segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Alimento orgânico versus não orgânico: qual o melhor?

03/12/201207h00

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Luciana Alvarez
Do UOL, em São Paulo

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Renato Stockler/Folha Press
Para alguns, vale sim a pena procurar por eles e até pagar um
pouco a mais; a recompensa é um alimento mais saboroso, livre de
agrotóxicos e mais amigável ao meio ambiente

Para alguns, vale sim a pena procurar por eles e até pagar um
pouco a mais; a recompensa é um alimento mais saboroso, livre de
agrotóxicos e mais amigável ao meio ambiente

Seja qual for o médico ou nutricionista consultado, 100% deles
recomendam o consumo de verduras, legumes e frutas como forma de
garantir uma boa saúde. Mas essa unanimidade se esfacela na hora de
dizer se os alimentos orgânicos são mais saudáveis que os demais. E a
polêmica parece que ainda está muito longe de ser resolvida em
definitivo.

Para alguns, vale a pena procurar por eles e até pagar um pouco a
mais; a recompensa é um alimento mais saboroso, livre de agrotóxicos e
mais amigável ao meio ambiente. Mas há os que defendam que, sob o
ponto de vista da saúde do consumidor, não há provas de que os
orgânicos tragam benefício extra e, portanto, não faz diferença a
forma como o alimento é produzido.

A corrente que defende a indiferenciação entre orgânicos e
não-orgânicos ganhou fortes argumentos com a publicação no início de
setembro do mais amplo estudo de meta-análise (compilação de vários
estudos científicos) feito até o momento, mostrando que, sob o aspecto
da quantidade de nutrientes – como carboidratos, proteína, vitaminas e
minerais – há pouca ou nenhuma diferença entre os orgânicos e os
demais.

Para chegar à conclusão, pesquisadores da Universidade Stanford,
coordenados pela médica Dena Bravata, fizeram uma revisão de 17
acompanhamentos clínicos em humanos e 233 pesquisas que comparavam os
níveis de nutrientes e contaminantes em alimentos, de acordo com a
forma de produção.

Segundo Durval Ribas Filho, presidente da Abran (Associação Brasileira
de Nutrologia), esse resultado já era esperado, pois na prática
clínica nenhum médico observa diferenças na nutrição de pacientes que
só consomem orgânicos. "Muitas vezes a versão do fato é mais forte que
o fato. Até o momento, o fato é que não há comprovação científica de
que a composição dos alimentos orgânicos seja melhor que os demais",
diz.

Mas o nutrólogo ressalta que, de forma nenhuma, isso significa ele
esteja desaconselhando o consumo de orgânicos. "Ambos fazem bem à
saúde. Frutas, verduras e legumes devem ser consumidos sempre. Se a
diferença nutricional ainda não foi observada cientificamente, é certo
que existe um lado filosófico e ambiental", afirma.

Ribas Filho alerta apenas que, orgânicas ou não, as hortaliças
precisam ser bem lavadas, pois independentemente do tipo de produção
elas podem ter contaminações por bactérias como salmonela e E.coli,
por exemplo.
Ver em tamanho maior
Confira o índice de agrotóxico encontrado em alguns alimentos

Foto 1 de 8 - Pimentão: no Para (Programa de Análise de Resíduos de
Agrotóxicos de Alimentos) de 2011 da Anvisa, mais de 90% das amostras
de pimentão possuíam agrotóxicos em excesso, ou produtos proibidos no
Brasil Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem - 11.06.2008

Outros contaminantes

Embora a pesquisa de Stanford não aponte diferenças nutricionais
significativas, ela mostrou que nos alimentos orgânicos há 30% menos
risco de contaminação por pesticidas. Segundo os pesquisadores, porém,
a questão não preocupa porque os níveis de agrotóxicos encontrados
estavam dentro dos limites aceitáveis.

Especialistas brasileiros, no entanto, defendem que só isso já é
motivo suficiente para preferir os orgânicos. Afinal, mesmo sendo
baixo o risco de problemas sérios advindo da ingestão de aditivos
químicos aos alimentos, nos orgânicos o risco é zero.

"Estudos indicam que se ingerirmos quantidades dentro dos valores
diários aceitáveis não sofreremos danos à saúde, ainda assim os
orgânicos são melhores por não conterem nenhum aditivo químico",
afirma a pesquisadora Edinéia Dotti Mooz, do Grupo de Pesquisa em
Segurança Alimentar e Nutricional da Esalq, USP. Ou seja, se do ponto
de vista do valor nutricional não foram comprovadas diferenças, há
outros critérios que levam os orgânicos a serem melhores.

Além disso, uma limitação do estudo é que não foram levadas em
consideração as consequências da exposição a pesticidas a longo prazo
– os acompanhamentos clínicos analisados tinham no máximo dois anos de
duração. Isso pode fazer uma grande diferença: pequenas quantidades de
agrotóxicos sozinhas podem não ser prejudiciais, mas acumuladas têm o
potencial de causar efeitos nocivos, que só serão percebidos 10 ou 15
anos depois. O mesmo vale para os antibióticos e hormônios dados aos
animais de corte, que acabam entrando no organismo de quem os consome.

Sobre esse aspecto, existe de fato uma larga "zona de incertezas",
afirma a médica Raquel Rigotto, professora de Saúde Comunitária da
Universidade Federal do Ceará: "Cada estudo avalia um elemento por
vez, mas nós temos uma exposição múltipla. Portanto, não há certezas
sobre a interação entre eles no nosso organismo ou no próprio
alimento".

Na falta de resultados conclusivos, o ideal seria adotar o princípio
da precaução, defende Rigotto. "Dizem que não há estudos provando que
agrotóxicos fazem mal. Mas a lógica deveria ser a contrária: existem
estudos comprovando que eles não fazem mal?", questiona. Segundo ela,
já existem evidências vindas de estudos epidemiológicos de que os
agrotóxicos podem causar alergias, problemas de fertilidade, doenças
neurológicas e cânceres.

Ribas Filho, no entanto, acredita que as pessoas não precisam se
alarmar. "Se usadas dentro dos padrões permitidos, não há indícios de
perigo dessas substâncias. Se os alimentos atuais fizessem mal, não
estaríamos assistindo ao aumento constante da expectativa de vida da
população", diz.

Realidade nacional

Um problema enfrentado pelo consumidor brasileiro é que os limites
legais frequentemente são ignorados. Desde 2002, a Anvisa (Agência
Nacional de Vigilância Sanitária) faz análises anuais de resíduos de
agrotóxicos em alimentos e, ano após ano, encontra inúmeras
substâncias vetadas, ou o uso das permitidas acima dos patamares
considerados seguros.

Na última análise, por exemplo, mais de 90% das amostras de pimentão
estavam fora das normas da Anvisa. No balanço geral, das 2.488
amostras coletadas, 28% estavam insatisfatórias. Um novo estudo sobre
o uso de agrotóxicos deve ser divulgado na primeira quinzena de
dezembro.

E mesmo as regras brasileiras são consideradas frouxas por alguns
pesquisadores. O governo aceita atualmente a utilização de 434
ingredientes ativos, usados para evitar pragas como fungos, insetos,
roedores, moluscos, formigas e ervas daninhas. Entre essas
substâncias, pelo menos 24 já foram banidas nos Estados Unidos, Canadá
ou Europa.

"E todos os estudos que liberam os pesticidas e adubos químicos são de
curto prazo. Na prática, como não se sabe se fazem mal ao longo do
tempo, libera-se o uso. Mas antes deveríamos ver se realmente fazem
mal", afirma a nutricionista Elaine de Azevedo, autora do livro
Alimentos Orgânicos (Editora Senac) e professora da Universidade
Federal de Grande Dourados (MS).

Por isso, ela recomenda, sim, a opção pelos orgânicos, mesmo que sejam
um pouco mais caros. "O orgânico merece ser mais caro, porque seu
valor real é maior: um produto que respeita o homem do campo, não
polui e não traz doenças", afirma Azevedo. Uma dica para não se pagar
preços abusivos é procurar feiras e sacolões específicos de orgânicos,
que costumam oferecer mais variedade e valores menores dos que nas
grandes redes de supermercados.

Cuidados para minimizar riscos

Quando não for possível consumir apenas produtos orgânicos, seja pelo
preço proibitivo ou pela falta de oferta, algumas atitudes podem
minimizar a ingestão de insumos artificiais junto com os alimentos.
Uma delas é comprar apenas produtos de época. "Fora da estação
adequada é quase certo que uma fruta, verdura ou legume tenha recebido
cargas maiores de agrotóxicos. Escolha outro produto que o substitua
em termos nutricionais", aconselha a Jocelem Salgado, professora de
Nutrição da Esalq, USP.

Também é sempre mais seguro comprar produtos de sua região. "Alimentos
que percorrem longas distâncias normalmente são pulverizados
pós-colheita e possuem alto nível de contaminação", explica a
professora. Outra dica de Salgado é diversificar o consumo: "Além de
propiciar boa variedade de nutrientes, reduz a chance de exposição a
um mesmo agrotóxico".

Embora não se possa eliminar completamente os agrotóxicos, medidas
como retirar as folhas externas das verduras, lavar todos os alimentos
em água corrente e mergulhá-los em uma solução de água com vinagre
ajudam a retirar parte deles.

Quando se trata de frangos, a recomendação de Salgado é retirar a
gordura e pele, pois algumas substâncias tóxicas se acumulam em
tecidos adiposos.

O que é alimento orgânico?

Letícia Moreira/Folhapress

Orgânico é o alimento cultivado sem pesticidas, defensivos
agrícolas, adubos inorgânicos ou sementes trangênicas, e produzido de
uma forma que não prejudique o ecossistema local, como contaminar as
águas de um rio. Se for de origem animal, o produto não deve ter
antibióticos, hormônios do crescimento ou outras drogas veterinárias.
Além disso, os produtores devem assegurar instalações adequadas
visando o bem-estar dos animais que, aliás, costumam viver livres e
não confinados. Quando se fala de produtos orgânicos processados, como
sucos e geleias, além de contar com matérias-primas orgânicas, eles
não podem incluir aditivos sintéticos na fabricação (corantes,
aromatizantes, conservadores, etc).

Para alguns, o conceito de orgânico também abarca um sistema de
produção que respeite a mão-de-obra envolvida, oferecendo condições de
trabalho e salários dignos. Como esse critério não é amplamente
utilizado, alguns preferem usar o termo "agroecológico" para
diferenciar os alimentos feitos dessa maneira. "O agroecológico tem a
consciência de sustentabilidade com o ecossistema e com a qualidade de
vida para o trabalhador. Há empresas que cultivam sem agrotóxicos, mas
fazem monoculturas e exploram a mão-de-obra", afirma a médica Raquel
Rigotto, professora do Departamento de Saúde Comunitária da
Universidade Federal do Ceará.

http://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2012/12/03/alimento-organico-versus-nao-organico-qual-o-melhor.htm

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