Sector tradicional
08.08.2011 - 11:00 Por Carlos Cipriano
de 22 notícias em Economiaseguinte »
Cadeias de retalho têm poder a mais na formação de preços, dizem produtores
A maçã de Alcobaça tem qualidades únicas
(Mário Caldeira/PÚBLICO)
A par da pêra-rocha, a maçã de Alcobaça vive também dias felizes no
Oeste. A fileira (cluster) deste fruto já emprega 2500 pessoas, 20 por
cento das quais são quadros qualificados relacionados com a engenharia
agrícola e alimentar. Em 2010, foram produzidas 40 mil toneladas desta
maçã que representaram uma facturação de 40 milhões de euros.
A
exportação representa 15 por cento das vendas, sobretudo para
Inglaterra e Irlanda, mas também para Angola e Cabo Verde.
Jorge Santos, presidente da Associação dos Produtores de Maçã de
Alcobaça (APMA), diz que a internacionalização não é uma aposta
estratégica porque ainda há muito espaço em Portugal para este mercado
crescer, substituindo até a maçã importada.
O sector tem vindo a consolidar-se graças ao associativismo dos
produtores e ao maior peso da actividade agro-alimentar, que faz com
que, por exemplo, se venda maçã fatiada em embalagens de plástico e em
sumos com elevada densidade de polpa.
É isso que explica o emprego de cada vez mais especialistas neste
sector, desde engenheiros agrónomos nos pomares, até aos técnicos de
qualidade à saída das linhas agro-industriais.
Apesar das facturações crescentes e do sector não ter perdido valor
com a recessão, Jorge Santos aponta alguns constrangimentos que exigem
uma maior intervenção do Estado.
"Não reclamamos subsídios nem somos a favor deles. Mas queremos que o
Governo regule o mercado e os oligopoderes que nos espartilham", diz
Jorge Santos.
E que oligopoderes são esses? As energias, a banca e a distribuição.
Sem energia não há regas, não há tractores no campo, nem unidades de
armazenamento nem linhas de produção. Sem banca não há crédito. E sem
a distribuição não há escoamento do produto, sobretudo para as grandes
superfícies.
"Só que os três atingiram uma posição assustadora que violenta a
relação com os produtores. Sobretudo a distribuição tem um peso
excessivo contra o qual nós nada podemos. São eles que ditam os
preços." Jorge Santos diz que em 1992 havia 15 insígnias de
supermercados para os quais vendiam maçã de Alcobaça, mas hoje há
apenas cinco.
A união faz a força
"É um processo de concentração que não foi favorável aos produtores
nem aos consumidores. Há supermercados que, por vezes, vendem produtos
agrícolas abaixo do preço de custo e por isso é que achamos que
deveria haver uma regulamentação para que o comércio fosse justo."
Jorge Santos fala em nome da AMPA que é composta por 13 associados,
que por sua vez representam mil produtores. São cooperativas
agrícolas, sociedades anónimas, sociedades por quotas, agrupamentos de
produtores que resultaram de um processo de fusão nos finais da década
de 80 de uma miríade de pequenos produtores.
"Quando abriram as fronteiras fomos invadidos nos primeiros tempos por
maçãs espanholas e francesas, mais baratas, mas de pior qualidade.
Ora, a maçã de Alcobaça é mais saborosa e mais aromática. Tem
características únicas no mundo que fazem dela um produto ímpar. A
solução foi associarmo-nos e criarmos massa crítica para enfrentar
este desafio", conta este dirigente. Um primeiro passo foi dado com a
criação de uma área protegida que agrupava os concelhos de Alcobaça,
Porto de Mós, Nazaré, Caldas da Rainha e Óbidos, ou seja, o
equivalente aos coutos de Cister, evocando-se um tempo em que os
monges de Alcobaça dominavam este território.
Oito séculos de história
O primeiro registo da existência da maçã de Alcobaça como uma fruta
diferenciada data de 1200, numa época em que este fruto já viajava nos
portões de navios para o Norte de África e Inglaterra. Mas a
delimitação geográfica não se compadece com a História e em breve
também os concelhos de Bombarral, Cadaval, Torres Vedras, Lourinhã,
Peniche, Rio Maior (este só parcialmente), Batalha, Marinha Grande e
Leiria passaram a integrar a área protegida deste fruto.
"A maçã de Alcobaça é um fruto que é produzido numa especificidade
climática e de solos que se situa entre a serra do Montejunto, a serra
dos Candeeiros e o mar", explica o também engenheiro agrónomo Jorge
Santos.
O clima do Oeste, com orvalho, arrefecimento nocturno e sem calor
excessivo, e solos férteis com 150 milhões de anos, propiciam um fruto
muito rico, não em água, mas em sais minerais e em substâncias
fitonutrientes. Uma das suas características é o aroma, difícil de
encontrar noutro tipo de maçãs.
A produção desta maçã - que existe nas variedades Casa Nova, Golden,
Granny Smith, Jonagored, Reineta, Galaxy e Starking - obriga a regras
muito apertadas para os agricultores, entre elas o não uso intensivo
de pesticidas e a adopção de biotécnicas na captura de insectos maus.
Por exemplos, as joaninhas comem 50 piolhos por dia e hoje proliferam
pelos pomares como um meio de combate às doenças que afectam as
árvores.
Além de fruto biológico, esta maçã só é comercializada para os
supermercados e exportação nas categorias "extra" e "um", sendo as
categorias "dois" e "três" escoadas para os mercados tradicionais,
marcas brancas e indústria agro-alimentar (sobretudo sumos e
iogurtes).
É isso que faz com que a maçã de Alcobaça consiga penetrar no exigente
mercado britânico e, por sua vez, na ainda mais exigente distribuição
gratuita de fruta nas escolas públicas inglesas.
http://economia.publico.pt/Noticia/maca-de-alcobaca-de-boa-saude_1506694
Sem comentários:
Enviar um comentário