terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Assunção Cristas: “o caminho é aumentar as exportações”

Samuel Alemão Foto de Ricardo Palma Veiga
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hoje às 11:43Garantido o IVA do vinho a 13%, a ministra aposta tudo na
exportação. Ainda há muitos mercados por explorar, diz. Mesmo o vinho
do Porto pode competir com Martini e gin tónico. Promete solução para
a Casa do Douro, em 2012, e defende profissionalização das
cooperativas.
Sendo a mais jovem ministra do actual Governo, empossado em Junho,
Assunção Cristas, 37 anos, carrega o peso de pastas como a
Agricultura, o Mar, as Pescas, o Ambiente e o Ordenamento do
Território. Parece ter caído, por agora, nas boas graças do sector do
vinho, ao assegurar a manutenção da sua taxa de IVA nos 13%.
"Reconhecimento de que ele é muito importante como dinamizador das
exportações" e deve ser imitado por outras fileiras, diz. Mas ainda há
muito por onde crescer, assegura a ministra, entrevistada no seu
gabinete, no Terreiro do Paço, no final de Novembro.

Revista de Vinhos (RV): Foi muito difícil convencer o
Primeiro-ministro e o ministro das Finanças a manter o IVA do vinho
nos 13%?
Ministra da Agricultura (MA): O IVA do vinho ficar nos 13% corresponde
a um sinal que o Governo quis dar no que respeita à sua importância
como produto agrícola muito relevante, com muita expressão na produção
nacional e, no fundo, a sinalização de que há reconhecimento de todo o
processo de evolução que foi feito pelo sector. Há conhecimento de
que, neste momento, ele exporta 30%, mas ainda vende internamente
cerca de 70% e que estas vendas nacionais são o que permite dar
músculo para se poderem projectar lá para fora.
RV: Foram argumentos suficientes para convencer os seus colegas de Governo?
M.A.: Eu não colocaria assim as coisas. Isto são conversas que se têm
e nas quais se tenta perceber quais são os produtos em relação aos
quais se pode mudar ou não.
RV: Chegou a avançar-se a notícia de que o vinho iria ver a taxa de
IVA aumentada...
M.A.: Mas avançou-se com tantas coisas, algumas não se concretizaram e
outras talvez. Até fechar o Orçamento, tudo isso é campo de
especulações. Bem sei que, mesmo em véspera de se aprovar o Orçamento
em Conselho de Ministros, alguns partidos levantaram essa bandeira,
dizendo "vai-se abandonar o vinho, o Governo não está para ali virado,
a ministra abandonou estes problemas". Mas, na verdade, não tínhamos
dito nada sobre isso. Aquilo que sempre disse era que estávamos a
trabalhar para perceber as consequências das várias decisões e a
importância de sinalizar os da área da agricultura – que tem a
generalidade dos produtos na taxa mais reduzida, porque pertencem à
alimentação básica. No caso do vinho não é exactamente assim. Mas ele
é importante pelo peso que tem nas nossas exportações e pela
necessidade de manter algum músculo nas empresas, que é ganho cá
dentro.
RV: Podemos dizer que o vinho é uma das bandeiras deste Governo?
M.A: Diria que o vinho é uma bandeira, também enquanto
produto-bandeira da própria agricultura e da agro-indústria. A
agricultura é uma das nossas bandeiras, porque acreditamos que, com
ela, conseguimos gerar crescimento económico. E, se olharmos para as
exportações dos últimos dez anos, vimos que elas subiram, em média,
5,4% e, no sector agro-alimentar, subiram 10%. Há, de facto, um
dinamismo na área agrícola. Sabemos que podemos produzir mais
internamente, quer para exportar, quer para substituir importações de
produtos. Neste momento, temos uma dependência de 30% a nível de
valor. O vinho é um produto no qual excedemos os 100% de
aprovisionamento. Portanto, estamos bem, produzimos mais do que aquilo
que consumimos e exportamos bastante. Mas sabemos também que o vinho,
pelo trabalho que foi desenvolvido ao longo dos anos e porque hoje
temos vinhos sofisticados, deve ser apoiado. O vinho fez este
percurso, o qual também deveria ser seguido em muitas outras fileiras,
e é bom que esse trabalho seja reconhecido e estimulado. Por isso,
seria um bocadinho penoso fazer uma alteração do enquadramento fiscal,
penalizando um sector que fez uma evolução destas e que mostra
condições de pujança. Se olharmos para os dados de 2011, até ao
terceiro trimestre, notamos que as exportações de vinho aumentaram
4,3%, comparadas com o período homólogo. O que é muito positivo e
mostra o dinamismo do sector e todo o trabalho que tem vindo a ser
feito.
RV: Qual é o lugar do vinho português num mercado internacional que
sabemos ser muito competitivo?
M.A.: É um mercado muito competitivo, de facto. O mais importante é
dar a conhecer o vinho português, a sua diferenciação e tentar que ele
seja reconhecido com um valor superior aquele que existe neste
momento. Pergunta-me quais são os nossos mercados óbvios. Se tirarmos
o vinho do Porto e o Madeira - que introduzem aqui outras variantes,
são coisas específicas, têm mercados específicos -, se olharmos para
os que competem de igual para igual com os que produzidos no resto do
mundo, temos destinos óbvios, até por a origem Portugal ajudar, como o
Brasil. É uma área de crescimento muito grande, para onde já se vende
muito, mas onde ainda se pode vender mais. Claro que também implica
termos melhores condições, pois o Brasil, fruto da sua integração no
Mercosul e do respectivo enquadramento alfandegário, com a Argentina e
o Chile, recebe vinhos muito baratos que colocam os nossos em posição
de desvantagem relativa bastante grande.
RV: Muitos produtores queixam-se das dificuldades que as autoridades
brasileiras parecem colocar a produtos que venham de fora do Mercosul.
O que é que o Governo português pode fazer?
M.A.: É verdade. Essa é uma matéria que também tem implicações a outro
nível, nomeadamente do acordo que a União Europeia tem com a Mercosul.
Para além daquilo que se pode fazer bilateralmente – e é, com certeza,
possível agilizar procedimentos e por aí fora -, existe um
enquadramento mais regional. Teremos que actuar ao nível da UE e o
Brasil ao nível da Mercosul. Porventura, algumas questões só se
resolverão a esse nível, que depois terá implicações para os
diferentes estados. Em relação ao acordo com o Mercosul, que é muito
debatido sobre as vantagens e desvantagens para Portugal, há áreas em
que o vemos com muita apreensão. Mas existem outras que vemos como
passíveis de tirarmos benefícios. A dos vinhos é uma das que,
previsivelmente, beneficiará desse acordo.
RV: A nossa relação específica com o Brasil não poderá desbloquear as
dificuldades ainda sentidas?
M.A.: Isso está a ser tratado nesse sentido, neste momento. Quer ao
nível das relações via Ministério dos Negócios Estrangeiros, quer ao
nível aqui do nosso ministério. Há contactos no sentido de percebermos
como é que podemos conseguir ultrapassar esses pontos. Também é
verdade que, havendo negociações a um nível mais alargado, o espaço de
manobra é sempre mais limitado. Mas existem essa preocupação e esse
empenho, não só ao nível do vinho, mas também de outros produtos, como
o azeite – um produto que tem, igualmente, um grande potencial para
ser desenvolvido no Brasil. Mas podemos juntar outros mercados: África
lusófona, nomeadamente Angola, também. Depois, há países identificados
como mercados onde podemos crescer bastante: Reino Unido e Alemanha,
na Europa, e Estados Unidos e Canadá, na América. Podemos também
crescer para a Escandinávia. Para além disso, no Oriente, começamos
também a ter alguns canais, seja através de Macau e de Hong Kong, seja
na própria China. Isto apesar de entrar em mercados asiáticos muito
populosos poder, a dada altura, levar-nos aos problemas de dimensão,
para conseguir ter produção suficiente para os alimentar.
RV: Estamos a falar de um trabalho de conquista de mercados inserido
na estratégia da campanha Wines of Portugal, ou será uma tarefa que
caberá a cada empresário e produtor realizar?
M.A.: Quanto mais as acções forem concertadas, mais funcionam. Seja no
vinho, seja a propósito dos legumes, vegetais e outros produtos. Vemos
hoje várias entidades que se agrupam sob o chapéu da Portugal Foods e
têm o objectivo de promover os produtos portugueses. E aquilo que
sentimos é que, quando os vários empresários da área do vinho, nas
suas diversas marcas, vão numa acção conjunta – em que, para além de
aparecerem com a sua marca, também o fazem com o chapéu de Portugal –,
isso começa a ser reconhecido e a trazer vantagens. Como é evidente,
estamos num mercado em que as empresas têm, e devem ter, total
liberdade para as suas estratégias.
Mas a verdade é que elas próprias sentem que, juntando-se e
agregando-se em acções conjuntas, as coisas correm melhor. E há muito
interesse de muitos sítios em consumir os nossos produtos. Por
exemplo, já estive duas vezes com o embaixador do Japão, que me pede
para lá irmos, pois existe ali uma predisposição cultural e histórica
para acolher bem os produtos portugueses. E isso pode estender-se a
vários produtos agrícolas, com o vinho à cabeça. Temos, de facto, um
mundo muito grande, com muitas novidades, com muitas partes a mexerem
e a crescerem a olhos vistos. Em muitas dessas zonas, temos fortes
possibilidades de penetrar, desde logo pelas relações históricas e
diplomáticas existentes. Para além daqueles que são os mercados mais
maduros, do mundo Ocidental, temos oportunidades de entrar em mercados
que têm elevado potencial.
RV: Sempre afirmando a tal diferença....
M.A.: Sim, tentando impo-la e tendo a preocupação pedagógica de
explicar a diferença e de mostrar como nós fazemos hoje vinhos bons e
diferenciados, vinhos para várias circunstâncias. E isso é possível
fazer-se com discursos distintos para os diferentes mercados, não com
uma receita única. Para a Escandinávia, por exemplo, temos um mercado
muito interessante para tudo o que seja biológico e, naturalmente, o
vinho feito de acordo com esses processos de produção. Noutras partes
do globo, porventura teremos outras vantagens e outros interesses.
Sabemos que para Angola, neste momento, há muita exportação de vinho
onde o efeito qualidade, o efeito rótulo e garrafa valem menos, e há
mais vinho em quantidade. Se calhar, nesta fase, terá que ser
preferencialmente assim, para depois se entrar com um maior equilíbrio
entre as duas coisas.
RV: Acha que é possível colocar no mesmo cesto a promoção
internacional do vinho e da restante produção agro-alimentar
portuguesa, como o azeite?
M.A.: Penso que depende de que mercados estamos a falar. E também
depende do que também já existe de português nesses mercados. Temos um
bem que é conhecido no mundo inteiro, que é o vinho do Porto. E essa
presença pode ser um bom canal para levar a conhecer outros vinhos. Já
pode ser mais difícil levar hortícolas ou frutícolas pelos mesmos
canais. Estamos a falar de coisas diferentes. Mas, se calhar, o azeite
consegue penetrar de forma análoga. Depende do que estamos a falar,
dos países em causa, do que já existe e das estratégias. Mas não tenho
muitas dúvidas de que, se conseguirmos associar a Portugal a ideia de
país de origem de produtos agro-alimentares de elevada qualidade, se
começarmos a entender isto, será muito positivo. No outro dia, falava
com alguém que exportava fruta para a China, no caso pêra rocha, e
dizia-me que os chineses acharam muito estranho, pois não conheciam
Portugal como país agrícola, mas gostaram muito da pêra. Depois,
fez-se a proposta de exportar ameixa e os chineses só perguntaram se o
produtor era o mesmo. Quando lhes confirmaram que sim, apenas disseram
"então venha, que não precisamos de provar". Pode ser feito este
esforço de associar a nossa imagem à de produtos agro-alimentares de
qualidade, na mesma medida em que temos a ideia de que tudo o que são
produtos manufacturados alemães é bom.
RV: Não teme que haja uma sobredependência da agricultura portuguesa,
e das suas exportações, em relação ao vinho?
M.A.: O vinho representa 16% da produção agrícola nacional, o que é
bastante, mas não é excessivo. O seu peso nas exportações do sector
agro-alimentar é de 15%. Se olharmos para o conjunto da área da
horticultura e da fruticultura, verificamos que tem muito mais peso
que o vinho. E aqui temos muitos produtos que exportamos, como as
pêras, as maçãs, as ameixas, a uva de mesa, o tomate. Há esta
notoriedade do vinho porque se trata de apenas um produto. Porque, se
falarmos de frutas e vegetais é uma panóplia. O azeite também já tem
bons números. O sector dos hortícolas e frutas está a ultrapassar o
sector do vinho. Os 15% do vinho são mais visíveis, porque uma garrafa
de vinho é algo bem mais emblemático e perceptível.
RV: Para além da iniciativa Wines of Portugal, que outros apoios pode
o Governo dar ao sector, agora que os dinheiros dos quadros
comunitários de apoio estão a chegar ao fim?
M.A.: Sabemos que os apoios do Proder são, essencialmente, para ajudar
às exportações e à promoção internacional, para a qual contribuem com
uma fatia relevante. Mas a parte mais significativa até é para a
produção, para fazer novas vinhas e as reestruturar e também investir
em adegas. Para além disso, e é verdade que estamos com uma execução
de 99% das medidas previstas, vamos fazer uma reprogramação também,
retirando verbas de outras medidas onde não houve essa execução, para
outras áreas onde tem havido mais necessidade e que demonstram mais
dinamismo. Por outro lado, será dada atenção a tudo o que possamos
fazer pela promoção e valorização interna dos nossos produtos. Chamo a
atenção para o diálogo que estamos a encetar com a produção, a
indústria e a distribuição para vermos mais produtos portugueses nas
prateleiras das lojas. No caso do vinho, não haverá grande
dificuldades, porque temos essa tradição de beber vinhos portugueses.
RV: O aumento do IVA na restauração não poderá vir a prejudicar o
consumo de vinho?
M.A.: Na restauração, é possível que isso aconteça. Até porque sabemos
que aí o vinho costuma ser bastante mais caro, tem que ver com o canal
onde é comercializado. Mas, se calhar, no supermercado, isso não se
fará sentir, porque a taxa de manteve. Sem dúvida que o caminho para
maior escoamento do vinho, sem excluir o mercado nacional, que é muito
importante, será sempre o de aumentar a exportação. O que também
implica a mobilização de tudo o que seja a presença portuguesa no
mundo. Esta nova vocação de diplomacia económica das embaixadas também
deverá trazer bons sinais.
RV: Mas deixe-me insistir nesta questão da restauração. Não a
incomoda, como titular da pasta e mesmo como consumidora, que
permaneça esta ideia de que se está a pagar muito mais por um vinho no
restaurante do que aquilo que ele vale?
M.A.: As pessoas pagam sempre mais, não há dúvida. Basta comparar o
preço de uma garrafa no supermercado e o que é praticado no
restaurante para ver a diferença.
RV: O que, muitas vezes, até serve para as desmobilizar de beber vinho
no restaurante...
M.A.:...por ser muito caro. Pois, repare que isso tem mais a ver com a
forma como o preço da refeição é definido. Tem a ver com os custos da
restauração, pela maneira como isso é reflectido nos vários produtos
que são utilizados. Desejavelmente, o preço do vinho deveria ser mais
barato ou termos mais alternativas. O vinho a copo, por exemplo, já o
vemos em muitos restaurantes. Temos que apelar a uma maior
criatividade do comércio. Há que, por exemplo, promover mais os
produtos regionais, até nesta altura de crise, em que muita gente
passará a fazer deslocações turísticas dentro do território nacional.
RV: Há uma queixa constante dos pequenos produtores relativamente ao
preço pago pelos seus vinhos, o qual tem sido sucessivamente mais
baixo, ao ponto de ameaçar a sua subsistência. O caso do Douro é
emblemático. O que pode ser feito para mudar esta situação?
M.A.: Isso é verdade. Quando olhamos para os preços, percebemos isso
mesmo. Os factores de produção têm aumentado, enquanto os preços
praticados têm descido. O produtor fica numa situação de extrema
dificuldade. O caso do Douro é um caso específico, porque aqueles
produtores vêem o seu ano dependente do benefício que puderem acomodar
das suas pequenas produções, das suas poucas pipas de vinho. Portanto,
se o benefício é muito reduzido, eles, com o mesmo trabalho e o mesmo
empenho, vão ganhar muito menos dinheiro. Isso, de facto, é muito
crítico. Mas, como é sabido, a decisão sobre o benefício é tomada por
um conselho interprofissional, onde a produção e o comércio estão
representados em iguais partes. A verdade é que a produção não é toda
igual, pois temos pequenos viticultores e temos produções ligadas a
grandes casas de comércio e de exportação. Nessa medida, a capacidade
e a elasticidade de uns e de outros é muito diferente. Aliás, se
olharmos para esse conselho interprofissional, vemos até que do lado
produção havia até quem quisesse que o benefício fosse ainda menor.
Não existe uma posição sólida e estruturada da produção. O que
significa que, porventura no Douro e noutras áreas, continuamos a ter
uma necessidade de maior agregação por parte dos produtores. Há casos
em que temos cooperativas que funcionam bem e outros em que funcionam
mal. No limite, sabemos que isto depende das pessoas.
RV: O Governo pode ajudar a resolver esta situação?
M.A.: Pode, desde logo, promovendo formação e formas de as pessoas se
agregarem. Mas creio que deve intervir muito no sentido de dar poder
às associações de produtores. Porque se eles se conseguirem juntar e
partilhar custos, se conseguirem ganhar um pouco de escala, agregando
aquilo que é o seu esforço, com certeza que, depois, também
conseguirão ter mais peso, até nas negociações com o comércio. A
capacidade está aqui muito ligada à escala das associações e à sua
valorização. Podemos dar-lhes essa força, garantindo que certos apoios
apenas sejam canalizados através dessas associações.
RV: Ainda vamos a tempo?
M.A.: Julgo que sim. Em relação ao Douro, trata-se de uma região com
questões muito complexas, que têm que ver também com o próprio
ordenamento do território e com problemas sociais. Tem que se olhar
para ali com muito cuidado, com a capacidade de perceber a globalidade
do problema. Isto também passa pela forma como o vinho do Porto pode
ainda crescer no mercado internacional. Acredito que não é um mercado
esgotado. Isso depende da forma como estamos habituados a consumi-lo.
Se conseguirmos promover lá fora a ideia de que o Porto, além de
aperitivo, também pode ser consumido com gelo, como outra bebida
qualquer – veja-se o caso do Porto Tónico -, concorrendo com elas,
encontra-se aí um potencial de crescimento.
RV: Está a lançar aqui essa ideia ou ela tem sido discutida com os
agentes do sector?
M.A.: Esta ideia tem sido falada com os agentes do sector e existe
também a percepção de que, com o vinho do Porto, podemos fazer mais
produtos e dar-lhe mais usos do que aquilo que é tradicional. O Porto
Tónico, que é uma óptima bebida, já se vê em muitos locais de Lisboa a
substituir um gin tónico ou um Martini. Se trabalharmos isto em termos
de marketing, teremos mais procura para o vinho do Porto, através de
outros usos. Parece-me um caminho particularmente relevante para a
resolução de muitos problemas no Douro.
RV: E a solução para esses problemas também passa pela resolução da
questão da Casa do Douro? Tem sido um assunto sempre adiado...
M.A.: Passa. Diria que estamos muito perto da resolução. Creio que
está estabelecido um bom diálogo, existe um consenso alargado de que
as coisas têm mesmo que mudar. Essa matéria está a ser trabalhada,
agora também com uma nova presidência no IVDP (Instituto dos Vinhos do
Douro e do Porto), e, dentro em breve, estaremos em condições de
fechar esse dossiê. O nosso objectivo é garantir que a produção, e
sobretudo a pequena produção, está bem representada e tem peso. O que
se passou foi que, com o passar dos anos, e com a criação do IVDP, a
Casa do Douro foi perdendo a sua matriz, a sua tarefa essencial. Hoje,
poucos se reconhecem na Casa do Douro, sendo certo que continuam a
estar a obrigados a ser associados – o que também inibe o surgimento
de outro tipo de associativismo. Mais do que as questões da dívida e
do stock de vinhos, que também estão a ser alvo de um processo
negocial, preocupa-me a forma como passará a ser representada a
produção e que voz poderá ter. Passa, com certeza, por criar
mecanismos muito mais eficazes.
RV: Será em 2012 que veremos, finalmente, uma soulção para a Casa do Douro?
M.A.: Espero que sim. Diria que será neste ano que vamos ter uma
solução de fundo para estes problemas do Douro.
RV: E quais são os planos do seu ministério para o Instituto do Vinho
e da Vinha?
MA: O IVV tem desempenhado um papel relvante, em articulação também
com as CVR e a ViniPortugal. É um organismo que pode sempre ser mais
dinamizado, mas que, a meu ver, tem cumprido o seu papel. Não é algo
que me deixe preocupada. Prefiro antes que nos dediquemos a ter uma
estratégia internacional bem afinada, a passar pela diplomacia
económica e com resultados. Quanto ao papel do IVV, acho que ele está
estabilizado. Em relação ao IVDP é que se discute hoje se deve evoluir
de modelo, é um campo onde há algum debate, no qual nós participamos e
estamos em diálogo com todo o sector.
RV: Qual é a sua perspectiva?
M.A.: Vamos ver. Há a ambição de que passe a ser uma entidade privada
de fins públicos, é uma hipótese. Temos de perceber em que medida é
que isso faz sentido e, se isso acontecer, como é que se relaciona com
o próprio IVV, se fica com todas as competências ou não. No fundo, e
salvaguardando as necessárias especificidades, saber se o IVDP deveria
passar para algo mais próximo daquilo que é uma CVR. Este é o debate
que está em cima da mesa.
RV: As adegas cooperativas estão a atravessar um processo de mudança.
O Governo pode ajudar a reformar as que estão em dificuldade a
realizar essa transformação?
M.A.: Através das linhas de apoio ao investimento, também podemos
ajudar a reformar aquilo que são as instituições, mas a verdade é que
há reflexão mais funda que queremos levar a cabo e que tem a ver com
as próprias cooperativas e a forma como poderão funcionar, através de
uma melhoria do seu enquadramento legal. Isto vale não apenas para o
vinho mas também para outros sectores. É uma matéria que ainda estamos
a estudar. Temos que garantir que os bons exemplos se repliquem, o que
até passa muito pela profissionalização das cooperativas. Isso,
porventura, implica mexer na própria lei. No nosso tempo, é um pouco
difícil viver apenas da boa vontade das pessoas, quando elas não têm a
preparação necessária.
RV: Neste processo de internacionalização dos vinhos nacionais,
devemos apostar apenas em duas ou três castas, conotando-as com o
país?
M.A.: É uma questão que deveremos aprofundar. Não vejo que haja
consenso no sector em relação a essa matéria. Se, por um lado, o
afunilar em certas castas torna a visibilidade externa mais fácil,
porque mais facilmente se identifica o país com as mesmas, por outro
lado, tira-nos a graça que conseguimos hoje introduzir nos nossos
vinhos, que tipicamente são multicastas. Estamos a conseguir produzir
vinhos muito diferenciados e alguns até bastante específicos, também
porque temos uma combinação de castas. E aí é a ciência dos enólogos a
trabalhar. Acho que é uma matéria que deve estar em cima da mesa e
precisa de discussão, de amadurecimento. Não é muito claro que, se
apostarmos apenas em algumas castas autóctones, daí tenhamos
vantagens, porque isso vai trazer um reconhecimento mais imediato, mas
também algum empobrecimento da diversidade. É preciso ponderar nos
pratos da balança o que é mais vantajoso para Portugal.
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