quarta-feira, 2 de outubro de 2013

A indústria papeleira e a gestão de resíduos industriais

Durante o passado período estival foi dado enfase, por comentadores
generalistas, às "virtudes" da gestão florestal das empresas de
celulose, em particular da Portucel.

O Decreto-lei n.º 276/2009, de 2 de outubro, estabelece o regime de
utilização de lamas de depuração em solos agrícolas, transpondo para a
ordem jurídica interna a Diretiva n.º 86/27/CEE, do Conselho, de 12 de
junho, de forma a evitar efeitos nocivos para o homem, para a água,
para os solos, para a vegetação e para os ani/mais, promovendo a sua
correta utilização. Este diploma veio revogar o Decreto-Lei n.º
118/2006, de 21 de junho.

A indústria de pasta e papel, no decurso da sua atividade, é
responsável pela produção de uma grande quantidade de resíduos
(estimados em cerca de 48 toneladas por cada 100 toneladas de pasta
produzida), quer inorgânicos (cinzas, dregs e grits), quer orgânicos
(lamas) e ainda outros subprodutos. A deposição em aterro sanitário ou
a sua incineração constituem os métodos mais utilizados de tratamento
destes resíduos, muito embora apresentem elevados custos
socioeconómicos e ambientais.

A valorização agronómica de lamas celulósicas surge como um método
alternativo de escoamento destes resíduos industriais. Todavia, a
aplicação destas lamas em solos agroflorestais só deve ser efetuada
após um estudo pormenorizado da sua qualidade e quantidade e depois de
uma adequada caracterização da área destinada à sua aplicação. O
diploma legal que regula a utilização destas lamas assim o impõe,
designadamente pela obrigatoriedade de realização de análises
frequentes quer às lamas (ou mistura de lamas), quer aos solos e à
água dos locais onde estas vão ser espalhadas e incorporadas.

A legislação aplicável impõe limites máximos às concentrações nestas
lamas quer de metais pesados, quer de compostos orgânicos e dioxinas,
e de micro-organismos.

A legislação determina ainda os casos de proibição de aplicação destas
lamas, entre outros, injetar lamas nos solos sem valorização
agronómica, enterrar lamas nos solos (que não em aterro), aplicar nas
proximidades de linhas de água e sua captação, ou em situações
climatéricas adversas (entre novembro e janeiro, salvo justificação).

As lamas celulósicas devem ser espalhadas e incorporadas nos solos no
prazo de 48 horas, utilizando para o efeito uma alfaia apropriada, no
sentido de garantir, no mínimo, uma mobilização superficial do solo.

O produtor das lamas, mesmo que a sua valorização agronómica ocorra em
terrenos de terceiros, será sempre corresponsável por eventuais
efeitos nocivos da sua aplicação nos solos ou em qualquer outro lugar.

Com um crescimento anual estimado em 25% para o setor papeleiro, a
produção de lamas é projetada para um aumento entre 48 e 86%.

Espalhamento de lamas celulósicas em eucaliptal, nas linhas e sem incorporação

Desta forma, surgem sérias preocupações quanto ao cumprimento dos
requisitos legais à aplicação de lamas em solos florestais, em
especial no que respeita aos normativos para uma gestão florestal
sustentável, sendo que a Portucel dispõe de cerca de 122 mil hectares
de floresta certificada.

Ou seja, até que ponto um procedimento de fertilização orgânica de
solos agroflorestais não está condicionado pela crescente necessidade
de escoamento de resíduos industriais, com os correspondentes efeitos
nocivos sobretudo para as populações e habitats rurais? Poderá ser
dada como garantida a "virtuosidade" da gestão florestal certificada
nas áreas geridas pela Portucel? Pela Acréscimo, foi já sugerida a
abertura destas áreas florestais à visitação pelos interessados.

Lisboa, 1 de outubro de 2013

A Direção da Acréscimo

http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2013/10/02.htm

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