sexta-feira, 25 de abril de 2014

Ilha Verde. A independência alimentar de Cabo Verde chega do Paraguai

O país comprou um terreno de 10 mil hectares para plantar alimentos. Projecto é de 1976
É conhecida como Ilha Verde e já considerada por muitos a 11.a ilha de Cabo Verde. No fundo é um terreno com cerca de 10 mil hectares no Paraguai e que começa a dar os primeiros frutos, com os cereais ali plantados a chegarem já ao arquipélago. A produção agrícola de grandes escala pretende dar independência alimentar a Cabo Verde dentro de dois anos, garante o mentor do projecto, Adriano Bettencourt Pinto.

A ideia foi lançada em 1976, quando este agrónomo realizou um estudo que lhe permitiu tirar a "triste conclusão" de que Cabo Verde jamais teria capacidade de alimentar toda a sua população sem recorrer à importação. Não conformado, Adriano Bettencourt Pinto decidiu que o melhor seria apostar na produção além-fronteiras: "Cabo Verde deve fazer um controlo independente dos alimentos e não se deixar ficar nas mãos de quem vem de fora", declara.

Adriano Bettencourt Pinto diz ter ficado encantado com a qualidade das terras no Paraguai e, com a certeza de que tinha os recursos suficientes, decidiu centrar-se no objectivo de tornar Cabo Verde sustentável a nível alimentar: "Nós, os agrónomos, somos conhecidos no meio como o pardal, aquela ave que só gosta de cidade. Mas eu parti, entrei na mata e em 1979 comecei os estudos no terreno", confessa. Foram seis anos a morar numa tenda, apesar de Adriano confirmar que de "tempo efectivo devem ter sido uns quatro", pois regressava a Cabo Verde com regularidade. A vila mais próxima ficava a 33 quilómetros de distância, a maioria das vezes percorridos a pé: "Enquanto estudava as potencialidades do terreno escrevia o meu estudo numa máquina de escrever velhinha, a Olympia, lá no meio da selva." Em 1986, o governo cabo-verdiano comprou 80% do terreno no Paraguai, tendo Adriano ficado com 20%. "O terreno custou um milhão e 129 mil dólares e a minha parte foi avaliada em 375 mil", recorda Adriano. Foi comprado a um proprietário privado que aceitou a proposta, após ter ficado sensibilizado com toda a informação que o agrónomo lhe transmitia sobre o seu país. Com a privatização da Empresa Nacional de Abastecimento (EMPA) e com as indecisões políticas da época, a "Ilha Verde" tornou-se uma empresa privada, que o agrónomo integra, com o intuito de acelerar o projecto, porque "o Estado não tem pressa", lamenta. No entanto, o projecto continua a ter apoio político em Cabo Verde.

Os 10 mil hectares são ocupados maioritariamente por arroz, milho, trigo e soja, que para além de abastecerem Cabo Verde poderão ainda ser exportados, pois a produtividade da Ilha Verde poderá ultrapassar as necessidades de abastecimento alimentar do arquipélago, permitindo ao país entrar no mercado internacional a um preço competitivo. "Porquê comprar se podemos produzir? Este projecto irá contribuir para o desenvolvimento socioeconómico do país", garante Adriano. E os resultados já são visíveis: em Novembro de 2013, as primeiras 15 toneladas de cereais chegaram ao Porto de Praia, na ilha de Santiago. "A solução dos problemas tem de partir de dentro do país. Eu sou cabo-verdiano, amo o meu país e tenho de trabalhar para ele. A segurança alimentar para o país é quase uma obsessão e é necessário muita determinação para a alcançar", diz. "Eu conheço dois tipos de homem: o homem 8 e o homem 24. O homem oito é aquele que trabalha oito horas por dia, o homem 24 é aquele que está o dia todo a pensar no seu projecto, e é esse que faz a diferença."

Num período de quatro anos, o mentor do projecto acredita que possam ser criados 5 mil novos postos de trabalho em Cabo Verde, directa e indirectamente, através de vários projectos que surgirão em resultado dos frutos da Ilha Verde.

Esta reportagem só foi possível graças ao programa de formação jornalística Beyond Your World


Sem comentários:

Enviar um comentário