terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Clientes estrangeiros pressionam produtores de frutas e legumes a aumentar produção

Ana Rute Silva (em Berlim) 08/02/2015 - 12:24 

Portugal depende da importação de alimentos para se abastecer, mas para as empresas a prioridade é o comércio internacional. Em 2015, há quem tenha planos para quintuplicar a área agrícola.
 
Portugal continua a importar mais produtos hortícolas do que os que exporta NFACTOS/FERNANDO VELUDO 

Os produtores de frutas e legumes vão aumentar as áreas de produção em 2015 para responder aos pedidos de clientes estrangeiros. A expansão do terreno para cultivo chega, em alguns casos, a quintuplicar e há planos de investimento na produção de mirtilo, cebola, alhos ou uvas. Apesar de Portugal depender do estrangeiro para se abastecer de produtos agrícolas e alimentares, por esta altura, a prioridade das empresas é mesmo exportar.

 "Este ano queremos aumentar a organização de produtores em área. Neste momento temos 50 hectares e devemos chegar aos 250. O objectivo é ter 300 hectares de produção em 2016, já com novas variedades para responder às necessidades de exportação", diz Mário Rodrigues, director da Frutalmente, que junta nove produtores e factura 3,5 milhões de euros. Apenas 5% da produção é vendida ao estrangeiro (na maioria figo fresco) e a intenção é captar novos clientes. A Frutalmente está, por isso, a apostar em produtos que conseguem ser colhidos ao longo de todo o ano e variedades selecionadas apenas para exportar, como a uva red globe ou sem grainha.

Os planos do gigante norte-americano Driscoll's, maior produtor mundial de frutos vermelhos, também são ambiciosos. Tem uma estratégia de expansão para os próximos cinco anos que, nas palavras de Nuno Simões, responsável pelo negócio no Sul da Europa, "vai afirmar o país como uma das principais unidades de negócio". Cerca de um terço das framboesas produzidas em Espanha, Marrocos e Portugal vêm do território nacional e a intenção é fazer do país "uma das geografias mais relevantes também no mirtilo".

Assim, a multinacional americana  - que detém 25% da Lusomorango, uma organização de produtores de pequenos frutos - quer aumentar a área dedicada a este fruto dos actuais 30 hectares para 60 hectares. O valor do investimento varia, mas pode chegar aos 30 mil euros por hectare. Uma vez mais, a fruta abastece sobretudo o estrangeiro (Norte da Europa). A empresa factura 35 milhões de euros e contribuiu, segundo Nuno Simões, com 50 milhões de euros para as exportações nacionais, valor que inclui não só as vendas da Lusomorango, como as restantes parcerias que a multinacional tem em Portugal.


Outro gigante da agricultura, a Vitacress, tem planos para aumentar em 50% a área agrícola nas ervas aromáticas produzidas em estufa. Luís Mesquitas Dias, director-geral, sublinha que o investimento servirá para responder aos pedidos de clientes estrangeiros já que, em Portugal, o produto sem sido desvalorizado pelos consumidores, habituados a receber de graça salsa e coentros nos mercados tradicionais.

Também para Carlos Ferreira, responsável pela Hortomelão, o maior produtor de melões da Península Ibérica, 2015 será um ano de aumento de área agrícola, entre 5 a 6%. "É para responder a um pedido de um cliente. Temos contratos feitos", adiantou ao PÚBLICO, durante a Fruit Logistica. A organização, com 40 produtores e uma facturação de 13,5 milhões, exporta 30% do que produz, mas não quer "vender a toda a gente". "A ideia é crescer na exportação com novos clientes e mercados novos", sublinha.

Resta saber se os vários investimentos programados terão impacto no número de explorações que existem em Portugal e na área agrícola utilizada. Em 2013, havia 264.419 explorações, menos 4% em comparação com 2007. Já a superfície utilizada para produzir cresceu 5% no mesmo período para 3,6 milhões de hectares, segundo os dados publicados pela Pordata.

Dependência alimentar
Esta semana na Fruit Logistica, em Berlim, onde o mundo se abastece de fruta e legumes, as empresas portuguesas quiseram mostrar que já possuem capacidade de produção para responder aos pedidos de quantidade e qualidade. As atenções viram-se para fora de portas: os portugueses travaram a fundo nos gastos, mesmo em produtos alimentares, e os preços esmagados no retalho tornaram o negócio no mercado interno menos atractivo. Além disso, desta forma, diversifica-se o risco, ganha-se dimensão e há cada vez mais organizações a apostar na produção directa no estrangeiro, para conseguir vender frutas durante o ano inteiro.

Cá dentro, a realidade é outra. Nas prateleiras dos supermercados há produtos frescos de concorrentes europeus e, apesar dos esforços de comunicação e dos cartazes junto das bancas de legumes com a bandeira nacional, os portugueses continuam a queixar-se da abundância de fruta estrangeira.

Os dados disponíveis do INE para o ano completo de 2013 mostram que Portugal agravou a sua dependência alimentar. O saldo da balança comercial de produtos agrícolas e agro-alimentares piorou 39 milhões de euros face a 2012. Já em 2014, entre Janeiro e Novembro – e considerando apenas as frutas e legumes – regista-se uma melhoria, com as importações a somarem pouco mais de mil milhões de euros, uma redução de 3,7% em comparação com 2013. As exportações aumentaram para 996 milhões de euros, o que significa que compramos quase tanto ao exterior como vendemos.

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