terça-feira, 24 de junho de 2014

A agricultura também se dança


A bailarina Vera Mantero tem uma nova proposta: "Mais para Menos Que para Mais"
Uma das perguntas que poderíamos fazer seria: porque não convivemos nós com uma alface como o fazemos com as flores? A pergunta não é nossa, mas da bailarina e coreógrafa Vera Mantero, que, juntamente com vários convidados, cria "Mais para Menos Que para Mais". Afinal de que se trata? A partir de amanhã e até domingo, entre a Culturgest e o Teatro Maria Matos, em Lisboa, há uma série de conferências, performances e concertos sobre o tema hortas urbanas. Agora, pensemos que tudo isto vai acontecer entre alfaces, raminhos de funcho, agriões, nabiças, manjericão, pepinos e outras verduras.

Vera Mantero, que ontem apresentou o projecto à imprensa, explica melhor: "Houve duas coisas que me levaram a este projecto. Por um lado ter ouvido uma conferência da Carolyn Steel sobre o percurso da comida nas cidades, pois com o surgimento do comboio a produção alimentar espalhou-se, deixou de estar centralizada. Depois tive conhecimento de um projecto que se chama 'Incredible Edible', numa cidade do Reino Unido, Todmorden, cuja ideia é que todos os cantinhos verdes que existam se tornem um lugar onde se possa cultivar, fazendo da cidade uma imensa horta."

Partindo destas inspirações, a que se juntam ainda preocupações ambientais e económicas, a bailarina convidou o arquitecto Rui Santos e a bailarina, coreógrafa e performer Elisabete Francisca, dois nomes com quem já tinha trabalho num projecto semelhante em Montemor-o-Novo. Desta vez a intervenção passou, primeiro, pela criação de hortas urbanas. Contactaram agricultores urbanos que pudessem criar os espaços de que os três artistas necessitavam para as intervenções. "São hortas especiais porque vão servir como espaços performativos É um cruzamento entre uma actividade artística e agrícola."

Foi assim que a horta da Faculdade Ciências da Universidade de Lisboa, a horta biológica do Clube Nacional de Natação, a Horta do Mundo, a Wakeseed, a UrbanGrow e a Biosite aderiram ao projecto e o resultado são quase cinco hortas espalhadas pela cidade: em Entrecampos encontra a Horta Mandala, no Jardim no topo do edifício da Culturgest a Horta da Cobertura, no Jardim do Palácio Galveias a Horta Vertical das Galveias, no lago do jardim da Culturgest a Horta do Lago e no terreno que ladeia a Junta de Freguesia de Alvalade a Horta Súbita.

Cada uma destas hortas ficou a cargo de dois hortelões e, como explica Vera Mantero, "foram eles que escolheram o que se plantaria em cada uma". Não esquecer que todas têm ajuda de voluntários. Há dois meses, Vera, Francisca e Rui lançaram o apelo e não faltou gente pronta a arregaçar mangas. A ideia é que, depois de "Mais para Menos Que para Mais", estas hortas continuem a sua vida urbana. Mas muitas outras questões se levantam sobre este tema: "Temos de pensar em alternativas ao nosso modo de vida actual, como criar, por exemplo, autonomia", explica Rui Santos. "E não há consumo responsável individual, é preciso o colectivo", acrescenta Vera. Foi neste sentido que toda a programação de "Mais para Menos Que para Mais" se constituiu, por exemplo a rubrica "Circuito Curto-Curto Circuito", uma série de conferências e debates que pretendem alertar para várias questões ligadas à produção agrícola, ao consumo e às alternativas agroecológicas.

Actores, bailarinos, músicos vão integrar toda esta programação verde. Um dos espectáculos a acontecer no lago do jardim da Culturgest propõe ao público que se sente à borda da água, com os pés dentro desta enquanto desfruta de um concerto, em que os próprios músicos estão no meio do lago. E, claro, todos rodeados de alfaces. "Tudo isto, no fundo, pretende misturar plantas e pessoas. Pode comer-se, dançar-se, cantar-se, cuidar de pessoas, entre estas hortas", conta Rui. "Mais para Menos Que para Mais" termina, no domingo, com a colheita dos produtos agrícolas e a seguinte degustação dos mesmos. Todos os eventos têm entrada livre. Veja a programação detalhada em culturgest.pt.

Sem comentários:

Enviar um comentário