domingo, 6 de julho de 2014

O que esperar do Alqueva

26 Junho 2014, 00:01 por José Martino

O primeiro-ministro, Passos Coelho e a ministra da Agricultura, Assunção Cristas determinaram a conclusão das obras do projecto agrícola do Alqueva em 2015.
 
Tudo o que diz respeito ao Alqueva assume proporções gigantescas. Para um pequeno país como Portugal, tal gigantismo devia traduzir-se numa enorme atenção mediática eficaz sobre o que aí se passa.
 
Os mais de 2.500 milhões de euros de investimento público, os 120 mil hectares de regadio à disposição das explorações agrícolas e do sector agro-industrial, os milhares de agricultores, de empresas e de associações que vão passar a ter de mudar de vida com a "revolução" que aí vem, devido à passagem de uma cultura de sequeiro para uma cultura de regadio, o melhor aproveitamento das disponibilidades hídricas ao dispor da produção, não parecem estimular o foco mediático nem o escrutínio da opinião pública.
 
Estamos a falar de investimento público, dinheiro dos contribuintes, numa altura em que ele é escasso e disponibilizado a preço de ouro. Não vejo da parte de muitos responsáveis políticos, a necessária preocupação com o futuro do Alqueva, de quem lá vive, trabalha e tem os seus negócios.
 
Para quem não sabe ou anda distraído, estamos a falar do maior reservatório de água da Europa e de um dos maiores projectos hidroagrícolas a nível europeu. O que temos a fazer para aproveitar todos os recursos que vão ser disponibilizados deve ser feito já.
 
Tenho-me deslocado diversas vezes à região do Alentejo. Tenho falado com produtores, com agricultores, com associações, com empresas. À pergunta, "como maximizar o potencial produtivo" que resultará do projecto do Alqueva, tem encontrado respostas vagas e imprecisas, bem como verifico que há muito que poderia ser feito na implementação de culturas de regadio e infelizmente, não está a ser realizado.
 
É preciso investir em informação sobre a melhor estratégia para rapidamente se passar do sequeiro ao regadio, colocar no terreno as culturas e agro-indústria mais rentáveis, divulgando-a através de seminários, visitas de estudo, workshops, etc,. junto dos interessados, sejam eles pessoas individuais ou colectivas. É preciso definir o plano estratégico para o regadio do Alqueva. Espero que sejam canalizados 3% do orçamento global da obra, qualquer coisa como 75 milhões de euros, para estes planos, assim como para estudos e demais incorpóreo.
 
É preciso inverter a lógica política vigente que se baseia em dar dinheiro a todos. Temos de ser mais selectivos, e alocar os recursos em projectos que promovam as economias de escala.
 
O Alqueva é essencial para que o nosso PIB agrícola, hoje abaixo dos 4%, possa alcançar os 10% do PIB nacional. Por outro lado, é imperativo da independência económica de Portugal colocar a agricultura a gerar valor acrescentado.
 
Ouço muita gente a falar sobre o Alqueva como se o turismo fosse o remédio santo para ultrapassar a nossa crise. Nada de mais errado. O turismo é importante, mas a nossa economia não deixará de ser "arcaica", como recentemente disse um "guru" da economia mundial, se não investir na agricultura e na agro-indústria.
 
A nossa agricultura tem de ser olhada como um negócio e não como um "hobby". Os empresários agrícolas, com perfil e vocação para assumir riscos, adquirir competências, dar valor acrescentado ao "made in" Portugal para entrar em novos mercados de exportação, na Ásia, na América Latina, etc., devem ser apoiados.
 
Uma política agrícola de "nova geração" deve obedecer a uma estratégia de longo prazo, que torne mais eficaz o modelo de ajudas públicas ao investimento, valorize o perfil empresarial do agricultor e o valor acrescentado das actividades.
 
Engenheiro e Consultor Agrícola

1 comentário:

Anónimo disse...

Consideremos então que temos:
120.000 hectares para produzir em média 50.000 kg/ há;( 240.000 há corridos / ano);
2 safras durante o ano;
Suprimento diário de 1,5 kg de alimentos frescos por pessoa em duas ou três refeições/dia;
365 dias de alimentação por ano.
Com base nestes valores acima, podemos traçar a linha da produção possível e da quantidade de refeições distribuídas por ano, e daí estimar a população alimentada em cada ano.
Vejamos a equação básica:
240.000 hectares x 50.000 kg = produção anual = 12.000.000.000 kg que divididos por 365 dias
Resultam numa distribuição diária de 32.876.712 kg de alimentos frescos os quais supridos a cada comensal na quantidade de 1,5 kg/dia alimentam então 21.917.808 pessoas , ou seja , mais do que duas Nações do tamanho de Portugal.
A área útil para esta produção, á volta do Alqueva, com seus 120.000 hectares projetados, equivale a um quadrado com 34,641 km , repetindo, sem decimais, cerca de 35 quilómetros de lado. Isto para termos só em consideração números simples e compreensíveis.
Os significados desta equação podem ser muitos e diversos, como exemplo:
Se as contas foram bem feitas e os trabalhos melhor executados, um quadrado com 35 km de lado supre em dobro todos os alimentos frescos necessários á nação de 10 milhões de habitantes;
Se tal acontecesse, ninguém passaria fome, mas todos iriam á falência em virtude da economia de escala comandada por um staff e mão de obra equivalente a 360.000 trabalhadores agrícolas;
O próprio empreendimento teria sérias complicações para escoar comercialmente metade da produção;
O resto do território poderia ser paisagem; ( ironia)
********
Como temos um mercado muito grande na Europa, é obvio que o teríamos de incluir num planeamento básico.
Quem sabe estes absurdos aqui apresentados doem luz para o inicio de planeamentos necessários que valorizem o nosso clima, os nossos agricultores, os nossos técnicos, as nossas empresas que estão sendo viciadas por subsídios e submissão, para que não atrapalhem outras nações que não suportam o nosso poderio productivo.
Engº JS

Enviar um comentário