quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Vinho Memórias de Salazar chumbado para não pôr em causa a ordem pública

GRAÇA BARBOSA RIBEIRO 28/11/2012 - 12:16
Presidente da Câmara de Santa Comba Dão considera "ridículos" os
fundamentos para a recusa do registo da marca que pretendia usar para
comercializar vinhos e outros produtos regionais.



O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) chumbou a marca
Memórias de Salazar, alegando que a mesma continha "elementos
susceptíveis de pôr em causa a ordem pública".

"Toda a argumentação é ridícula e demonstrativa da falta de maturidade
democrática", reagiu esta quarta-feira o presidente da Câmara de Santa
Comba Dão, João Lourenço, que tentou registar a marca para
comercializar vinho e outros produtos regionais.

No ofício que torna definitiva a recusa do registo da marca, de 20 de
Setembro deste ano, o INPI baseia toda a argumentação na alínea c) do
n.º 4 do artigo 238.º do Código de Propriedade Industrial, que
determina que "para que esteja apta a cumprir uma função distintiva,
uma marca nacional não poderá ser composta por elementos contrários à
moral ou à ordem pública ou ofensivos da legislação nacional e
comunitária".

Para demonstrar que aquele artigo se aplica à marca "constituída pela
composição verbal Memórias de Salazar", os responsáveis pela recusa
produziram um texto que ocupa página e meia do ofício sobre António de
Oliveira Salazar, que consideram "uma figura histórica bastante
controversa no panorama nacional e, sobretudo, a nível político".

"Como fundador do Estado Novo, foi presidente do Conselho de
Ministros, durante mais de 40 anos, período no qual é reconhecido
grande autoritarismo exercido através da propaganda política e da
repressão", pode ler-se no ofício.

Como meios para exercer a repressão, os autores destacam "a censura e
a polícia política", frisando que, através destas, Salazar "almejava,
por um lado, doutrinar obrigatoriamente a população portuguesa de
acordo com a sua ideologia e, por outro, combater os seus opositores
políticos".



Câmara não desiste

A argumentação prossegue com a afirmação de que Salazar, "estadista
muito contestado na opinião pública, é habitualmente associado ao
movimento fascista, à ditadura e à repressão, características com as
quais o cidadão comum – no momento actual – não se identifica".

Neste contexto, os autores do texto consideram que "o normal cidadão
dotado de sensibilidade e tolerância se sentiria ofendido quer com a
exposição comercial, quer com a protecção legal do sinal registado".

Na conclusão, mantém-se o registo: "Salazar é maioritariamente
considerado um ditador que governou um período negro da História
portuguesa" e "no Estado democrático actual, a concessão do registo
violaria, indubitavelmente, o conjunto de princípios fundamentais que
norteiam o sistema jurídico". "A bem da ordem pública e do interesse
social", determinam, aqueles princípios "devem prevalecer sobre o
interesse particular".

Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Câmara de Santa Comba Dão,
que não chegou a intervir na fase em que a recusa se manteve como
provisória, considerou "toda a situação ridícula". "Com pessoas que
ainda não perceberam que vivemos há quase 40 anos em democracia vou
argumentar com quê?", perguntou.

Tenciona apresentar alternativas, mas sempre com a palavra Salazar.
"Talvez tirando as 'memórias' o problema se resolva", disse, admitindo
a possibilidade de pedir o registo de Vinhas de Salazar.


http://www.publico.pt/sociedade/noticia/vinho-memorias-de-salazar-chumbado-para-nao-por-em-causa-ordem-publica-1575289

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