
ser recompensado devidamente por isso», acrescenta.
Em Belas, Sintra, Ana Marques tem a «nítida impressão» de estar a
trabalhar para «todos - contabilista, medicina no trabalho, câmaras
municipais, Estado, distribuidores», menos para si.
«É um trabalho duro, mal pago e exigente em termos físicos e mentais»,
resume a médica veterinária que faz eco da «sensação» de que as
pessoas evitam levar os seus animais às consultas ou só o fazem em
último recurso.
«Facilito o pagamento em duas ou três vezes. Mesmo assim ainda há quem
não queira», conta a veterinária.
Marta Delgado Rodrigues, tem uma clínica em Lisboa, e viveu há pouco
tempo um calote de um homem, com «mais de 60 anos», que já tinha
ficado a dever dinheiro em pelo menos mais dois locais.
A médica aconselhou a eutanásia, mas foi recusado e depois da
medicação e de um exame, o homem disse que levaria o animal no dia
seguinte para «fechar as contas» e continua sem receber.
A revolta é resumida numa frase: «Se o encontrar qualquer dia abro o
telejornal».
Lusa/SOL
http://sol.sapo.pt/inicio/Sociedade/Interior.aspx?content_id=18423
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