sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Produtores agrícolas acusam grande distribuição

Nos pomares de pera rocha do Oeste já se vive a agitação da apanha do
fruto, cuja produção deverá este ano atingir as 200 mil toneladas.
Ultrapassada a fase de produção, os agricultores confrontam-se agora
com a necessidade de escoar o produto. Dizem que nem sempre é fácil
negociar com as grandes superfícies, que exigem grande qualidade mas
pagam preços baixos.

Nos pomares de pera rocha do Oeste já se vive a agitação da apanha do
fruto, cuja produção deverá este ano atingir as 200 mil toneladas.
Ultrapassada a fase de produção, os agricultores confrontam-se agora
com a necessidade de escoar o produto. Dizem que nem sempre é fácil
negociar com as grandes superfícies, que exigem grande qualidade mas
pagam preços baixos. Apesar disso, entre o pomar e o consumidor o
preço da fruta muitas vezes triplica.
Vítor Cordeiro, de Porto de Mós, já vendeu fruta às grandes
superfícies, mas deixou de o fazer porque "os encargos não
compensavam". Para poder colocar a sua fruta nesses espaços tinha
custos com a embalagem (o que encarecia um pouco o produto), que não
podia repercutir nos preços a que vendia. "As grandes superfícies são
muito exigentes com a qualidade, mas o preço a que pagam é baixo",
diz.
O gerente da Fruticordeiro revela, por exemplo, que a fruta que vendia
a 50 cêntimos o quilo era depois colocada nas lojas com "mais 50% ou
60%" sobre esse valor. Mas os produtores "não podem fazer nada [quanto
a isto], porque têm de escoar o produto, não o podem guardar". O
agricultor lamenta que haja a ideia de que os produtores ganham muito
dinheiro. "De facto a fruta está cara nas lojas, mas não são os
produtores que ganham. A maior fatia fica no comércio", sustenta.
Telmo Prezado, produtor do Oeste, em recentes declarações à SIC, disse
que um quilo de pera rocha vendido pelo produtor entre 50 e 90
cêntimos, dependendo do calibre, "está nas lojas a 1,60 ou 1,80
euros". A fruta "chega sempre à mesa quatro vezes mais cara do que sai
do pomar".
"A grande distribuição aposta numa política de preços baixos que não
ajuda os produtores a cobrir os custos de produção, esmaga as margens
e desincentiva o investimento na agricultura", disse ao Diário
Económico Pedro Queiroz, director-geral da Federação das Indústrias
Portuguesas Agro-alimentares.
Falta união nos produtores
A concentração no sector da distribuição e a falta de união dos
produtores são dois aspectos apontados por muitos destes como estando
por trás do desequilíbrio na relação entre ambos. Filipe Ribeiro,
sócio da Carsag, frisa isso mesmo. "O grande problema é a concentração
que se tem operado na distribuição", diz, mas também reconhece que "os
produtores não são suficientemente unidos para conseguirem jogar com a
lei da oferta e da procura".
O empresário de Alfeizerão não vende nem tenciona vender directamente
às grandes superfícies, porque sabe que isso "só agravaria a pressão"
sobre os actuais fornecedores desses espaços. "Quem está muito
dependente das grandes superfícies acaba por ficar nas mãos delas. Têm
formas de pressionar o produtor a baixar os preços, não fazendo
encomendas ou impondo outros 'castigos', o que dificulta bastante a
relação". Ou então, "importam produto para criar excesso de oferta no
mercado, o que faz baixar os preços".
Filipe Ribeiro entende que as cadeias de distribuição têm uma grande
margem de lucro em muitos dos produtos agrícolas que vendem e estranha
que apresentem como chamariz abacaxi ou banana importada a menos de um
euro, quando vendem fruta da época produzida em Portugal a valores na
casa de 1,5 euros ou mais. "Isto prejudica o produtor e é um
contra-senso." Diz ainda que nas cadeias de distribuição "o que conta
é o lucro imediato, o que não é compatível com a sustentabilidade".
Entende, por isso, que o consumidor tem também um papel importante a
desempenhar para que as coisas mudem.
Jorge Soares, em declarações ao Público, fala em "oligopoderes" que
"espartilham" os produtores, apontando o dedo à banca, ao sector
energético e à distribuição. Os três "atingiram uma posição
assustadora que violenta a relação com os produtores. Sobretudo a
distribuição tem um peso excessivo contra o qual nós nada podemos. São
eles que ditam os preços", diz o presidente da Associação de
Produtores de Maçã de Alcobaça, lembrando que em 1992 havia 15
insígnias no mercado e que hoje há apenas cinco.
"É um processo de concentração que não foi favorável aos produtores
nem aos consumidores. Há supermercados que, por vezes, vendem produtos
agrícolas abaixo do preço de custo e por isso é que achamos que
deveria haver uma regulamentação para que o comércio fosse justo",
sublinha o presidente da APMA, que representa mil produtores.
O JORNAL DE LEIRIA pediu esclarecimentos à Associação Portuguesa das
Empresas de Distribuição que, até ao fecho desta edição, não
respondeu. No entanto, em Junho, a associação explicava que a
distribuição "continua a prosseguir a sua política de preços baixos ao
consumidor" e que tem protocolos com organizações representativas dos
produtores para "orientar a produção agrícola nacional para o
mercado", fomentando "o consumo de produtos agro-alimentares de origem
portuguesa". Garantia que as cadeias dão preferência a produto
nacional, mas frisava que "muitas vezes não é possível encontrar no
mercado nacional produtos que correspondam à procura nas lojas".
Raquel de Sousa Silva
PROVE dinamiza venda local
Em Santarém está em curso o projecto PROVE-Promover e Vender, que tem
como objectivo fomentar novas formas de comercialização de circuito
curto, nomeadamente de produtos agrícolas, entre pequenos produtores e
consumidores, contribuindo para o escoamento dos produtos locais. É
dinamizado pela Associação para o Desenvolvimento Integrado do
Ribatejo Interior e, segundo a Lusa, os cabazes hortofrutícolas
começaram a ser vendidos em Setembro do ano passado e já aderiram mais
de 80 consumidores, que se comprometeram a comprar por semana um cabaz
composto por artigos provenientes das hortas de seis produtores. Em
lista de espera estão outros 100 consumidores, aos quais os produtores
não conseguem ainda responder. Em Leiria, os responsáveis da Quinta
Sementes d'Estrela pretendem avançar com uma ideia semelhante: o
projecto Mimos do Campo prevê a venda ao domicílio de cabazes de
produtos provenientes de uma horta biológica a quem subscrever o
serviço. n

2011-08-25
http://www.jornaldeleiria.pt/portal/index.php?id=6636

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