terça-feira, 21 de agosto de 2012

O Poder e as Florestas

OPINIÃO


Paulo Pimenta de Castro

Fez no passado dia 17 de agosto, 16 anos sobre a publicação, no Diário
da República n.º 190/96 – Série I-A, da Lei de Bases da Política
Florestal (Lei n.º 33/96), aprovada por unanimidade pela Assembleia da
República.

Numa análise quantitativa à produção florestal em Portugal, no período
de 1996 a 2010, tendo em conta os dados do Instituto Nacional de
Estatística, em 1996 o Valor Acrescentado Bruto da Silvicultura (a
preços correntes) era de cerca de 0,7% do VAB Nacional, em 2010, os
dados provisórios apontam para um recuo de 0,3%, ou seja regista-se no
período uma queda de aproximadamente 43%. No que respeita à análise
qualitativa dos dados dos Inventários Florestais Nacionais,
registam-se, segundo os especialistas, indícios do crescimento do
abandono da gestão ativa nas áreas florestais de produção lenhosa, ao
que está associada uma maior expressão dos incêndios florestais no
período, com especial impacto nos anos de 2003 e 2005, e uma potencial
mais fácil proliferação de pragas e de doenças, com impacto hoje de
longe superior ao de 1996.

Numa análise mais detalhada das concretizações após a publicação de
Lei de Bases da Política Florestal, o retrato revela uma rotunda
derrota política.

Ao nível das medidas de política florestal (Capítulo II):

• Os planos regionais de ordenamento florestal (PROF) foram
abandonados, sem alternativas evidentes, tendo-se claudicado no
planeamento florestal;

• Os planos de gestão florestal (PGF) são aprovados a conta gota e têm
uma expressão territorial diminuta;

• A reestruturação fundiária e das explorações florestais até hoje tem
sido sucessivamente adiada;

• As iniciativas de fomento florestal têm regredido ao longo do tempo,
todavia, sem uma subsequente gestão florestal, as ações de arborização
ou rearborização podem ter efeitos perniciosos;

• No que respeita à conservação dos recursos silvestres proliferam,
hoje como nunca antes, os danos causados pelos incêndios, mas também
pelas pragas e doenças.

Ao nível dos instrumentos de política (Capítulo III):

• A autoridade florestal nacional sofre agora nova alteração orgânica,
sendo que desde 1996 esta situação já ocorreu quase meia dúzia de
vezes, até hoje com uma eficiência negativa. O recém-criado Instituto
de Conservação da Natureza e das Florestas está já envolvido pela
polémica, com a sua aparição inicial associada à "liberalização"
avulsa, extemporânea e irresponsável das florestações, no caso com
espécies de rápido crescimento;

• O conselho interministerial para os assuntos da floresta sempre foi
um fantasma;

• O conselho consultivo florestal funcionou intermitentemente e, após
tanta trapalhada legislativa, desconhece-se agora a sua sorte;

• A investigação e as estruturas organizativas dos proprietários
florestais funcionam em função de fluxos financeiros instáveis,
atribuídos mais numa perspetiva politiqueira de dependência do
"peixe", ao invés de serem criadas condições que favoreçam a entrega
da "cana de pesca".

No caso específico dos instrumentos financeiros, se o Programa AGRO
(1999/2006) ficou muito aquém das expectativas, o PRODER (2007/2013) é
de execução vergonhosa. O Fundo Florestal Permanente parece útil para
tudo menos para o que foi criado. Nos incentivos fiscais está-se a
pensar dar início a algo e os seguros florestais não são até hoje mais
do que uma miragem.

No caso concreto do atual Governo, a Ministra lançou em dezembro a
iniciativa "Vamos plantar Portugal". O objetivo parece ser plantar uma
árvore por cada Português, como se isso resolve-se o que quer que
seja, muito pelo contrário. Apesar de desajustada, com a recente
proposta avulsa de alterar a regulamentação das ações de arborização e
rearborização, em curso no Ministério, a iniciativa pode até vir a
multiplicar por quatro o resultado inicialmente previsto. Isto se vier
a dar resposta a anunciados investimentos empresariais da fileira da
pasta e papel, mas aqui, com uma aposta parcial do Ministério na
lenhicultura e no eucalipto.

Se o Ministério não apostar claramente no planeamento e na gestão
florestal, a expectativa que gerou em poder tornar-se num catalisador
de mudança no setor florestal não passará de mais uma desilusão. Estão
disponíveis, em inúmeros estudos prospetivos, várias metodologias para
gerar ação. Importa contudo perspetivar uma mudança de paradigma, ao
inverter a tradicional abordagem a partir de conceitos estabelecidos
no topo, para uma abordagem à floresta a partir da propriedade
rústica, dos problemas concretos dos proprietários e gestores
florestais, das populações rurais. Por outras palavras, é imperioso
adequar a estratégia e a produção legislativa às condicionantes da
atividade florestal, à realidade das florestas portuguesas e aos
problemas vivenciados pelos seus detentores e gestores. Só desta
forma, será possível ter sucesso na implementação de iniciativas de
redução do absentismo na gestão, na subsequente valorização
sustentável dos espaços florestais e num maior controlo dos incêndios,
das pragas e das doenças.

Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro Florestal
Presidente da Direção da Acréscimo – Associação de Promoção ao
Investimento Florestal
Ex-Secretário Geral da Anefa - Associação Nacional das Empresas
Florestais, Agrícolas e do Ambiente
Ex-Secretário Geral da Federação dos Produtores Florestais de Portugal

Publicado em 20/08/2012

http://www.agroportal.pt/a/2012/pcastro4.htm

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