quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Portugal: florestas com sustentabilidade duvidosa

ACRÉSCIMO

Associação de Promoção ao Investimento Florestal



Já em finais de 1996, um estudo independente, desenvolvido sob
coordenação da Jaakko Pöyry, diagnosticava graves insuficiências do
setor primário florestal em Portugal, vítima simultaneamente do
insuficiente aproveitamento do seu potencial e de uma crescente
pressão no abastecimento ao setor industrial, agravada ultimamente
pela crescente procura da madeira e da biomassa para fins energéticos.

O crescente agravamento desta situação de subaproveitamento e de
sobre-exploração dos espaços florestais, condiciona uma utilização
racional e sustentável dos recursos florestais portugueses, o que pode
aportar fortes impactos negativos às futuras gerações. Portugal
exporta grande parte dos bens produzidos a partir de recursos
florestais, essencialmente para Estados-Membros da União Europeia, com
destaque para Espanha, França e Alemanha.


O desajuste entre a oferta e a procura foi, em 2011, objeto de
denúncia pública pelo mais alto responsável da Autoridade Florestal
Nacional, ao pressupor uma situação de rutura de material lenhoso em
menos de 15 anos. Para fazer face à insuficiência de recursos, o País
importa atualmente cerca de 2 milhões de metros cúbicos de material
lenhoso, alguns deles a merecer a preocupação da WWF quanto à sua
proveniência.

Perante o constante agravamento da situação face a 1996, o atual
governo evidenciou recentemente uma aposta avulsa na florestação, em
particular em monoculturas com espécies exóticas de rápido
crescimento, no caso concreto no eucalipto. Contudo, especialistas
nacionais, investigadores e universitários, revelam que, segundo dados
dos últimos inventários florestais, se tem verificado o aumento de
situações de deficiente ou, mesmo, de ausência de gestão florestal nas
duas principais espécies florestais portuguesas, o pinheiro bravo
(Pinus pinaster) e o eucalipto (Eucalyptus globulus). No caso do
eucalipto, os dados recolhidos podem mesmo significar um aumento
acentuado de eucaliptais abandonados entre 1992 e 2005.

Segundo os especialistas, o aumento da possibilidade de material
lenhoso proveniente de pinheiro bravo e de eucalipto para o
abastecimento das indústrias transformadoras passará, não tanto pelo
aumento das suas áreas de ocupação, como se verificou no início do
século passado e parece ser a opção do atual Governo, mas,
fundamentalmente, pela promoção da gestão ativa dos espaços
florestais, com o intuito de obter maiores produtividades por área.
Essa prioridade é fundamentada no facto de se manterem inalterados,
desde 1928, os valores relativos às produtividades, de 5 e 10 metros
cúbicos anuais por hectare, respetivamente para o pinheiro bravo e
para o eucalipto.

A ausência de uma gestão ativa, em parte significativa da área
florestal portuguesa, está na origem de uma mais fácil propagação dos
incêndios florestais em Portugal, bem como numa mais favorável
propagação de pragas e de doenças. A este facto não está alheia a
crescente concentração industrial e a falta de concorrência nas três
principais fileiras florestais, tanto na do eucalipto, como na do
pinheiro bravo, mas também na do sobreiro (Quercus suber). Cada uma
destas fileiras é dominada por um grupo empresarial específico.
Atualmente, as autoridades abstêm-se de um acompanhamento das relações
comerciais nas várias fileiras silvo-industriais, deixando
agricultores e proprietários florestais (detentores de cerca de 90% da
área florestal em Portugal) á mercê de grandes monopólios industriais.

O País tem sido objeto, desde 1989, do apoio de fundos comunitários
para as florestas. Contudo, aqui têm-se evidenciado resultados
práticos desconcertantes e taxas de realização que ficam sempre aquém
das expectativas, ou são mesmo irrisórias, como as evidenciadas no
atual período (2007/2013). Aqui, estratégias errantes, designadamente
com apostas prioritárias em novas florestações, sem assegurar a
subsequente gestão florestal ou o ajustamento aos mercados, têm
proporcionado situações de grande preocupação. No caso mais grave do
pinheiro bravo, foram já consumidos (1989/2005), só para novas
florestações, centenas de milhões de euros. Contudo, embora fosse
expectável que o esforço dos contribuintes nacionais e europeus
gerasse, através da atribuição de subsídios não reembolsáveis,
milhares de novos hectares de pinheiro bravo, na realidade
constatou-se, neste período de tempo, um recuo na área desta espécie
em cerca de 400 mil hectares. Paralelamente, no período de 1989 a
2005, tem crescido o impacto negativo dos incêndios florestais em
Portugal. Estará o dinheiro dos contribuintes a promover a "indústria"
dos incêndios florestais?

Não é por falta de documentos estratégicos que os problemas persistem.
Atualmente, anuncia-se mais um. Portugal tem sido pródigo na produção
de planos estratégicos para as florestas, entre eles o Plano de
Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa (PDSFP), de 1997,
ou mais recentemente a Estratégia Nacional para as Florestas (ENF), de
2007. Todos tiveram consequências práticas irrelevantes para a
resolução dos problemas de deficiência de gestão, do subaproveitamento
e da sobre-exploração, bem como nas suas consequência, os incêndios,
as pragas e as doenças.

Portugal tem, apesar da fraca relevância política das florestas no
País, um forte potencial florestal, com produtividades potenciais
ímpares na Europa. Dispõe de 1,5 a 2 milhões de hectares de solos
incultos, com favorável aptidão florestal. Os espaços silvestres
portugueses dispõem ainda de uma elevada biodiversidade, favorável a
sistemas florestais multifuncionais, menos dependentes de períodos
negativos dos ciclos comerciais. Existe contudo a necessidade, e
vontade política, para uma mudança de paradigma. O País necessita de
uma aposta clara na gestão ativa, e necessariamente sustentável dos
seus recursos naturais, no caso específico, convenientemente dirigida
e centrada nas centenas de milhares de detentoras dos espaços de
aptidão florestal existentes em Portugal, os quais têm de ver
salvaguardas as suas expectativas económicas, para poderem desenvolver
a sua atividade silvícola, proporcionando mais valias sociais, com
especial enfoque em meio rural, e ambientais, na conservação dos
solos, dos recursos hídricos, da fauna, da flora e no sequestro de
carbono. Esta é a estratégia de investimento defendida pela Acréscimo.

Lisboa, 8 de agosto de 2012

A Direção da Acréscimo

http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2012/08/08a.htm

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