23.04.2011
Helena Geraldes
Há em Portugal cerca de dois milhões de espécimes de animais e
plantas, recolhidos ao longo dos últimos 200 anos, que estão prestes a
"sair do armário" pela mão de cinco instituições de investigação que
se decidiram juntar para salvar este espólio, através da criação de um
consórcio.
"Não podíamos continuar a ver perder este património inestimável e
irrecuperável", diz Paulo Gama Mota, director do Museu da Ciência da
Universidade de Coimbra. Aves, besouros, plantas e borboletas fazem
parte de um verdadeiro reservatório de vida que sobreviveu a viagens
oceânicas, convulsões políticas, incêndios. Hoje, estes bocadinhos de
vida estão dispersos por caixas e armários de museus.
"Algumas colecções estão muito bem cuidadas", mas a maioria "precisa
de medidas urgentes", admite Paulo Gama Mota, o porta-voz do Consórcio
Nacional para a Preservação e Uso em Investigação das Colecções de
História Natural, constituído em Dezembro. Esta semana reuniu-se pela
primeira vez. "Houve um grande consenso em relação ao que queremos
fazer", disse ao PÚBLICO, referindo-se ao encontro dos representantes
do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra, Museu Nacional de
História Natural da Universidade de Lisboa, Museu de História Natural
da Universidade do Porto, Instituto de Investigação Científica
Tropical e Museu de História Natural do Funchal. Estas instituições
cuidam de entre 85 e 90 por cento do acervo nacional de História
Natural.
O trabalho do consórcio começará pela compilação do número exacto de
espécimes, pelos processos de adesão a organismos internacionais e por
acordos de cooperação com vários organismos.
"Queremos definir, em conjunto, as melhores formas de incorporação de
espécimes nas colecções, as melhores práticas de empréstimo e de
acesso a elas por investigadores nacionais e estrangeiros", adiantou.
A ideia é preservá-las e colocá-las ao serviço da Ciência. "O abandono
das colecções explica-se pela falta de interesse científico que
existia no passado", explicou. Mas o cenário está a mudar. "Os
exemplares recolhidos há muito tempo ganharam hoje um novo valor,
graças às técnicas de biologia molecular" que permitem recolher outros
tipos de informação.
O especialista lembrou que estas colecções podem ajudar à reintrodução
de espécies como o lince ou o esturjão e são cruciais para comparar a
biodiversidade actual com a que existia há cerca de 200. "O potencial
é enorme", notou. "Por exemplo, nos Estados Unidos, os cientistas
recorrem a espécimes de insectos para conseguir combater pragas na
agricultura e o desaparecimento das abelhas."
Viagens filosóficas ao Brasil, Angola e Moçambique
As colecções contam histórias da biodiversidade do planeta. Grande
parte dos espécimes que integram as colecções de História Natural do
país foi recolhida nos séculos XVIII e XIX nas chamadas viagens
filosóficas, especialmente ao Brasil, Angola e Moçambique.
Em Janeiro foi anunciada a descoberta de uma colecção "raríssima" de
peixes do Brasil do século XVIII, na Universidade de Coimbra. Estes 68
exemplares foram recolhidos pelo naturalista português Alexandre
Rodrigues Ferreira naquela que foi uma das maiores expedições
científicas portuguesas.
Paulo Gama Mota salientou a importância internacional do espólio. "As
colecções nacionais, separadas, são relativamente pequenas. Mas juntas
são muito significativas da biodiversidade não só portuguesa mas a
nível do planeta."
http://ecosfera.publico.pt/noticia.aspx?id=1491031
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