segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A estratégia empresarial do grupo Portucel Soporcel e a política florestal do Governo: serão uma e a mesma coisa?

1. Em maio último, o grupo Portucel Soporcel fez saber, através de
notícia publicada num jornal diário, fazer depender de 40.000 hectares
de eucaliptal a sua intenção de investir 2 mil milhões de euros, com a
criação de 15.000 mil postos de trabalho. Na atual crise económica,
qualquer notícia de investimento, mais ainda com a propagandeada
criação de milhares de postos de trabalho, é como pão para a boca.
Importa pois avaliar da condição para a concretização deste
investimento, os 40 mil hectares de eucalipto.

2. Por sua vez, o Ministério da Agricultura, também do Ambiente, quase
em simultâneo à demonstração de intenção do grupo empresarial, coloca
para discussão pública uma proposta de alteração legislativa à
regulamentação sobre a ações de arborização e rearborização com
espécies de rápido crescimento, nas quais se incluem espécies
florestais dos géneros Eucalyptus, Populus (choupos) e Acacia. A
referida proposta visa essencialmente a alteração ao disposto no
Decreto-lei n.º 175/88, de 17 de maio. Em causa está a dispensa de
autorização prévia, pelo recém-criado Instituto de Conservação da
Natureza e das Florestas (ICNF), das ações de (re)florestação com
estas espécies em regiões de minifúndio.

Será coincidência? Estatisticamente é muito difícil comprovar que
existe uma relação causal entre duas variáveis pois correlação não
significa necessariamente causalidade. É necessário realizar testes
empíricos para chegar a uma conclusão de causa e efeito.

Comprovada ou não uma relação causal entre o anúncio, ou
reivindicação, do grupo Portucel Soporcel e a iniciativa do Ministério
da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território
(MAMAOT), há contudo questões que importa colocar:

Será que o País sai a ganhar com mais uma campanha de massificação
agroflorestal, desta vez não com o trigo, como ocorreu a partir de
1938, não com o pinheiro bravo, como relata Aquilino Ribeiro no
romance "Quando os Lobos Uivam" de 1958, ambas em período de Estado
Novo, mas agora com uma espécie exótica, o eucalipto?

Será que, perante a atual crise económica, a carência de emprego e a
necessidade de aumentar o valor bruto das exportações, faz valer tudo?
Existe uma efetiva análise custo/benefício? Para quem emprega
atualmente cerca de 2.300 colaboradores, com unidades de produção de
pasta celulósica e de papel, como consegue incorporar mais 15.000
novos postos de trabalho? Será mera propaganda?

Analisando as exportações pelo seu valor líquido, ou seja subtraindo
ao seu valor bruto os custos da depreciação dos recursos naturais,
sairá o País a ganhar com uma campanha do eucalipto?

Foram estudadas alternativas à satisfação das atuais ou futuras
necessidades da indústria transformadora de pasta celulósica e do
papel, que não passem pela massificação da cultura do eucalipto em
minifúndio sem gestão florestal ativa?

Qual o impacto efetivo da campanha do eucalipto em Meio Rural? No
emprego nas aldeias, vilas e cidades do Interior, na qualidade de vida
dessas populações (o êxodo rural não se consegue estancar), no
rendimento dos proprietários rurais (em declive progressivo, segundo o
INE), nas empresas locais, e ao nível dos recursos naturais endógenos,
na conservação dos solos, na qualidade e na quantidade de água, na
biodiversidade, ou na propagação dos incêndios florestais?

Com certeza, o Ministério terá resposta a estas questões, já que,
coincidentemente ou não, parece estar a providenciar os meios
necessários a prossecução da estratégia empresarial do Grupo Portucel
Soporcel.

Lisboa, 22 de outubro de 2012

A Direção da Acréscimo

http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2012/10/22b.htm

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