domingo, 3 de dezembro de 2017

Portugal terá de regrar uso da água


Antena 1
02 Dez, 2017, 10:56 / atualizado em 02 Dez, 2017, 11:01 | País

A forma de utilizar a água vai ser uma prioridade em Portugal e os sistemas de recuperação deste recurso terão de melhorar o seu desempenho, defende o presidente do Instituto do Mar e da Atmosfera, em entrevista à Agência Lusa.

O uso da água "vai ter de ser, em Portugal, uma prioridade. É verdade que existem áreas, em particular de hortofruticultura, muito 'tecnologizadas', mas esse procedimento tem de continuar e estender-se", afirmou o responsável do Instituto do Mar e da Atmosfera (IPMA), Miguel Miranda, em entrevista à agência Lusa.

"Não podemos usar água de forma desregrada em Portugal, tanto no que diz respeito à utilização humana, como à agrícola", respondeu o responsável pelo IPMA, quando questionado acerca da forma de Portugal se adaptar à nova tendência climática, com possível aumento da frequência de fenómenos extremos, como a seca.

A totalidade do território do continente está em situação de seca extrema ou severa e alguns concelhos enfrentam dificuldades no abastecimento de água, como é o caso do distrito de Viseu. 

"Os sistemas de recuperação de água vão ter de melhorar muito a sua 'performance'. Sei que existem planos de reutilizar a água que se pode extrair dos sistemas de tratamento de forma significativa", disse o responsável do IPMA.

Nas situações mais extremas de falta de chuva "até é possível que processos como a dessalinização tenham de ser encarados", apontou o presidente do IPMA.

Quanto à aposta nas barragens, com alguns a defenderem a criação de mais destas estruturas e o Governo a preferir aumentar a capacidade das existentes, o especialista em geofísica apontou que o país "tem muitas barragens, o problema de Portugal não é bem o de reter a água".

"É que as bacias hidrográficas que alimentam os nossos rios estão todas situadas na Península Ibérica, maioritariamente em Espanha, e a situação de seca em Espanha é pior que a situação de seca em Portugal", explicou.

O presidente do IPMA indicou que "vai haver também adaptações do coberto agrícola e florestal". 

Na agricultura, a tendência será optar por espécies menos consumidoras de água, na floresta o ordenamento que hoje "é uma prioridade vai continuar nas primeiras páginas dos jornais nos próximos anos", disse.
Melhorar a comunicação com os cidadãos

O presidente do IPMA defendeu a necessidade de ultrapassar a rigidez da atual forma de comunicar em casos de catástrofes e conseguir chegar rapidamente a todos os cidadãos, mesmo aqueles que estão mais isolados. 

"O circuito de informação é ainda muito rígido", das instituições nacionais na área da proteção civil para as instituições locais, e para responder a essa situação o IPMA tem principalmente desenvolvido os serviços 'online'.

"Praticamente toda a gente pode ter acesso direto aos nossos serviços de forma gratuita e simples, sem ter de passar necessariamente pela nossa página e já há muita gente a faze-lo", avançou.

No entanto, reconheceu as dificuldades em chegar a quem não tem acesso a estes serviços. 

"Não temos uma estratégia muito compreensível para chegar a essas pessoas", admitiu.

Em acontecimentos de desenvolvimento muito rápido, como uma catástrofe, é difícil gerir a situação e, "na verdade, ainda não temos meios muito simples de o fazer", ou seja, de chegar a toda a população, acrescentou, apontando como exemplo o conhecimento da localização de cada cidadão pelos consulados portugueses em países estrangeiros.

De acordo com o especialista, existe uma componente local, nos concelhos e freguesias, que também deverá ter um tratamento diferenciado, o que "tem sido discutido muitas vezes", sem ainda haver uma solução mais favorável.

"Para nós é claro que a informação tem de chegar muito depressa a quem está no terreno", insistiu.

Os cidadãos também não estão sensibilizados para os procedimentos a ter em caso de catástrofe.

Para a necessária alteração dos comportamentos, na opinião de Miguel Miranda, "as estruturas mais eficazes de atuação são as escolas" e deu o exemplo do Japão, país com experiência em lidar com desastres naturais.

"As comunidades, quer sejam escolares ou não escolares, vão ter de ser colocadas no sistema de uma forma mais ativa do que são neste momento, vão ter de compreender a informação mais depressa e saber o que fazer", disse. 

No caso de Portugal, para saber o que fazer há que "treinar na inexistência de catástrofe e isso vai um bocadinho contra a tradição cultural nacional", realçou o presidente do IPMA. "Somos aquele país em que, quando há um exercício de incêndio, as pessoas esperam que o barulho acabe".

Sempre houve mudanças do clima no sentido lato do termo, quando as mudanças são lentas, os povos conseguem adaptar-se migrando, e as práticas culturais são alteradas de forma contínua. 

"O que estamos a observar agora que é diferente é a mudança mais rápida que a sequência de gerações e a família é apanhada numa altura em que já está numa fase avançada da vida e que as condições ambientais que a cercam estão a ser rapidamente alteradas", descreveu. 

O responsável também referiu que, com as novas condições climatéricas, serão necessárias novas redes de transmissão de informação, de dados, que "sejam muito resilientes aos fenómenos meteorológicos e geofísicos extremos".

"Não podemos provavelmente gerir muito facilmente uma situação em que estamos muito dependentes da rede que arde, do cabo de eletricidade que cai e da pessoa que fica isolada e ninguém sabe onde está", alertou.

Por isso, a resiliência dos meios de transmissão de informação "vai ser também uma das questões muito discutidas nos próximos tempos, vai ser preciso assegurar que, mesmo na ocorrência de um incêndio de grandes proporções, a comunicação entre as pessoas é mantida".

(Com Lusa)

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